FILME ATÉ VAI BEM, MAS SE PERDE JUSTO QUANDO NÃO DEVERIA - ASSIM COMO SEU DIRETOR
Mikael Häfström não é o cineasta dos sonhos de ninguém que goste de um cinema mais consistente. Embora seus filmes não sejam ruins, propriamente dizendo, o sueco parece não conseguir extrair o máximo do material que recebe em mãos. Sem em 1408 (2007) ele consegue manter nosso interesse em uma trama que conta com praticamente apenas dois personagens, lhe falta tato com o suspense. Em O Ritual (2011) ele não trabalha bem a incomum possibilidade de um padre exorcista possuído. Se em Conspiração Shangai faltava um pouco de coração ao contar a bela história, em Rota de Fuga (2013) ele sucumbe ao carisma dos dois astros do cinema de ação dos anos 80 (Stallone e Schwarzenegger) que ganham a tela. Mas como eu disse, seu cinema não tão ruim. Apenas inconsistente. E é essa inconsistência que marca Fora de Rumo (Derailed, 2005) onde o final praticamente põe tudo a perder.
Roteirizado por Stuart Beattie, a partir do romance de James Siegel, Fora de Rumo narra a história de Charles Schine (Clive Owen) e Lucinda Harris (Jennifer Aniston), dois executivos que se conhecem por acaso e iniciam um romance extra-conjugal. Lucinda afirma ter sido deixada de lado pelo marido que ela finge desconhecer ter inúmeras amantes. Charles, por outro lado, parece não suportar a situação delicada de seu casamento à medida que o tratamento para o tipo raro de leucemia da filha consome não só todas as economias do já muito endividado casal, mas também suas forças. A aproximação dos dois é quase imediata e quando os dois finalmente decidem consumar o adultério, são vítimas de um assalto no quarto do motel. Charles é espancado pelo bandido de sotaque francês e Lucinda estuprada pelo mesmo. Mas o pior ainda estava por vir. Tempos depois, ambos descobrem que Lucinda engravidou daquele ato hediondo e, antes que pudessem tomar qualquer atitude, LaRoche (Vincent Cassel), o bandido que estuprou Lucinda, começa a chantagear Charles ameaçando sua família, fazendo com que ele esvazie todo o fundo economizado durante anos (com duas hipotecas da casa) para o tratamento da filha e exigindo ainda mais. Charles está num beco sem saída.
Mesmo com o cambaleante roteiro, Fora de Rumo se sustenta pela situação tensa e sufocante. E mesmo que Charles e Lucinda pareçam estar pagando por um crime que nem tiveram a chance de cometer (em tese), sentimos mesmo é pela situação de Deanna Schine (Melissa George), esposa de Charles e sua filha, que sofrem as reais conseqüências da situação. A questão ética entra forte à medida que o filme utiliza-se muito bem da condição delicada da família Schine (a cena em que Charles ajuda a menina com o dever de casa e desliga o rádio, e ouvimos o som do aparelho ao qual a menina fica ligada dá um nó na garganta) para nos sensibilizar ao máximo. É muito difícil definir por sentimos maior repulsa, se por LaRoche ou por Charles. E em questão de roteiro e direção, essa é a maior força de Fora de Rumo.
Aqui, Häfström demonstra mais uma vez não possuir um tato muito preparado para o suspense, que é sustentado no filme por - pasmem - Clive Owen! Sim, o brucutu inexpressivo se sai bem no papel e consegue carregar a trama até o final (ou quase até o final). Ao buscar em Winston (RZA), colega de Charles, uma tentativa de saída dessa situação, o filme pouco explora as chances que essa possibilidade traria. Häfström poderia, por exemplo, inspirar-se em Cabo do Medo, de Martin Scorcese, que possui uma temática parecida e explora muito bem as condições tanto de vítima quanto de algoz. Em Fora de Rumo este estudo fica prejudicado pela fraqueza do vilão LaRoche. Mesmo sendo muito bom ator, Cassel nada pode fazer para aumentar potencial de seu personagem.
Mas tudo flui razoavelmente bem até o derradeiro final, tendo o filme já passado por algumas revelações e reviravoltas bem interessantes, quando tudo o que havia sido criado até então - mesmo que aos trancos e barrancos - é praticamente jogado no lixo, dada tamanha previsibilidade do desfecho. O reencontro de LaRoche e Charles é de uma falta de criatividade inacreditável e clichê ao extremo (pra quê aquela cicatriz no olho?). Sem falar na falta de lógica da situação. Primeiro porque seria impossível Charles lecionar no mesmo presídio onde LaRoche estivesse detido. Segundo pela cena em si, onde Charles comete um assassinato na cadeia e sai triunfante andando em direção à tela com a trilha vitoriosa embalando seu caminhar fodástico (fiquei esperando a prisão explodir ao fundo em câmera lenta, com close no seu olhar inabalável, mas não aconteceu).
Fora de Rumo é o retrato fiel do cinema de seu diretor. Não chega a ser ruim, mas derrapa sempre na hora H.
Cara não sei se é porque eu era moleque mas gostei d+ desse, achei uma reviravolta muito boa...
Também acho este um bom filme, Lucas, mas aquele final me desagradou espantosamente depois da bela condução das reviravoltas.