UM ATOR MELHOR E MAIS BEM CARACTERIZADO EM UM SINBAD MUITO MAIS CARISMÁTICO
A dupla Charles H. Schneer e Ray Harryhauser fizeram muito bem o dever de casa após seu ótimo filme Sinbad e a Princesa (The 7th Voyage of Sinbad, 1958) e melhoraram tudo o que foi possível em A Nova Viagem de Sinbad (The Golden Voyage of Sinbad, 1973) – o filme também ficou conhecido como As Novas Aventuras de Sinbad - e o resultado foi mais um clássico. O melhor filme da dupla.
E as melhorias são sentidas já nos primeiros minutos do filme, na apresentação do personagem. John Phillip Law (grande ator de westerns e conhecido por interpretar Tarzan no cinema), muito melhor ator do que Kerwin Mathews, incorpora um Sinbad mais autêntico, menos nobre e mais marujo. A começar por suas vestes bem menos pomposas, passando pelo cabelo desgrenhado e a barba 'certeira', ornamentado com anéis, colares e brincos, este Sinbad se encaixa bem mais na proposta do filme e do personagem, inclusive em suas atitudes. Se no filme anterior a nobreza demasiada do personagem, impedia que Sinbad cometesse qualquer ato ilícito contra a integridade de sabe-se lá o que, aqui logo de início, ele se apodera de um artefato desconhecido, ignorando os diversos avisos de seu companheiro Rachid (Martin Shaw) sobre a natureza diabólica de tal item. Mas não se iluda, este Sinbad segue do bem e ajudará muita gente. Apenas tornou-se mais humano e sujeito a falhas.
O melhor cuidado com os personagens não se restringiu ao protagonista. Todos aqueles que participam efetivamente do filme, foram bem mais trabalhados. Um bom exemplo é o Feiticeiro Koura (Tom Baker), que é um vilão bem mais interessante do que Sokurah (Toryn Thatcher), pois vemos nele, fisicamente, os reflexos de mexer com poderes ocultos nas trevas. Conhecemos suas fraquezas. Isso dá uma razão muito maior para suas ações, além de ser muito bem interpretado. Mas, por mais que Caroline Munro seja visualmente um verdadeiro espetáculo de tão gostosa, nem sua Margiana, nem sua misteriosa marca na mão possuem função alguma na trama, que desta vez mostra Sinbad na tentativa de ajudar o Grão-Vizir (Douglas Vilmer) da cidade de Marabia a encontrar a terceira parte de um estranho artefato artefato que serve de mapa para encontrar uma fonte capaz de fornecer juventude e um reino todo de riquezas incalculáveis ao seu proprietário. Artefato este desejado profundamente pelo Feiticeiro Koura, pois mexer com as forças das trevas lhe consome a energia vital.
E não foi só a troca de Kerwin Mathews por John Philip Law que beneficiou o filme, mas também a inserção de Tom Baker, que incorpora muito bem o vilão da vez. Com tanto tempo em cena, quanto o protagonista, Baker tem bastante tempo para trabalhar e desenvolver seu personagem, e o faz muito bem. Aparentemente sem função alguma na trama, além de ser o alívio cômico do filme, o personagem Haroun (Kurt Christian) ganha um espaço considerável em cena, até mais do que Rachid (Takis Emmanuel), braço direito de Sinbad. Filho molenga e preguiçoso de um bem sucedido comerciante, Haroun se vê em meio à marujos rudes e viagens repletas de perigos e monstros. Uma esquete paralela que poderia ganhar uma aventura própria. A já citada Margiana, surge nos sonhos de Sinbad, dando a impressão de que seria fundamental para o desenrolar da trama, mas acaba não tendo função alguma à não ser servir de oferenda para um dos monstros mais legais do cinema, uma espécie de centauro-ciclope.
Tecnicamente o filme se mostra tão bom ou quanto o filme de 1958, ou até melhor. Muito bem dirigido por Gordon Hessler e com bom roteiro de Brian Clemmens, o filme conta ainda com uma fotografia muito boa por parte de Ted Moore, que desta vez beneficia o filme inclusive em ambientes fechados e escuros, como uma cripta ou caverna. A produção de Charles H. Schneer tem um desafio maior desta vez, obrigando-se à ser mais grandiosa. E Schneer não decepciona e mostra um poderio criativo absurdo. Os efeitos de Ray Harryhauser estão excelentes, mais uma vez. Mas mesmo 13 anos depois, em nada evoluiu na parte da movimentação, ainda muito artificial - bem diferente do que vemos hoje, onde dentro do mesmo ano, vemos inovações absurdas neste quesito. A música, desta vez, ficou à cargo de Miklos Rozsa que, mesmo com um tema inicial muito bonito, não consegue uma obra que se equipare ao trabalho de Bernard Herrmann - o que é até uma sacanagem com o pobre Rozsa.
Com um contingente de criaturas fantásticas tão grande quanto no primeiro filme, é fascinante o aproveitamento de cada uma delas, seja a estátua de madeira do navio, seja o grifo ou o monstro híbrido de centauro e ciclope. Mas talvez nenhuma cena seja tão divertida e ao mesmo tempo bizarra quanto a estátua da deusa Khali dançando através da magia de Koura. Simplesmente impagável. Mas a mesma estátua nos proporciona um épico embate de espadas contra Sinbad, que se vira como pode contra os seis braços da adversária. Do mesmo modo, o Escudo das Trevas (segundo benefício dado ao portador do artefato mágico, depois da juventude) é uma concebido de forma muito inteligente, tornando o beneficiado invisível. Grande sacada, além de deixar a luta entre Sinbad e Koura muito legal, onde o feiticeiro está invisível apenas enxergamos sua espada movendo-se no ar. Muito bom trabalho por parte da direção e da produção do filme.
Terminando com outro embate feroz entre duas bestas, A Nova Viagem de Sinbad nem de perto tem a importância de Sinbad e a Princesa, mas como filme é bem superior e isso não é uma distinção fácil. Enche os olhos e alimenta a imaginação, dando asas ao espírito aventureiro dentro de cada um de nós. Uma aventura daquelas que não se faz mais hoje em dia.
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