Nostalgia.
Lembro-me da minha querida infância onde ganhar um carrinho de presente me deixava mais feliz do que ganhar a roupa mais cara que pudessem comprar. Acredito que com quase todas as crianças isso acontece. Ganhar roupa no dia do aniversário era a coisa mais frustrante do dia. Diferente de hoje, claro. A Pixar sempre soube disso desde quando deu vida aos bonecos e deixou uma marca na vida de milhões de crianças em todo mundo com seu Toy Story. Aproximadamente 10 anos depois, chega a vez dos carros ganharem vida. E aquele cartaz com os carrinhos que falam, fazia os olhos da criançada brilharem só de lembrar que a data do lançamento estava se aproximando, inclusive eu com 16 anos nas costas que sempre me apeguei mais com carros do que bonecos.
Como é do costume da Pixar, os gráficos, as cores fortes, as paisagens, a qualidade digital da animação é de uma beleza incontestável. O filme é rico em detalhes, com carros bem desenhados, estilos diferenciados, afinal, com tanto dinheiro envolvido, tinha que ser. A equipe Pixar, liderada por John Lasseter, optou por criar um novo mundo, assim sendo, cada detalhe teria que ser muito bem pensado. Desde a arquibancada repleta de carros até os detalhes pessoais de cada personagem. Não existe comida, não existe cama, não existe humanos, o mundo de Lesseter é um presente para os amantes de carros.
A simplicidade da trama é um acerto da equipe. Sendo assim fica fácil de representar o mundo proposto, sem exageros. Somos apresentados a uma simples cidadezinha, onde o filme se desenvolve praticamente todo ali, o que abre espaço pra se trabalhar melhor os personagens, para conhecê-los melhor e principalmente para que eles tenham espaço para um devido estudo. Mas mesmo com todos esses elementos a favor do filme, o roteiro definitivamente não é o ponto forte de Carros. Possui uma boa história, não nego, mas muito abaixo dos padrões do estúdio. É tudo muito óbvio, a mensagem é óbvia assim como o desfecho. Logo quando Relâmpago McQueen chega destruindo tudo em Radiator Springs e é obrigado a ficar para consertar, é impossível não imaginar que a estadia do rapaz ali o fará aprender algumas lições, ele voltará pra corrida como uma pessoa com uma nova visão e todos ficarão felizes para sempre.
São justamente os detalhes que ajudam na construção de uma boa aventura. Principalmente quando são expostos para executar algumas boas surpresas na reta final do longa, muitos deles estão presentes nos diálogos. McQueen é o tipo de pessoa prepotente, egocêntrica, dispensa a equipe de apoio, acha que pode se virar sozinho, é o melhor, é o tal, e aproveita do que acha que sabe para se achar superior aos outros. Em Radiator Springs o que não vai faltar é personagens para lhe dar uma lição. Doc Hudson, pela voz do grande Paul Newman em seu último trabalho no cinema, foi um dos grandes carros de corrida na década de 50 e desistiu de correr após um acidente onde viu que todos viraram as costas. Mate, o carro guincho caipira é a simpatia do filme, um caminhão bombeiro tímido, uma dupla de mecânicos apaixonados por Ferraris, a dona do posto de gasolina, o dono da loja de pintura, e há também a promotora da cidade, Sally, por quem supostamente McQueen irá se apaixonar. Todos esses personagens são muito bem inseridos na trama, cada um tem seu espaço, e a boa sacada do roteiro que usa da boa desculpa de serem vizinhos e ninguém entra na trama gratuitamente.
Toma Vergonha nesse pára-choque!
A dublagem desta vez não fez feio. Aproveitaram o máximo do sotaque caipira de Mate e elaboraram piadas que a todo momento funcionavam, nos fazendo rir até mesmo dos costumes dos automóveis, como tomar um copo de óleo, ao invés de um café ou dois carros viajantes que estavam pulando na Micareta de Salvador.
A lição de moral é escancarada na seqüência final, onde McQueen já aprendeu a lição e pôde mostrar tudo o que aprendeu na corrida final. Se importar com os outros, trabalhar em equipe, não deixar que a ambição destrua os valores morais, mas deixando a frescura de lado, o filme consegue emocionar, seja pelo seu humor ou pela felicidade dos personagens. Mesmo que tenha uma lição e uma história pouco inspirada, Carros tem momentos belíssimos, como a empolgante seqüência inicial, o maravilhoso flash back contando como Radiator Springs foi substituída por outra rota, piadas bem sacadas, a maioria são frases de efeito mas que funciona perfeitamente. Como não se emocionar com um diálogo como este: Mate - Sabia que eu tinha feito uma boa escolha. McQueen - Que escolha? Mate - a do meu melhor amigo. A enxurrada de detalhes impregnado durante a projeção do filme só ajudou a deixar o desfecho mais agradável. Mate e o Helicóptero, As Ferraris na loja dos mecânicos, o ato heróico de McQueen na corrida final.
Carros não é a melhor coisa que a Pixar já fez, é um filme pouco inspirado, tem seus problemas mas prova que a Pixar ainda manteve a qualidade de um humor sofisticado, da criatividade, e do grande potencial de nos fazer voltar a ser criança.
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