"Esse trabalho... nós tentamos salvar o maior número de pessoas que conseguimos. Às vezes isso não significa todo mundo, mas você não desiste."
Acho fantástico como mesmo com a comprovação de que basicamente qualquer coisa que fizer vai render rios de dinheiro, a Marvel ainda sente a necessidade do desafio. Batman vs Superman: A Origem da Justiça já estreou e foi uma decepção, mas na época que a Warner/DC anunciou o filme, os engravatados da casa das ideias no cinema viram ali uma ameaça que os fez investir no marketing pesado de um confronto explosivo entre heróis tal qual a rival e, claro, em um acordo de muitas verdinha com a Fox para conseguir o Homem-Aranha, mais famoso combatente do crime da editora para seu time. Os rumos a serem tomados agora são uma incógnita já que ficou comprovado que os três maiores titãs da distinta concorrência não são capazes de salvar uma bagunça e bater de frente com a segunda linha da Marvel Studios, mas, na verdade, quem liga pra isso quando se tem um novo filme do Homem-Aranha anunciado e já tivemos uma amostra grátis de que ele deverá ser o melhor de todos no cinema, certo?
Superlativos são uma constante em Capitão América 3: Guerra Civil, aliás, que é realmente dos maiores filmes de super-heróis que já vimos na telona. Mas já chegamos nisso, primeiro vale o aviso: atente-se ao "Capitão América 3" no título, ele importa mais aqui do que o "Guerra Civil". Os diversos personagens aqui e o explosivo final do segundo ato onde os tais "time Stark" e "time Capitão" se enfrentam não muda o fato de que é uma continuação do que vinha sendo desenvolvido em O Primeiro Vingador e O Soldado Invernal, a história do herói de tempos passados lutando num presente que ele precisa aprender que é seu. Daí que, surpreendentemente, mesmo com tantos heróis em cena e dois vilões ao longo do filme, a coisa toda aqui é a mais íntima em um filme da Marvel até então, uma revolução em se tratando do décimo terceiro filme do estúdio.
Esqueça a ideia de clímax com a qual nos acostumamos nesse tipo de produção, Guerra Civil trabalha quase que com o conceito de anticlímax, na verdade. Depois do sensacional confronto dos times em um aeroporto vazio, uma das coisas mais incríveis já realizadas em se tratando de explorar diferentes heróis e tipos de poderes, estilos de luta e personalidades, vamos para o desfecho em um lugar recluso, sem muito espaço e com apenas três personagens resolvendo tudo como numa briga em família ou melhores amigos, tudo em seu íntimo. Tão íntimo que quando um outro personagem, que assumira o papel de observador aguardando o momento de entrar em ação percebe que a luta não lhe diz respeito, se retira. E daí que mesmo sem aliens gigantes ou um robô assassino, pela primeira vez percebemos a real dimensão do que está em jogo para aqueles seres tão super mas que ainda seguem humanos e pela primeira vez os vemos suar tanto, chorar tanto e sangrar tanto.
E é tudo pessoal aqui, por isso ao contrário do que o marketing fez, não dá pra escolher um lado, até porque eles buscam mais conciliação do que vencer o outro, então a tal cena do aeroporto, novamente, parece mais amigos tentando se entender - o que é, na verdade - do que inimigos querendo se vencer. O que, claro, não impede os heróis de darem tudo de si, principalmente os novatos que aqui recebem a melhor chance de brilhar, seja o Homem-Aranha que mais uma vez prova ser o melhor e mais humano super ser que já surgiu nos quadrinhos, com sua característica empolgação juvenil que não o deixa levar uma porrada sem uma piadinha, seja o Homem-Formiga que ao receber sua esperada chance como um vingador não decepciona e, inclusive, revela novos poderes e, claro, o Pantera Negra que, no aguardo do seu promissor filme-solo - como não ficar ansioso com um filme que será comandado por Ryan Coogler depois de Creed? -, percorre um interesse arco dramático onde aprende com o grande "vilão" do filme um pouco sobre os males de não controlar o desejo de vingança.
Aliás, você percebe a grandeza de um filme de super-heróis quando o vilão ainda que não apresente a menor ameaça para os mocinhos, se revela um personagem interessante e com motivações válidas ainda que egoístas: se a ONU quer "controlar" os Vingadores após as diversas perdas civis em suas ações ao redor do mundo, o Barão Zemo prefere que eles se exterminem de uma vez, não quer mais riscos, o que o torna quase uma terceira via para o confronto de ideais representados pelo Capitão e Stark. Esse confronto, aliás, pouco empresta de seu homônimo das histórias em quadrinhos, já que o Tratado de Sokovia visto aqui se apresenta como algo bem menos extremo que a Lei de Registro de Super-Heróis vista nas páginas.
