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Artigos

A magia das videolocadoras

Recentemente, uma das videolocadoras mais conhecidas de São Paulo, a 2001 Vídeo, anunciou o fechamento de suas últimas unidades físicas, encerrando assim um ciclo de décadas que moldou uma das tradições mais queridas na vida dos paulistanos: alugar um filme. Embora não seja nenhuma novidade o fechamento de locadoras Brasil afora, um processo que se iniciou há mais de uma década e avançou em ritmo frenético a uma quase extinção do ramo, o fim da maior rede ainda aberta em São Paulo retoma um sentimento coletivo de desalento, melancolia e nostalgia no peito de todos que um dia viveram a experiência simples, porém mágica, de passear pelas prateleiras de uma loja e escolher um filme para assistir numa noite de sábado qualquer. 

Mais do que apenas alugar filmes, as videolocadoras proporcionavam o encontro de pessoas com uma paixão em comum. Muito antes de cinéfilos se reunirem em grupos de redes sociais ou fóruns de cinema internet afora, a interação entre eles ocorria basicamente em locais como locadoras. A troca de sugestões, as conversas sobre determinado filme do momento - tudo fazia parte da experiência de frequentar esses espaços, onde muitas amizades se formaram e muitos filmes foram descobertos e discutidos. E os que participaram do nascimento dessa tradição desde o início e o acompanharam até seu réquiem estão reunidos no documentário CineMagia - A História das Videolocadoras de São Paulo (idem, 2017), de Alan de Oliveira. 

A iniciativa teve apoio de diversos nomes de peso dentro dessa história e o resultado é uma bela ode às pessoas que mais amaram e viveram o cinema diariamente nas últimas quatro décadas em São Paulo. Pessoas que entraram no ramo por variadas razões – dinheiro, investimento, gosto, curiosidade – mas que, em comum, tinham paixão por tudo aquilo, pelos filmes, pela experiência que proporcionavam aos que frequentavam seus espaços. Resgatar essas histórias, esse avanço, todo o boom dos primeiros anos, até se encerrar nos dias atuais, em que algumas locadoras remanescentes ainda lutam para se manter, é uma viagem inesquecível proporcionada pelo projeto, e que com certeza vai mexer com as emoções de quem vivenciou isso de perto, seja de São Paulo ou não.


O filme ficou em cartaz por duas semanas no ano passado no Caixa Belas Artes, outro nome tradicional do cenário cinéfilo paulistano, e hoje pode ser encontrado em DVD em um box lançado pela Versátil Home Vídeo, que pode ser encontrado aqui. A tiragem inicial é bem modesta e há o risco de o produto esgotar bem rápido, por isso vale a sugestão de pegar um exemplar o quanto antes. Além do documentário em si, o box traz um disco só de extras com o making off da produção e outros especiais super nostálgicos e tocantes sobre o tema. Entre os entrevistados, nomes como Sonia Abreu (dona e fundadora da 2001 Video), Christian Petermann, Rubens Ewald Filho, Oceano Vieira (fundador da Versátil Home Vídeo), Fernando Brito (curador da Versátil), Gilberto Petruche (dono de uma das única locadoras ainda ativas na cidade, a Charada) e até de Maria Aparecida Oliveira, esposa de Adelino dos Santos Abreu, mais conhecido como Ghaba, o responsável por iniciar a primeira locadora do Brasil. 

Hoje em dia o acesso a filmes é muito mais fácil com a internet e os serviços de streaming, mas a relação das pessoas com eles parece cada vez mais distante, impessoal. Muitos dos fissurados pelas locadoras e suas mídias físicas se tornaram colecionadores e dependem do mercado de home vídeo hoje oferecido por distribuidoras como Versátil, Obras-Primas do Cinema, Lume, Classicine, entre outras. Mas nada é capaz de realmente tapar o buraco deixado pelas locadoras e seu paraíso de prateleiras repletas de filmes de todo o tipo. Quem já trabalhou em uma (como este que vos escreve), sabe o prazer que é acompanhar o vai e vem de diferentes pessoas devolvendo os filmes, sempre muito satisfeitas, ou muito apaixonadas, ou muito frustradas - mas contentes ou não, ainda muito dispostas a voltar para pegar outra fita e descobrir um novo universo. Porque cinema é também memória, é também magia. 

Comentários (3)

Araquem da Rocha | terça-feira, 22 de Maio de 2018 - 13:33

Eu tive o privilégio de viver o auge das videolocadoras nos anos 90(onde começou minha carreira cinéfila).Entrar em um locadora realmente era mágico!!
Até pouco tempo era minha minha maneira de assistir filmes.Agora os tempos são outros e chegou ao seu triste fim.
Um prazer e paixão pra ficar na memória.

Alexandre Koball | terça-feira, 22 de Maio de 2018 - 13:37

Nada como passar horas revirando as prateleiras de uma locadora recém-conhecida.

Tive locadora por 3 anos (2011-2014), quando já estavam no fim, e fazer a seleção (compra) dos filmes do mês seguinte e receber o pacote semanal de filmes eram o ponto alto.

Adriano Augusto dos Santos | terça-feira, 22 de Maio de 2018 - 13:56

Alugar era uma sensação incrivel.
Um momento maravilhoso que passou e fica só na memória.

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