Mann e o balé urbano
Assistir Fogo Contra Fogo inerte é passar incólume a uma experiência visceral poucas vezes vislumbrada na Sétima Arte. O domínio do cineasta Michael Mann sobre sua maior obra ficou evidente na escolha de um elenco poderoso, do mais alto calibre, que foi capaz de tecer uma película frenética, recheada de tiroteios, dilemas, mazelas e consumação.
É difícil escrever uma crítica pra esse filme, pois ele simplesmente se vale de uma desconstrução da realidade. Não podemos aqui elencar defeitos, os poucos que o filme possui, muito menos as virtudes com clareza, já que a antítese de Mann é tão clara e evidente, que não sabemos quem está certo nessa história de gato e rato. Neil ou Vincent? DeNiro ou Pacino? Ambos são homens comuns, passíveis de amor e desilusão, sujeitos ao mesmo céu noturno, testemunho de delitos graves e hediondos, como o tráfico, a prostituição, a quebra de conduta. A sujeira está no departamento de polícia, está nas gangues, nas quadrilhas sofisticadas de roubo. Mann nos sugere uma pauta humanística desses dois polos, não criando heróis nem vilões. As ruas, por si só, já combatem a violência, parasita velada, por meio de anticorpos bélicos e truculentos, os policiais, os investigadores, em busca de condecorações, reconhecimentos, enfim, de glória.
A fotografia escura, os ângulos de câmera, as cenas de ação deslumbrantes, sugerem um balé harmônico, onde todos, sem exceção, tentam provar que estão certos. É claro que no fim, quando o tiro na pista do aeroporto é executado, vemos que Pacino cumpriu sua missão, de dar a carta certa do baralho para a mesa de feltro, ganhando o jogo. Mas quando ele aperta a mão de Neil arrepiamos nossos pelos do braço e ficamos em silêncio observando a sutil troca de olhares entre os dois. São vários os momentos de cortar artérias e funções vitais, mas esse é o melhor e mais magnético deles.
A podridão de cada um é dissecada a cada cena. A personagem de Val Kilmer, por exemplo, vive um dilema com a mulher, um medo de traição constante, uma desconfiança fluente. E isso, de maneira geral, ocorre no filme todo. A filha de Hanna, com medo da profissão do pai. Neil, um homem solitário em busca das luzes de uma metrópole movimentada, esperando para ser um palco teatral e cobaia de roubos e latrocínios.
É muita coisa envolvida em Heat. Personagens que duelam, do início ao fim, pela consagração, fazendo tudo o que for preciso para vencerem a estéril rotina, para quebraram o status quo pelas beiradas. Um verdadeiro duelo em um conto policial. Lindo, lindo, estupendo trabalho de Mann. Uma análise sociologica do submundo do crime e da dicotomia vivida por homens da lei, que temem por passarem uma impressão negativa para os que estão a sua volta. Porém, Pacino, como um monstro, inverte isso tudo. DeNiro também, parecendo mais um homem comum, cujo pai morreu, e que rouba bancos para se sustentar. A frieza é um elemento dessa obra, porém, o calor ferve por ela toda. Parece um movimento dialetico, né? Pode até ser filosofia, mas é Mann mesmo. Que filme, senhores..
Curti o texto e o filme é do caralho mesmo
Mas a nota me soou estranha, juvenil, o texto parece empolgado demais pra um 8,5 (que é minha nota tbm, aliás hahahaha)
Valeu, Pedroca! É isso que te falei sobre o texto..
O entrechoque dialético, de fato, é genial macho.