Não conheço Wes Craven pessoalmente e tampouco sei o que passa em sua cabeça com relação ao cinema. Mas analisando seus filmes, percebo que ele não é alguém que se preocupa em agradar a crítica em geral ou em arrecadar valores enormes de bilheteria.
Sua carreira tem seus exemplares que fizeram bastante sucesso, e junto a eles, filmes que foram massacrados pela crítica e são desconhecidos até hoje pelo público.
Dentre estes últimos, temos Aniversário Macabro (1972), que conta com atores amadores, nenhum efeito técnico e uma dose de violência altíssima para sua época (ingredientes suficientes para espantar uma parcela dos espectadores); temos A Maldiçao de Samantha (1986), que conta a história de um jovem cientista com seu robozinho de estimação que faz amizade com uma garota que vem a morrer, e ele tem a brilhante ideia de ressuscitá-la, inserindo-a o cérebro de seu robô (!), tendo como resultado um filme que foi um fracasso e até hoje poucos viram. Também temos o igualmente mal falado O Monstro do Pântano (1982), que ainda não assisti, mas a premissa também é doida.
São muitos os filmes menos populares de Craven. Entre eles, está incluso As Criaturas Atrás das Paredes (1991). Fool (não é seu nome, claro, mas um apelido pelo qual todos o chamam) é um garoto negro que vive numa família pobre no gueto, em um bairro miserável e um prédio totalmente inadequado para residir, mas só assim sua família consegue manter-se. Sua mãe sofre de um grave câncer, e sua irmã mais velha passa por sérios problemas financeiros. E os donos do prédio vão despejá-los à meia noite do dia seguinte. Então um “conhecido” (interpretado por Ving Rhames, o Marsellus Wallace de Pulp Fiction) aconselha Fool a invadir a casa dos proprietários e roubar parte de suas riquezas, uma vez que são pessoas más e aproveitadoras.
Fool resiste por muito tempo, mas vendo o sofrimento de seus familiares, vê que não tem outra saída e decide tentar adentrar na residência. Residência esta totalmente inacessível e trancada. Mal sabe ele que o casal é muito mais do que simples pessoas rabugentas, e que na casa também há outras criaturas ocultas. Vemos a verdadeira natureza do “pai” e da “mãe”, o sofrimento da filha, etc.
A maior parte do filme passa-se na casa, mas isso não o torna algo maçante. De início existe aquela sensação meio claustrofóbica, mas conforme a história desenvolve-se, a casa mostra-se um verdadeiro ambiente a ser explorado.
O principal é que se trata de um filme de Wes Craven. Nosso primeiro contato com o interior da residência proporciona momentos tensos e assustadores. Mas o cinema do diretor nunca se resumiu somente a sustos. Nenhum filme dele, dos que vi, é tão engraçado quanto esse. É uma verdadeira salada de gêneros isso aqui. Suspense, comédia e até certo draminha.
Sério, é muito insano. Se em Aniversário Macabro Craven já utilizou de trilha sonora de videogame ou musiquinhas infantis, aqui ele faz algo semelhante. Temos onomatopeias e sons e caricaturas de desenhos animados (em tijolos caindo, em cabeças sendo atingidas, boladas nas genitálias e tantas outras situações). Chega uma parte do filme em que você certamente reflete: como pude ter medo disso?
Pra quem conhece os absurdos apelativos de Wes Craven, o prato aqui é cheio. Misture o já tanto citado Aniversário Macabro com Martyrs, com os clichês filmes de ação e aventura onde o bem sempre vence o mal, com as amizades em meio ao horror tão presentes em obras do Stephen King e com desenhos animados, tipo o Papa-Léguas, e você tem esse belo e pouco conhecido exemplar do gênero.
É. Tipo o Papa-Léguas mesmo. Sempre vemos o Coiote não medindo esforços para capturar sua tão sonhada presa, numa perseguição constante. Aqui no filme tem? Sim senhor.
Os antagonistas são o principal ingrediente. Fazem-nos sentir raiva e dar risada. O pai dá pulos de alegria quando consegue “aniquilar” alguém, vestindo sua roupa rídicula, a mãe é uma verdadeira bruxa com todos, mas chora lamentando o que fazem com ela. São personagens sacanas e sarcásticos. São sádicos, racistas, conservadores, autoritários, enfim, donos de uma vasta variedade de características. Servem para mostrar que às vezes os verdadeiros monstros não são aqueles que a sociedade denomina como indivíduos abomináveis. Se isso não foi uma proposital crítica ao povinho americano...
Ah, tem a parte dos clichês também. Ora, em Pânico Craven brincava apresentando-os e caíndo neles logo em seguida. Porque é isso que eu enxergo de seu cinema: Craven conhece como poucos todas as situações comuns do gênero, e trata-os bem como ninguém. O cara é formado em Psicologia, então imagino que no mínimo ele saiba de todos os nossos possíveis medos, e em cada filme apresenta situações com as quais podemos ter empatia, por mais absurdas que sejam.
Que seja! Ele já tem seu nome escrito na Sétima Arte. Tem todo o direito de se dar essa liberdade de filmar o que quiser, sem se preocupar com o que outros digam ou pensem. Seus fãs, como eu, só têm a agradecer.
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