Não é novidade que o diretor David Lynch é um dos cineastas mais incomuns e surpreendentes de Hollywood. A cada projeto realizado, do menor ao maior, o diretor inclui as características e elementos mais marcantes em sua filmografia, e com isso mostra ao espectador através de suas produções, o quão vasta e distinta é sua imaginação e criatividade. Os filmes de Lynch geralmente não são bem quistos pública - em números de bilheteria, especialmente - e criticamente, isso resulta num eclipse maior a seu trabalho, entretanto essa subestimação as suas obras só aumentam mais a aura "cult" e particular em cada uma dessas.
Bem como os demais, A Estrada Perdida não foge destes hiatos que pregam a carreira de Lynch. O filme é dotado de abstratismos e desvencilha-se - completamente - da cartilha das produções hollywoodianas. O filme também é tido como a primeira parte de uma suposta trilogia envolvendo os acontecimentos nos bastidores de Hollywood, que teria como seqüências Cidade dos Sonhos (Mulholland Dr. [2001]) e Império dos Sonhos (Inland Empire [2006]). Talvez, A Estrada Perdida seja o mais controverso filme Lynch, vide sua recepção durante seu lançamento e sua fama quase nula nos dias atuais.
O filme narra à história de Fred (Bill Pullman), um saxofonista que suspeita que sua mulher esteja o traindo, e isso passa a dominar sua mente. As coisas passam a piorar quando são lhe entregues vídeos de alguém que está invadindo sua casa durante a noite e filmando sua privacidade. Então, Renee (Patricia Arquette), sua esposa é assassinada e Fred é preso e condenado a pena de morte por ser o responsável pelo crime. Entretanto em sua cela ele se transforma (literalmente) em outro homem, e esse novo cara passará a dar um novo rumo à história.
Gostando ou detestando, David Lynch consegue ser um dos diretores mais assustadores de todos os tempos para o cinema, isso porque, através de uma junção de imagens supostamente sem significados, Lynch consegue destilar uma atmosfera ímpar, agonizante, e realmente apavorante. Com A Estrada Perdida, nosso medo é personalizado através de cenas surreais e personagens extremamente medonhos. Esse é cinema do diretor. Mesmo sem compreendermos por completo, somos remetidos a toda a viagem sensorial e tridimensional que este nos propõe.
A Estrada Perdida é um quebra cabeças de sugestões, interpretações e hipóteses. Mais que isso, é um total afastamento da realidade, nos transportando a uma dimensão única, inacreditável e, sobretudo fissurante. Assim como toda a filmografia do diretor, este é um trabalho inconvencional, preenchido de devaneios e insanidades explosivas da mente do diretor, o que obviamente, não agradará a todos os públicos, e assim como os demais exemplares de sua carreira, torna-se bem seletivo quanto aos espectadores que agregará.
Louco? Sim. Surreal? Definitivamente. Estes e outros adjetivos são pouco para designar o quão abismal e complexo é mais esse quebra cabeças “Lynchiano”. É considerado pelo público como a obra, junto com Império dos Sonhos, mais confusa e enigmática da carreira do cineasta. Mesmo sendo pouquíssimo conhecido publicamente, A Estrada Perdida carrega consigo elementos e predicados particulares que o fazem uma legítima e poderosa obra. É o cinema de Lynch em pura essência. Então, cabe ao espectador averiguar se isso é, ou não, uma qualidade.
David Lynch cria mais um labirinto de horrores dotado de hipóteses e metáforas. É um trabalho difícil? Com absoluta certeza (talvez até o mais denso de carreira do cineasta). Entretanto, mostra, assim como os demais filmes Lynch, um valor peculiar e uma virtude própria diante do cinema contemporâneo, mostrando que a criatividade e a singularidade são fórmulas mais que suficientes para estabelecer uma obra de reais qualidades.
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