Maravilhosos vultos cinematográficos. Assim nomeio casos como "Time Out of Mind" - filmes grandiosos, possuidores de mensagens fortes e relevantes, como uma belíssima sombra que passa por despercebida, não capta atenções, que não são verdadeiramente reconhecidos na altura correta, depois são facilmente esquecidos; grosso modo, obras subestimadas, que não encontraram a sua "voz" no seu lançamento, que ninguém fala sobre; e a pouca audiência e a pouca massa crítica que o viu, pouco aplaudiram, pouco manifestaram as virtudes deste espantoso objeto artístico do cinema independente norte-americano contemporâneo.
Contando a história de George (Gere), um homem recém desabrigado que tanto procura ajuda em centros e hospitais, como vagueia nas ruas de Manhattan em busca da sua própria identidade, o cineasta Oren Moverman oferece uma realização fascinante, com o suporte de um trabalho de câmera que oprime os personagens, ao filmar planos através de janelas e grades, reforçando, portanto, o mundo fechado no qual as figuras habitam, ao mesmo tempo que persiste em fotografar inúmeras cenas do sem-abrigo a pedir esmola pelas ruas de Nova Iorque, dormitar em bancos de jardim, andar de metro e beber cervejas.
Aliás, Richard Gere, que não ganhou nenhum prémio por este papel, oferece uma das melhores (e mais honestas) interpretações da sua carreira. Entregue a uma caracterização extremamente fiel e surpreendente, o astro, contrapondo a figura galã que tanto interpretou, encontra-se de péssimo aspeto, barbudo, enrugado, sujo, enquanto presta todos os maneirismos de um sem-teto e atribui uma personalidade própria e misteriosa ao seu personagem.
Conferindo uma incrível humanidade a cada pessoa que escreveu e que cruza com o caminho do protagonista (nem que algumas sejam limitadas a apenas uma cena), como o inspetor interpretado por Steve Buscemi no início do filme, a enfermeira, a funcionária que insiste no questionário sobre o histórico social de George, o "colega-papagaio" de abrigo que em tempos foi "músico de Jazz" (para não me aprofundar na excelente interpretação de Jena Malone), Moverman apresentou-nos um comovente retrato sobre a situação dos moradores de rua e até sobre o próprio passado. Excelente.
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