O que impera nas luzes vermelhas que compõem o labirinto noturno é a respiração ofegante. Desde o início, o filme “Irreversível”, dirigido por Gaspar Noe, intensifica um ritmo de batida musical com uma câmera exibicionista. O submundo parisiense transforma-se em um intestino, cheio de voltas e obstáculos, nos quais Marcus e Pierre correm a fim de chegar ao “réctum”. A sensação de irritabilidade é gritante nos fortes movimentos de câmera, que permanecem até o climáx da trama.
A narrativa não é executada de forma linear. A violência dos planos começa a ser compreendida conforme flashbacks aparecem e elucidam a confusão. Entende-se o conflito: Alex, a mulher de Marcus, foi estuprada. Mostra-se a opção de linguagem: a câmera, no momento de clímax, não é mais sensível ao emocional dos personagens. O recurso utilizado foi o de distanciamento emotivo, a fim de mostrar com crueza um estupro em tempo real. A câmera não se movimenta. Não há cortes. O espectador é obrigado a assistir um longo reflexo do urbano corrompido. São muitas as percepções que se têm ao ver isso. A ficção, antes desta cena, parecia exageradamente pulsante e chegava a sufocar com tantos giros na mise en scène. Agora, enfim, respira-se. Porém nunca com tranqüilidade.
O que instigou Marcus, e que se projetou na tela, foi vingança alucinante, incompatível com a realidade antes do trágico. Seguem-se, em flashbacks, cenas de tranqüilidade romântica, com diálogos sobre relacionamento, mas que não atenuam o clima proposto pelo filme. O espectador já foi carimbado pela destruição do eixo de equilíbrio. Uma possível gravidez, um estupro, e um plano positivamente verde e rotatório, que mostra uma nuance de felicidade idealizada. As crianças correm em círculo, até que a imagem vire branco. Acabou? O piscar frenético de branco para preto anuncia que “O tempo destrói tudo”. Fim.
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