Spike Lee retrata a luta de soldados negros na 2° Guerra Mundial
[Spike Lee facts]
- Com Faça a Coisa Certa, lançado em 1989, o cineasta Spike Lee demonstrou que além do talento, era também um incendiário na questão racial;
-Após lançar Malcolm X, no início dos anos 90, Spike Lee declarou que só daria entrevista a repórteres negros;
-Com Febre da Selva, Spike Lee lança conseqüências negativas sobre as relações interraciais.
- Em 2008, durante lançamento de Milagre em St. Anna, Spike Lee trocou farpas com Clint Eastwood por ele não ter colocado nenhum ator negro no elenco dos filmes A Conquista da Honra e Cartas de Iwo Gima.
[Diretor de uma nota só?]
Vou me abster de comentar acerca desse histórico de polêmicas criadas por Spike Lee. Primeiro, porque criticar o óbvio é sempre o caminho mais fácil. E segundo porque não tenho know-how pra isso. Afinal, sou branco e de olhos claros. Se eu fosse negro, talvez enxergasse as coisas de maneira diferente. Tachá-lo de racista e concluir que suas ideias alimentam a baixa estima e o ódio racial seria lugar comum, e isso é cair no discurso vazio; é ver apenas um lado da moeda e de forma tortuosa. Mas deixarei essas questões para os sociólogos, sejam eles brancos, negros, mestiços, veados, simpatizantes do MST, filiados ao PT ou ao PSDB. Tanto faz.
O fato é que os filmes de Spike Lee incomodam, questionam, aborrecem muita gente. Milagre em St. Anna não é diferente. O longa é baseado num livro de James McBride, sobre o massacre de Sant’Anna di Stazzema, ocorrido na Itália durante a 2° Guerra Mundial. Mais de 500 pessoas foram assassinadas pelas tropas nazi-fascistas no incidente. O próprio escritor ficou encarregado do roteiro, embora o texto tenha ido às telas sob a versão e os olhos do cineasta. Gostando ou não do que o realizador tem a dizer, Milagre em St. Anna é talvez o único filme que retrate a participação dos soldados negros no conflito mundial, numa época em eles que eram proibidos de transitar em certos espaços públicos e só arrumavam empregos em postos de gasolina.
[Homem Adormecido]
O filme começa numa sala. O ano é 1983. Um homem solitário assiste na TV ao filme O Mais longo dos Dias, com John Wayne. Na tela vemos o famoso cowboy conversando com outros soldados cowboys a respeito de um crime de guerra. A cena encerra com um desabafo do espectador (negro, é claro) para John Wayne: “Peregrino, nós também lutamos por este país”. Na seqüência seguinte, ele cometerá um crime. Dentro da sua casa, a polícia encontra uma obra de arte, desaparecida em torno de 40 anos da Itália. Na prisão, se descobre a biografia do ex-combatente Hector Negron (Laz Alonso) e seu incidente vivido na guerra e a quem ele chama de O Homem Adormecido.
A história do Homem Adormecido é centrada no batalhão de soldados negros, conhecido como Buffalo Soldiers. Subestimados por um capitão sulista, quatro soldados do destacamento avançam em território alemão e ficam encurralados numa pequena vila na Toscana. O grupo é liderado pelo Sargento Stamps (Derek Luke) e pelo 2° Sargento Bishop (Michael Ealy), duas figuras bastante opostas no que se refere ao caráter. O soldado Sam Train (Omar Benson Miller) só está ali por acaso. Ingênuo e supersticioso, a guerra ganha um novo sentido para ele quando salva a vida do pequeno Ângelo (Matteo Sciabordi), a quem ele acredita ser abençoado. Entre eles está Negron que faz às vezes de soldado e intérprete entre italianos e americanos.
Enquanto o resgate não chega ao povoado, os combatentes fazem amizade com os camponeses e os partisans, grupo de desertores italianos que lutam contra os nazistas. Segundo uma moradora do vilarejo, a única rota de fuga para os americanos seria uma montanha que muitos dizem ser encantada.
Marcado pela irregularidade, Milagre em St. Anna possuía todos os elementos possíveis para ser um grande filme. Acontece que essa grandiloqüência se diluiu nos excessos de chavões, no excesso de acontecimentos e no excesso de duração do filme. Spike Lee demora quase três horas pra contar uma história que peca em muitos aspectos. A começar pelo discurso. É salutar que um diretor use seus filmes como palanque para divulgação de suas idéias. Acontece que o cara já usou e abusou desses argumentos. Bateu demais nessa tecla. Pode até ser válido refrescar a mente da sociedade sobre os abusos e as vexações sofridas pelos negros no passado e que perduram no presente, mas dificilmente isso vai causar sentimento de culpa em alguém. A posse de Barak Obama diminuiu ainda mais esse impacto.
Depois dos créditos finais, a impressão que dá é que os maiores erros do filme começam lá na introdução. Se o diretor não fosse tão previsível na abertura, o desfecho sobre o Homem Adormecido poderia ter sido impactante. É até estranho como um cara talhado como Spike Lee foi subestimar a inteligência do espectador. É claro que o longa tem boas passagens e uma produção digna dos R$ 45 milhões de orçamento que Spike Lee recebeu. O que não impede que o resultado final seja algo próximo de um O Resgate do Soldado Ryan com disenteria.
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