Dizem que o primeiro filme é o cartão de visitas de um diretor. No caso de Selton Mello – um dos atores mais populares do Brasil na atualidade -, é também a prova de que teremos no futuro um cineasta pra lá de promissor. Seguro, cheio de escolhas acertadas, inteligente… Selton sabe utilizar todos os elementos do bom cinema para compor o carregado drama familiar, "Feliz Natal". De quebra, o ator/diretor se desvincula de vez do estigma de comediante - gênero que se fez muito presente em sua carreira até aqui. No seu longa de estreia, ele nos apresenta um trabalho difícil, forte e complexo – que lembra em muitos aspectos o bom e velho cinema europeu.
Com a câmera intimista, acompanhamos a viagem de Caio, homem de meia-idade que mora no interior e é dono de um ferro-velho. Na volta à sua cidade de origem, Caio busca muito mais do que um reencontro com a família no emblemático dia de natal, procura também um acerto de contas com o passado, com os personagens que passaram por sua vida e com os dramas que por motivo ou outro acabaram ficando esquecidos no tempo. Esse clima melancólico, auxiliado pela bela fotografia que destaca o sofrimento das personagens, nos remete, como disse acima, à escola europeia de cinema. Isso faz da obra um grande achado dentro do cinema nacional – que ultimamente tem dado exclusividade às comédias que vendem como água (uma pena!).
Apesar de ser um tiro certo numa fatia reduzida do público, Selton Mello também comete seus erros – o que, convenhamos, é normal para um estreante. Afirmo com tranquilidade que sob a tutela de um diretor mais experiente, "Feliz Natal" tinha chances de ser lembrado por muitos como uma obra-prima. No entanto, mesmo com a competência que lhe é peculiar, o mineiro traz à tona algumas alternativas, ao meu ver, equivocadas. O filme é bem curto se imaginarmos o tanto de coisa que poderia ter sido explorada. Com o passar da pouco mais de hora e meia, temos a certeza que um trato a mais no roteiro cairia muito bem. Ou seja, há muita história sendo contada em pouco tempo, e quando isso acontece já podemos adivinhar o resultado: é problemático.
Além disso, o longa tem um clímax pouco empolgante. Esperamos todo aquele tempo e vemos um drama sendo construído com minúcia para nada. No final, o desfecho é pobre, bem aquém do que poderia ser e muito menos sensível do que prometia. Ainda assim, a trilha sonora adequada e o bom trabalho de Selton Mello atrás das câmeras fazem valer o espetáculo. É gostoso ver que um diretor consegue extrair o máximo de seus comandados em cena, e isso o mineiro faz com uma habilidade invejável. Destaco aqui o comprometimento de Leonardo Medeiros, que traz melancolia ao seu personagem na medida certa. Darlene Glória também tem seu destaque, embora soe exagerada demais ora ou outra (pelo menos para mim). Outro que merece ressalvas é Lúcio Mauro, velho de guerra na dramaturgia brasileira.
"Feliz Natal" tem seus momentos de glória, e obviamente seus acertos superam os erros. Selton Mello tem um debute interessantíssimo como diretor, brindando o público com um trabalho infinitamente acima da média… com diálogos bem montados, fotografia, trilha sonora… e por aí vai. Uma pena que na seletiva para o ‘pré-oscar’ o filme tenha caído diante de "Salve Geral", que, para variar um pouquinho, traz às telonas (mais uma vez) a violência urbana das cidades brasileiras - tema que já cansou o público faz tempo e vem tendo sua fonte esgotada a cada novo longa inútil e pretensioso que aparece.
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