Muito além de Vinhas da Ira, Essa Terra é Minha Terra é mais um filme ácido e sensível de Hal Ashby, famoso por seus filmes com personagens intrínsecos e melancólicos, mas também resistentes.
Debates são muitos sobre como lidar com um personagem histórico, que realmente existiu, Woody Guthrie, um famoso cantor de música country é a figura representada aqui. Se deve respeitar ao máximo o homem que foi? Se deve evitar os pontos ruins? Há de ser muito neutro com os acontecimentos? É nesse dilema que Hal Ashby e o roteiro de Robert Getchell se saem bem, o personagem é humano demais, ele trai sua mulher mas não deseja o coração partido de suas amantes, esquece as filhas sem nunca deixar de ser um bom pai, tudo isso observando os rumos do país e tentando fazer deste um lugar melhor.
Os desperançosos anos 70 do século XX para os americanos tornaram filmes como Essa Terra é Minha Terra possíveis, com a existência e a brutalidade da Guerra no Vietnã o país entrava em crise econômica e moral dentro de suas próprias bases. Onde estava o país que defendia à vida e que havia ajudado a vencer a Segunda Guerra dos nazistas?
Haskell Wexler, diretor de fotografia que alguns anos depois seria responsável pela beleza visual de Cinzas no Paraíso (1978) de Terrence Malick, faz muito bonito. Em um dos primeiros filmes a utilizar o sistema de Steadicam (de acoplar a câmera no corpo do cinegrafista, dando assim mais agilidade) tudo parece muito sujo, muito empoeirado. Cada cena em cima de um trem é um delírio visual. Mas apesar do reflexo brilhante dos faixes de luzes, toda a região do Texas é extremamente tomada por uma degradação visual muito elegante, é como filmar um assassinato da forma mais linda possível sem deixar de dizer pelo próprio visual que aquilo ali é um assassinato.
A jornada de Woody deixa de ser uma jornada econômica desde que entra em seu primeiro trem clandestinamente, ele embarca em uma viajem para dentro de sua conscientização política e dentro da própria realidade de seu país, passando de um homem pobre oprimido para um homem que trabalha e recebe para para os opressores. A questão é que lá está um homem com alma - "This Land is Your Land" canta com o coração na boca. Ao ser debochado pelo júri de uma escolha musical (o "caipira") ele mais uma vez entende quem é o seu público e que ele, jamais será um homem que irá negar suas origens humildes. Ele precisa de algo real, nem que essa coisa, essa substância, seja a própria poeira que impregna a tela durante o filme: "Lidar com tempestades de poeira é mais simples do que lidar com a ganância" comenta a sua mulher; assim ele entende que um lugar nunca é o mesmo lugar quando engravatados dominam tal lugar. Quando sua mulher, antes necessitada, dá galinha frita para um mendigo (isso acontece apenas em relato dela mesma) ela se lembra de quem era e se pergunta se voltaria a ser a mesma pessoa. A grande depressão pode não ter afetado a todas as classes econômicas, mas afetou a alma de todos os sensíveis e conscientes.
Assim, contra tudo e contra todos, Carradine arrasta seu personagem por aquela paisagem seca e quente, levantando sua pequenez contra os grandes investidores, os grandes empresários que estragam a economia e a cultura de seu país, da sua então Califórnia e de seu Texas. Se em algum momento Esta Terra é Minha Terra parecer um filme monótono, morto ou sem nada a dizer, é simplesmente pelo estilo intimista e contraído com que Ashby nos trazia seus belos filmes, a sutileza está na mensagem contida em um olhar vazio para o nada na hora de cantar uma canção que não quer ser cantada por quem anseia dizer o que pensa. Somos aquelas ideias em que acreditamos.
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