Família muitas vezes é melhor em fotografia. Tantos problemas e pessoas que somos obrigados a viver simplesmente por mantermos um parentesco com indivíduos muito diferentes que nem tivemos escolha de se relacionar ou não. São tias chatas, cunhados inconvenientes, sogras malditas e todo o tipo de julgamento que só por pertencerem ao mesmo sangue, acham que podem fazê-los sem haver conseqüências muito sérias. O pior de tudo é quando se tem uma imagem pra construir ou preservar, incrementando falsidade e mentiras num ambiente já caótico por si só, aumentando mais a fragilidade da construção de uma família saudável em seus relacionamentos no geral.
Refletindo toda essa linha tênue na vida de uma família, Richard Brooks deu origem a uma das melhores obras de 1958, que conta com uma jóia de roteiro e um elenco estelar que brilha a cada palavra que soltam um para os outros em tela, mas que infelizmente perdeu o Oscar de melhor filme para o fraco “Gigi”, que mais tarde seria reconhecida como uma das maiores injustiças da academia. Gerando uma história sobre relações familiares que possui um discurso que ainda continua atual, o diretor produz um filme que quebrou barreiras em sua época e mantém intacta a força dos diálogos entre os personagens que são o maior fator de seu sucesso.
A obra é sustentada principalmente pelo seu roteiro, o que já se mostra suficiente. Além de a trama decorrer quase toda somente dentro dos aposentos de uma única casa, os diálogos se mostram tão excelentes quanto às atuações. As discussões e sentimentos vão ganhando força nas vozes dos atores veteranos, cada situação é mostrada de forma verossímil e uma ótica que nos possibilita nos identificar com pelo menos um personagem ou situação a que estão submetidos. É um fato magistral que, com o passar dos anos, os discursos ainda estão muito bem estruturados e contemporâneos, mostrando que a obra pouco envelheceu.
Cada caricatura feita primeiramente é logo desfeita e passamos a acompanhar um belo aprofundamento na vida daquela família que pouco a pouco vai se revelando uma cama de gato. Pra começar, nos é apresentada Maggie, uma mulher linda e aparentemente com muita classe, mas que se mostra uma pessoa venenosa e até cruel em seus comentários sarcásticos a respeito principalmente de seus sobrinhos, que os chama de “criaturas sem pescoço” e sentimos seu desprezo por tudo aquilo logo nas primeiras partes, porém sua imagem muda drasticamente quando vemos a relação dela com seu marido Brick Pollitt, um jogador de futebol frustrado que pouco tem amor à vida que leva.
Ele nunca dá a atenção e muito menos o amor que Maggie necessita, nunca retribuindo toda a paixão que sua esposa o entrega de todo seu coração machucado, e uma pessoa que não recebe amor dificilmente conseguirá o retribuir. Há hipóteses implícitas de que Brick seja homossexual, mas não fica evidente em nenhum momento da película. Para piorar ainda mais o clima entre os dois, a família constantemente pressiona o casal em suas incertezas e tristezas, por acharem que ele se resume somente a um atleta frustrado bêbado e ela a uma mulher incapaz de fazer seu homem feliz e, conseqüentemente, ter filhos com ele para continuar a linhagem dos Pollitt.
São grandes cenas que ficam na memória pela força da intensidade com que todas aquelas emoções são retratadas, com veracidade e sentimentos transbordando na tela. Num dos momentos mais geniais do filme, Maggie vê o reflexo de sua frágil relação com seu marido no relacionamento dos pais de Brick, Harvey e Ida, que viveram muitos anos juntos, mas visivelmente Harvey não suporta mais todas as tentativas de Ida de ser uma boa esposa e dar a ele um amor que, pela sua visão, é falso e risível em cada frase ingênua que sai da boca de sua ex-amada.
Como dito anteriormente, a película é sustentada pelo seu excelente roteiro e também pelas grandes atuações que roubam o filme para si. O maior brilho fica por conta de Elizabeth Taylor, que faleceu recentemente, mas foi uma das grandes atrizes de sua geração deixando um grande legado no cinema, dá um show de interpretação na tela, uma força tremenda em cada frase dita e cada olhar cheio de ódio ou dor, faz jus a sua posição de uma atriz lendária. Paul Newman faz um dos primeiros filmes de sua carreira e já mostra para o que veio, com todo seu carisma e talento, consegue um ótimo desempenho principalmente nas discussões com seu pai e sua esposa e em seus olhos tristes que a câmera foca. O resto do elenco está bem, mas alguns atores até exageraram um pouco, ficando performances meio forçadas, mas nada que atrapalhe severamente o andamento da obra.
Se imortalizando por ser a obra-prima da carreira de Brooks, “Gata em teto de zinco quente” mostra o talento de duas das maiores estrelas mundiais no ramo cinematográfico marcadas para sempre por suas grandes performances, reflete a qualidade dos roteiros que Hollywood produzia em seus anos dourados que são relembrados sempre como sinônimos de qualidade pura e que com esse não poderia ser diferente, um belo exemplo de cinema em sua forma mais primordial e corajosa e se conclui numa prova viva de que o verdadeiro auge fílmico é muito mais do que efeitos especiais e produções milionárias, mas sim o fiel retrato de uma sociedade que dentro da tela é a mesma que a detrás dela.
“Nós não vivemos juntos, só moramos na mesma jaula!” – Maggie
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