Wes Craven e Sean S. Cunningham, diretor e produtor deste corajoso filme, são responsáveis, respectivamente, e separadamente, por duas das mais emblemáticas franquias de terror do cinema. Não há o sobrenatural de Freddy Krueger ou Jason em Aniversário Macabro, estreia de Craven na direção. Mas aqui ele imediatamente (e grosseiramente) estabelece temas que mais tarde viriam a se tornar praticamente regras - as tentações e os riscos da sexualidade na adolescência e o uso de drogas - dentro do gênero que ele ajudaria a popularizar. Na primeira cena, já somos apresentados a uma garota nua, Mari Collingwood, tomando banho, ocultada apenas pelo box transparente do banheiro. Em seguida, ela surge para conversar com seus pais antes de ir a um concerto de uma banda na cidade grande. Seu pai pergunta: "hey, sem sutiã?" Ela responde dizendo que o jeito que sua geração trata os peitos não é como a geração deles (pais). Ela vai com uma amiga, a qual sua mãe considera má influência. Quem diria, em meio a uma época onde surgia a contracultura, o movimento hippie e tudo mais, um filme já apresentava a figura da adolescente rebelde.
Ao andar pela cidade, as meninas querem uma ervinha, para usufruir durante o show. Resultado: são sequestradas por um grupo de fugitivos, que as levam para uma floresta, para lá violentá-las, estuprá-las e, finalmente, matá-las. O carro dos assassinos quebra e eles buscam abrigo na casa mais próxima, que, por ironia do destino, é a casa dos pais de uma das meninas, ambiente do qual o espectador já possui conhecimento. Não demora muito para o casal de pais descobrir toda a história, e passar a assassinar os fugitivos, um a um, lentamente.
Situações que hoje em dia viraram clichê, não? Mas em 1972, era tudo novidade.
Baseado em A Fonte da Donzela, de Bergman, este filme mostra implicações psicológicas provocadas pela morte. No segundo ciclo de matanças do filme, ainda mais cruel e bizarro do que o primeiro, os pais cuidadosamente elaboram armadilhas pela casa e planos para fisgarem os responsáveis pela morte de sua filha.
Claramente é um filme quase B, com custos baixíssimos, feito por um diretor que abandonou uma já consolidada carreira de professor para tentar ser cineasta. Craven foi criado num severo ambiente religioso, no qual praticamente tudo era proibido (filmes, inclusive). Somente em sua época de escola que ele pôde descobrir filmes, bem como questionar valores religiosos. Fez parte de um grupo de escritas, que foi desfeito mais tarde pelo colégio quando começou a abordar temas como sexo e violência. Temas esses mostrados explicitamente aqui (embutidos na cabeça de seu idealizador, será?) de forma crua, quase nunca vista antes. Aniversário Macabro foi proibido em muitos países durante vários anos.
O clima do filme é pesadão e cru. Mas a atmosfera terrorífica entra em contraste com momentos de graça. Paralelo à vingança dos pais, temos dois policiais investigando o desaparecimento das duas meninas. Policiais atrapalhados e desleixados, que parecem ter saído do trio dos Três Patetas, ou, melhor ainda, do desenho Os Simpsons. Eu me vi presenciando o Chefe Wiggun em carne e osso. Tem também a trilha sonora do filme, que se assemelha muito a jogos do saudoso videogame Mega-Drive. Também há amor nas cenas, como os pais fazendo o bolo de aniversário de 17 anos de Mari ao som de uma música agradável (ela está aniversariando, esqueci de mencionar esse detalhe. E não estou nem um pouco a fim de editar o começo do texto).
No meu ponto de vista, não é um filme de terror. Aqui não existe suspense ou momentos que dão medo. O que dá o toque perturbador são a crueza, o realismo das cenas mais pesadas, ainda mais com o amadorismo tanto dos atores quanto da produção em geral. Como já mencionei, isso aqui é uma verdadeira comédia. Os vilões aqui não assustam, são pessoas marginalizadas comuns, cujos crimes incluem abusos e assassinatos. O líder da banda, Krug (uia. Krug, né, senhor Craven?), vicia seu filho em heroína, para que este lide melhor com ela e sofra menos. Filho este que é bonzinho, humano e piedoso, e obrigatoriamente torna-se cúmplice do que papai e o resto da “gangue” aprontam.
Em determinado momento do filme, os marginais, já hospedados na residência dos Collingwood, ridicularizam o comportamento fino dos anfitriões, que são pessoas dotadas de etiqueta: "Quem eles pensam que são? Pessoas na China comendo com pauzinhos e estes com 16 utensílios para cada coisa no prato”.
Eu pausei o filme para rir. Sério.
A divulgação do filme também é um caso à parte. O pôster do filme (o principal pelo menos) já prepara o espectador para o que está por vir. Temos simplesmente, uma menina já morta (ou quase) e um letreiro:
“Mari, 17, está morrendo. Ainda assim, o pior ainda está por vir”.
Tá, a tradução literal não é essa. Mas é a que melhor se aplica.
Ainda no pôster:
"Para evitar desmaios, repita:
É apenas um filme
.. apenas um filme" (repetidamente)
Mais engraçado é ver o trailer, em que no fim há várias pessoas repetindo: ...only a movie...only a movie...
Como resultado: um exploitation, daqueles feitos com amor à arte, liberdade de expressão. E com veia de filme B, daqueles que não se levam a sério. Quem me conhece, sabe que amo isso aqui. Não fez sucesso na época, claro. Até hoje é criticado pelo seu teor explícito. Craven só conseguiria ser um diretor de sucesso 12 anos mais tarde, mas aqui ele já mostra o puta diretor que é.
E um conselho: mantenha-se longe do remake.
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