“Baseado na história verdadeira e quase desconhecida do pai da atual Rainha Elisabeth, que foi obrigado a assumir o trono, devido a abdicação de seu irmão Edouard VIII. De aparência frágil, incapaz de se manifestar em público, considerado inapto para sua função (Hitler conseguia conduzir seu povo), George VI terá de superar suas limitações e enfrentar seus receios com a ajuda de um especialista em “problemas da fala” que se vale de métodos não convencionais. Vencer a gagueira para assumir seu papel e fazer de sua nação o principal obstáculo contra as pretensões nazistas.”
O ganhador do Oscar favorece-se ao mergulhar na história do Rei George VI, sobre o qual pouco ou nada foi contado. Então o filme acaba por nos conduzir sobre uma visão que nos soa como descoberta. Outro ponto que faz com que simpatizemos com o que veremos é que a distância que o separaria de nós é minimizada, já que ele tinha problemas que o impedia de se exprimir em público (alguém mais comum em suma). Procurando se tratar ele acaba por contar com a ajuda de um especialista não reconhecido pela classe médica, que se vale de métodos poucos ortodoxos, mais que se mostram eficientes. Lionel se ancora em atacar a origem do problema e não suas manifestações.
O filme se preocupa em se fincar em mostrar as dificuldades pelas quais passa Bertie – futuro rei George VI – e as dificultosas relações familiares com seu irmão e seu pai. O ator Colin Firth se mostra emocionante quando o filme aborda este ângulo. Sóbrio, compenetrado, inseguro, com dificuldades para romper a distância social que facilitaria a superação de seu problema, são várias as nuances que fazem parte da composição deste rei quase que esquecido. Lionel vivido por Geoffrey Rush também tem seus atrativos, mas raras são às vezes em que o embate cênico, não pende para a figura real. De qualquer forma é agradável descobrir quão verdadeiro era seu status profissional, bem como não o sendo o que aparentava ser, ele o era, ao se valer de métodos que ainda hoje encontram eco nas terapias modernas. E eles capitaneiam um elenco que Harry Potter e sua franquia não permitia que dessem espaço ao seu talento.
O diretor, ainda que criticado por algumas de suas escolhas (fotografia principalmente), não compromete o resultado agradável. Ele aborda o tema de uma maneira sincera e conduz o elenco em torno desse tema sem grandes arroubos. O resultado não deixa de ser tocante. Consegue retratar temas humanos em uma época em que o contexto coroava o que havia de mais inumano.
Visualmente o filme tem algumas soluções interessantes: O Palácio de Buckingham é reconstruído, filmado como se fosse uma grande extensão desértica, nas quais seus habitantes se encontram sempre isolados. Para conseguir isso ele se valeu de dois instrumentos bem simples: O contra mergulho que é abandonado na medida em que paciente e médico chegam a um acordo e a lente de grande ângulo que mostra espaços escondidos nos espaços fechados. Ainda que estranhemos tal, daí muitas das críticas a fotografia do filme, isso se justifica pelo assunto abordado. E o final do filme nos encaminha para uma situação já retratada varias vezes pelo Cinema e a Literatura: Somos tragados por uma onda visual e moralmente moralista, onde o destino de um povo (ou do mundo) está ligado aquele de seu rei.
As imperfeições desse filme digno vêm do fato de às vezes ele querer nos dar uma lição de história esquecendo-se da lição de vida ali existente. Graças a Deus o diretor optou por quase nulificar essa via, deixando que tal ficasse em segundo plano. O que nos prende a atenção do início ao fim é a reação desse homem frente ao destino: O retrato do príncipe que se vê compelido, devido aos escândalos, a assumir o trono nas vésperas de uma Guerra. E como essas responsabilidades as quais não se furta, fazem com que aflorem a superfície suas crises de nervos, acentuando assim sua gagueira. E também como era necessário ele encontrar uma nova função na sociedade coeva, em se posicionando em uma posição menos elevada, sendo apenas mais um instrumento da resistência, e não o homem que carregaria sobre seus ombros sozinho a própria resistência. E assim deveria despertar em cada súdito, o que havia de mais nobre diante do adversário a enfrentar.
Para o futuro George VI, descer do pedestal e se sujeitar a um falso doutor pouco inclinado aos protocolos não foi tarefa fácil. Acentue-se ainda que o filme não deixa de explorar um certo ranço do monarca, ao sublinhar de forma velada, certo desprezo de seu país em relação a Austrália.Toca-se de leve em tal problema, de forma que diríamos politicamente incorreta mas ao mesmo tempo tão sutil que deve funcionar melhor entre os britânicos. Historicamente sabemos que existem erros grassos. Churchill não era simpatizante de Bêtie e procurou sustentar Edouard VI. E as ligações entre Edouard VIII e o furher que motivaram parte do descontentamento contra o rei nem é citada no filme.
Lamentei profundamente o pouco explorar o paradoxo entre um Hitler que empolgava as platéias e um não orador. Tal ficou colocado nos diálogos brilhantes que se arvoram na riqueza da linguagem, deixando-se o subentendido que é possível de dizer muito com um mínimo de palavras.
Cabe ressaltar que vi o filme nos cinemas e só o revi por esses dias. Preferi aguardar antes de postar ou dar meu parecer. Não quis ser iludido novamente por um projeto com a assinatura dos irmãos Weinstein. Na época ele conseguiram coroar “Shakespeare apaixonado” frente a Academia. E o filme até me agradou. Só que a cada revisão cada vez mais cai em meu conceito. Não parece ser o caso desse, que se está longe de ser algo fascinante, também o está de ser algo execrável.
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