"Você quer mudar? Não me venha com essas merdas! Você não pode mudar! É lixo da cabeça aos pés!"
Se podia causar algum estranhamento o nome de James Gray na produção e no roteiro (escrito ao lado do diretor Guillaume Canet) desse Laços de Sangue (o título, bem direto, poderia evitar esse sentimento por si só), os primeiros momentos do filme, com irmãos em lados opostos da lei entrando em cena de maneiras tão opostas quanto - Frank, o policial de Billy Crudup, arrombando repentinamente a porta de um suspeito para entrar; Chris, o ex-prisioneiro de Clive Owen, saindo a passos lentos após aguardar a porta da penitenciária abrir - deve dissipar isso logo de cara. Ainda que com outro nome na direção (e a diferença do estilo de Gray e Canet é gritante), Laços de Sangue tem tanto de Gray e sua obsessão pela família, que não ficaria deslocado ao lado de Os Donos da Noite.
Existem dois sentimentos majoritários em Laços de sangue. O primeiro é ressentimento: os irmãos protagonistas ressentem algo em seu passado que só descobriremos no meio da narrativa e isso os deixa sempre desconfortáveis na presença um do outro, algo que impede até mesmo um abraço após o tempo que não se viam desde a prisão de Chris. O outro é a certeza de que é família acima de tudo, porque apenas ela estará lá por você no final (e ao final, quando o filme faz essa máxima valer literalmente, é o clímax emocional de uma narrativa que as vezes parece até tropeçar nas próprias pernas, mas que faz tudo valer a pena quando o caminho chega aí sem fim).
São fundamentais, então, as performances de Owen e Crudup, ótimos atores nem sempre valorizados (Crudup, principalmente, dono de um trabalho fantástico em Quase Famosos que deveria ser mais comentado). Quando se encontram já perto do fim, com a gangorra trazendo naquele momento Chris bem acima de Frank em algo que sabemos não durará, pois o destino desenha ambos se encontrando no chão quando o fim chegar, os rostos (e corpos, porque existe um momento físico importantíssimo ali) dos atores se confrontam de uma maneira que nos faz sentir o peso de tudo aquilo. São dois sujeitos que estão dispostos a entregar suas vidas pelo irmão (e de certo modo, seguidamente entregam), mas que ainda assim se negam a mascarar rusgas do passado e presente em prol de uma futura relação saudável.
E há todo o peso daquela ligação recebida enquanto se assistem filmes da infância, onde se ouvem só três batidas na mesa. Filmes inteiros poderiam ser feitos com o mundo de sentimentos dessa cena. Sério. Que cena.
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