Primoroso tecnicamente e com um roteiro complexamente magnífico, “A Origem” é uma obra-prima.
Há décadas cientistas tentam estudar e entender a lógica e a complexidade dos sonhos, porém jamais chegando a um resultado que possa ser explicado e comprovado cientificamente. Para qualquer caminho que se percorra sempre esbarram em conceitos como psicologia e religião. Muitos povos acreditavam que os sonhos seriam uma visão de algo que já ocorreu ou uma previsão do futuro e até mesmo uma junção de tudo isto. Estudando um pouco mais a fundo, sobre o “pai” deste assunto, Freud, observamos em sua tese que os sonhos estariam ligados ao inconsciente, mas sem necessariamente obedecer a uma sequência lógica de fatos e os espaços temporais de nosso mundo. Ou por acaso você se lembra do começo de um sonho? Quem nunca se pegou em um sonho onde parece passar horas nesta outra “realidade”, porém esta dormindo há apenas 5 minutos.
Como estudar isso eu não sei, só tenho certeza que qualquer aula sobre psicanálise deverá obrigatoriamente ser exibido à obra memorável intitulada “A Origem”.
A produção ganha vida graças ao trabalho brilhante de Christopher Nolan, diretor do tão espetacular quanto, “Batman – O Cavaleiro das Trevas”. Nolan vem se tornando um dos diretores mais promissores de sua geração, tendo em seu currículo filmes aclamados pela crítica como “Amnésia” e “Seguinte” (seu primeiro filme, há 12 anos). Mas seu filme mais complexo estava guardado para 2010, afinal Nolan teria levado dez anos para elaborar uma trama tão intrigante que te faz ficar os 140 minutos sem conseguir respirar dentro da sala de cinema. Aqui em “A Origem” Christopher Nolan consegue misturar tudo que uma ficção científica, uma película de ação, drama, suspense, thriller sempre almejaram.
Dom Cobb (Leonardo DiCaprio) é um habilidoso ladrão, um dos melhores na perigosa arte da extração, que consiste no roubo de segredos valiosos do inconsciente durante o sono, que é quando a mente está mais vulnerável. A excepcional habilidade de Cobb o tornou peça fundamental no traiçoeiro mundo da espionagem industrial, mas também o tornou um fugitivo internacional. Agora, Cobb tem sua chance de redenção, um último trabalho que pode dar-lhe sua vida de volta se ele conseguir algo completamente impossível – inserção. Sua tarefa não é roubar uma ideia, mas sim plantar uma.
Isso é o mais ralo que pode ser dito sem que seja solto nenhuma informação importante. Então paro por aqui quanto à explicação da trama muito complexa, porém de maneira alguma confusa. Em certos momentos podemos nos perder, mas nada que uma atenção redobrada não nos face retomar a linearidade da fantástica trama elaborada por Nolan. O cineasta de apenas 40 anos assina quase todos os roteiros e direção de seus filmes, se em “Batman – O Cavaleiro das Trevas” o roteiro é primordial graças aos diálogos, aqui em “A Origem” o roteiro espetacular graças à história totalmente descabida de maiores apresentações. Bastam cinco minutos para perceber que diante de nossos olhos se passa uma explosão sem tamanho de originalidade, um quesito que eu gosto sempre de ressaltar. Defendo a tese de que em poucos anos o Oscar terá uma categoria a menos, a de Roteiro Original. É fácil ter essa percepção, basta observar o excessivo número de adaptações e remakes existente nos últimos anos. Tudo isso vai criando uma avalanche que não sabemos onde culminará ao ponto de que inúmeros escritores produzem seus livros já pensando em uma adaptação para a grande tela. E quando temos uma criatividade quase ímpar como a de Christopher Nolan, devemos louvá-la e agradecê-lo.
Devemos também colocar na cota de Nolan a excelente direção totalmente orgânica que faz todo o complexo roteiro caminhar tranquilamente, sem escorregar e fazer o telespectador ficar á cegas com o filme. Tudo vai se encaixando, não só na mirabolante trama, mas como também nos aspectos técnicos: O roteiro se casa perfeitamente com a direção, que se junta brilhantemente com a montagem de Lee Smith (uma cena de Joseph Gordon-Levitt irá comprovar o que estou relatando). Smith e Nolan conseguem mesclar muito bem a ação das realidades presentes, dando um ritmo espetacular, de tirar o fôlego por completo de quem assiste ansioso pelo passo seguinte. E para fechar com chave de ouro, a montagem se conjuga perfeitamente com a fabulosa trilha sonora elaborada pelo mestre Hans Zimmer, uma composição sufocante, sombria e inconscientemente genial. Este deve ser o melhor trabalho do músico, que ainda tem em seu currículo trabalhos como “Piratas do Caribe” e “O Rei Leão”.
E como não deixar de falar dos efeitos especiais deslumbrantes utilizados pela produção de “A Origem”, entretanto o que o difere de inúmeros trabalhos é que a película não demonstra querer que os efeitos se sobressaiam a trama. Conforme o diretor de fotografia (por sinal excelente) Wally Pfister, Nolan rejeitou que seu filme fosse rodado em projeções 3D, alegando que não existe experiência maior do que a de desfrutar uma bela história. Podemos então dizer que “A Origem” é perfeito tecnicamente, obedecendo a um ciclo constante entre Roteiro-Direção-Montagem-Trilha Sonora-Efeitos Especiais, não importando a ordem e a direção.
Tudo isso somado a um elenco estrelado de gente com muito talento. Leonardo DiCaprio é o centro das atenções e faz o papel de ser uma referencia para o público, sua atuação é segura, principalmente ao ponto em que seu personagem vai ficando cada vez mais inseguro. Criando assim um antagonismo com Joseph Gordon-Levitt (“500 Dias com Ela”) que parece cada vez mais crescer e demonstrar ser uma peça chave para o plano principal. Ellen Page (“Juno”) também aparece muito bem, contracenando boa parte do tempo com DiCaprio, a jovem realiza aqui um papel forte. Completam o elenco muito bem Ken Watanabe (“O Último Samurai”), Cillian Murphy (“Dias Selvagens”), Tom Hardy (“RocknRolla – A Grande Roubada”), Pete Postlethwaite (“Em Nome do Pai”) e Marion Cotillard (“Nine”) além de participações especiais de Tom Berenger (“Platoon”) e Michael Caine (“Regras da Vida”).
Chegamos à conclusão que “A Origem” é de longe o melhor filme deste ano (com uma probabilidade mínima de ser ultrapassado), e podemos dizer que pode figurar entre os melhores dos últimos anos. Se finalmente houver coerência no prêmio mais aclamado do cinema, a produção de Nolan deveria abocanhar a maioria das estatuetas.
Christopher Nolan criou um mundo capaz de criar discussões intermináveis sobre os níveis da inconsciência humana, imagino que “A Origem” exercerá o papel que “Lost” teve na televisão americana, que por ser totalmente subjetivo deixa a cargo de o telespectador criar suas teorias e desvendar os mistérios entre as realidades transcritas na obra.
A cada minuto observamos a história do cinema sendo trilhada diante de nossos olhos, e sem saber, estamos presenciando o surgimento de um clássico memorável, ímpar, fantástico. De uma obra-prima.
Nota: 10,0
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