O que não tira a seriedade da situação, claro. E isso é sentido no tom do filme que ainda que se apresente como algo longe do pesado universo cinematográfico da DC (ainda bem), deixa as coisas bem mais graves do que em seus antecessores da Marvel, o que é refletido no controle das piadinhas que chegavam a ser incomodas em outros filmes e aqui surgem pontualmente como uma chance para respirar e quase sempre vindas daqueles marcados pelo humor - Aranha ou Formiga, claro -, já que mesmo Tony Stark surge como alguém com mais preocupações do que pode lidar aqui e tem até mesmo seu silêncio apontado em dado momento por outra personagem que esperava um comentário sarcástico do Homem de Ferro. E isso só beneficia Robert Downey Jr., que aqui volta a atuar fora do (bom, devo admitir) piloto automático que assumiu a partir do segundo filme do Homem de Ferro.
E se é sempre um prazer ver Paul Rudd, um daqueles grandes atores injustiçados do cinema, receber e aproveitar mais uma chance de brilhar, e Tom Holland abraçando com talento sua primeira aparição como o novo rosto de Peter Parker, é mesmo Chris Evans que cresce cada vez mais como o Capitão América. Depois de estrelar um dos filmes menos interessantes da Marvel, mas ainda sair por cima ao emprestar vida a um personagem que sempre encontrou resistência fora dos Estados Unidos, e se tornar o grande personagem do estúdio até então ao estrelar o melhor filme até aqui em sua segunda aventura. seu Steve Rogers segue crescendo como um personagem que está sempre disposto a morrer por seus ideais, ainda que não pretenda faze-lo sem lutar e lutar muito - e ver uma rima que ecoa seu eu franzino no primeiro filme levantando-se para o combate é de encher os olhos por percebermos que ali existe um herói para além do escudo ou soro -, o que, claro, não o torna um ser perfeito, já que erra assim como todos os outros que o cercam - e é engraçado como essa definição deveria servir também para o Superman, mas a DC/Warner impediu isso ao levar aos cinemas um psicopata sem emoções, mas enfim.
E se eu seria injusto ao elogiar apenas esses atores quando temos também Scarlett Johansson se firmando como uma das personagens mais fortes da Marvel justamente por não precisar de poderes para lutar de igual para igual com seres poderosos - algo que serve também para Jeremy Renner e seu Gavião Arqueiro e que rendeu um ótimo momento em Era de Ultron, aliás - ou Sebastian Stan cada vez mais confortável ao lidar com o desconforto do Soldado Invernal, fica aqui um elogio a todos os nomes do elenco, que recebem sua chance de brilhar mesmo que em uma única cena, provando que apesar de povoado, Guerra Civil é um dos roteiros mais bem trabalhados da Marvel até aqui.
E levando-se em conta o talento dos irmãos Anthony e Joe Russo para levá-lo às telas e lembrando-se que além desse, comandaram também O Soldado Invernal que é outro dos melhores filmes da Marvel - talvez ainda o melhor, há de se decidir entre esse e Guerra Civil -, fica a ansiedade de ver o que eles farão comandando o terceiro filme dos Vingadores.
O que torna esse o grande problema da Marvel Studios: despertar ansiedade demais nos espectadores.
Valeu, Arthur 😁
Vai sem medo, mano, sei que tu curte o universo da marvel, então esse vai te empolgar certo hahaha
"E é tudo pessoal aqui, por isso ao contrário do que o marketing fez, não dá pra escolher um lado, até porque eles buscam mais conciliação do que vencer o outro, então a tal cena do aeroporto, novamente, parece mais amigos tentando se entender - o que é, na verdade - do que inimigos querendo se vencer." - Exato. Tanto o Marketing de BvsS quanto o de Guerra Civil intensificaram a ideia que seria um puta confronto entre antagonistas. Chegou a dar nojo os compartilhamentos de facebook dos Teamalgumacoisa assumindo uma polarização que mal chega a existir no filme. Da pra compreender muito bem os dois(na verdade vários, o posicionamento da viúva negra foi o que mais me chamou a atenção e talvez o mais esperto) posicionamentos e o tanto que ambos tem em comum, e depois que o mal-entendido ocasionado pelo vilão é resolvido a primeira coisa que o Stark faz é violar o próprio tratado que fez pra ajudar o Capitão América. Não tem nada de inimizade entre os dois
Exatamente, xará. Aliás, quando o confronto entre eles realmente fica intenso é (de novo) pessoal, é por causa de segredos do passado, não política.
E a Viúva Negra é de uma inteligência impressionante mesmo, talvez a mais esperta ali, capaz de mediar bem o lado pessoal e político das coisas e se posicionar depois disso apenas.
Eu ia até ler, mas desisti quando vi a nota.