WIM WENDERS E SEU SONHO
Eles perambulam pela cidade. Cidade toda acabada e devastada. Não é possível ou quase um milagre, seria o certo dizer, ver algum prédio ainda em pé. As pessoas não param de andar por aí. Apesar da guerra em si ter acabado, as pessoas vagam feito fantasmas, sem rumo. Muitos pensam, refletem sobre a situação. Parecem verdadeiras crianças, descobrindo o mundo, assim como os próprios seres sobrenaturais(anjos) que nela perambulam. É tudo embalado por uma frágil camada de branco-e-preto, tão doce e frágil quanto detalhada. Ângulos pela capital podem ser vistos, é sim muito frágil e com aparência devastada, mas ainda assim é tão linda, bem como deve ser a esperança de cada um deles, habitantes.
Wim Wenders nos embala assim no seu filme, cuja o mesmo lhe rendeu a palma de ouro de melhor diretor no festival de Cannes. Não é por menos, hoje renomado por obras diversas como; Alice nas Cidades(1974), Paris, Texas(1984) e o seu filme mais novo Pina(2011), o cineasta alemão já conquistou diversos cinéfilos com o seu jeito pessoal de fazer cinema e único claramente. Mas aqui, vamos tratar sobre Asas do Desejo(1988), cujo aniversário fará 26 anos em 6 de maio. Com todo o seu toque especial que lembra bastante a psicologia que Ingmar Bergman, punha em seus filmes, tanto nos seus elementos naturais quanto artificiais, mas mesmo assim consegue colocar um toque tão pessoal e uma câmera tão experiente que fica difícil não gostar de um dos seus exemplares fílmicos, mesmo com todos os erros. E neste não é muito diferente.
A história que Wenders nos encaixa dessa vez é sobre dois anjos, Damiel(Bruno Ganz, que mostrou seu talento como ator principalmente mais atualmente com A Queda! As Últimas Horas de Hitler(2004)) e seu parceiro Cassiel(Otto Sander) perambulam pela cidade de Berlin, pós-guerra, cuja a câmera de Wenders capta cada peça da cidade. Andamos juntos com eles em uma poesia bem relaxante que nos faz lembrar a mesma narração tão influente e inteligente da obra-prima de Godard: O Demônio das Onze Horas(1965). Andando pela cidade, cada um mostra por que está lá, vendo vidas, salvando vidas e acalmando pessoas mesmo que invisíveis a olhos nús, as pessoas sentem a presença de cada um deles(até mesmo as que sejam meio céticas). Andando por aí, os anjos também parecem estarem vazios, tanto quanto cada alemão, uma vez que são ausentes de necessidades, como fome, lazer e etc. Mas o fato é que mesmo assim, o anjo Damiel acaba se apaixonando por uma trapezista, Marion(Solveig Dommartin) e nesse contexto ele se arriscara para viver um romance com ela.
A câmera de Wenders, é tão surreal e poética, que é quase impossível negar que este seja o elemento mais forte da película como um todo, já que sua câmera passa pela Berlim devastada com graça, mostrando a beleza da fragilidade, bem como as asas dos anjos e sua fotografia que usa tão bem o branco-e-preto, cujo elemento serve para vários casos, como no caso de algum bar e roqueiros, se acha mais o preto forte e no caso da biblioteca onde Cassiel cuida de um velho poeta(Curt Bois, em um show de atuação, frágil e acima da média), que na verdade nem precisaria ser poeta, já que aqui descobrimos o lado poético e refletivo de todas as pessoas, usa-se mais o branco das lâmpadas para dar a sensação de loucura e esquizofrenia, parecendo um hospital de reflexões e pensamentos livres.
Ainda é claro, existe também a relação psicanalítica muito parecida além de alguns filmes de Godard, como também de Bergman, interceptando a sua fotografia branco-e-preto, como em O Sétimo Selo(1957), que se adapta mais à esse tipo de linguagem. Mesmo que o discurso religioso perambule o filme todo não atrapalha em nada, como seria normal acontecer em filmes que tratem de uma temática tão polêmica. O fato de se passar por Berlim pós guerra, provavelmente, ajude na fotografia, em algo, para mostrar a fragilidade que ainda existe dentro de cada uma das pessoas em seus próprios conflitos, sendo assim, o tema de guerra é apenas um pretexto para isso, mas um belo pretexto.
Tal temática só seria interceptada de tal forma surreal e doce, em um exemplo mais atual, O Sexto Sentido(1999), que mesmo assim se perde em algumas referências e em sua história apelando um pouco. Mas apesar de tantas qualidades, os verdadeiros defeitos de Asas do Desejo(1988) estão na sua longevidade mal aproveitada por vezes, em, repetições de várias e várias poesias, e o fato de mostrar quem são os verdadeiros anjos e se existem ou não, enfim, o seu contexto, final é que salve mesmo o filme. Pois torna-se por vezes, um exercício de paciência junto com todas aquelas poesias interceptadas de modo chato com a trilha sonora, diferente de O Demônio das Onze Horas(1965) que não entra em trilhas sonoras chatas e discursos cansativos, e sim em um road movie muito chamativo e perfeito, coisa que este exemplar infelizmente não conseguiu seguir e perde muito dos seus méritos, que talvez seria mais bem aproveitado sem tantas chateações. Mas ainda, consegue ser nostálgico e de uma beleza artística enorme além de mostrar um talento maravilhoso de Wenders para a direção, praticamente sem erros e detalhada à minúcias desde partes branco-e-pretos até mesmo em partes coloridas. Além de claro ter uma mensagem tão bela e única, quanto o talento tão jovem e curto de Solveig Dommartin.
Escrito por, Ricardo do Nascimento Bello e Silva
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