Notoriamente o mais fraco da trilogia de Klapisch, O Enigma Chinês pelo menos conclui a trilogia. Talvez não da melhor forma, mas de forma decente.
Depois da quantidade de emoção que as suas "prequelas" tiveram e transmitiram, as expetativas para o encerramento são altas. E o início, com o clássico ecrã dividido em retângulos a apresentar o elenco, promete a desejada fidelidade aos anteriores. O que só aumenta a expetativa. É então que o ecrã passa ao filme dito cujo. Começamos o filme com uma das notícias mais entristecedoras e arrasadoras que o cinema já nos deu: Xavier e Wendy acabaram.
Ouch!
Segundos depois dessa notícia, as imagens tornam-se uma névoa e as falas só soam como a voz da professora de Charlie Brown. A minha memória desta parte do longa foi condicionada pela tristeza desta notícia, daí as recordações estarem tão apagadas. A parte de que me lembro mais claramente é aquela em que a mãe de Xavier assume o papel do público e diz o que ele está a pensar: (parafraseando) eles eram um casal tão bom! Pois eram. Lamentavelmente, já sabemos que o tempo não costuma ser generoso e que a taxa de divórcios é alta. E Xavier e Wendy, embora fossem um bom par, não resistiram. Não os posso censurar por isso; os humanos são como são e se eles já não conseguiam conviver, pronto. Mas é uma notícia bastante soul-crushing (porque é que ainda não temos um equivalente para essa palavra, hã?).
Uma vez extinta a nossa principal ligação com a trilogia, só nos resta fazer o que o humano comum faz quando perde alguém que era parte da sua pessoa: ou refugiar-se nas memórias (o que é bom, mas a longo prazo raramente funciona porque leva facilmente à melancolia) ou refugiar-se nas pessoas que ainda tem, como nós viremos a fazer com Isabelle. Porque a alternativa seria...bem, seria o suicídio. E embora valha a pena lembrar que viver não é nenhum dever que nos possam exigir (era o que faltava!), o suicídio é algo a evitar. Note-se que nesta metáfora o espetador não se suicida literalmente; o suicídio para ele/ela, é parar o filme e ir fazer outra coisa. É uma opção válida, afinal de contas. Quem não faz isso fica com uma nova hipótese: apreciar a relação entre Xavier e Isabelle, que continua uma bacana, mesmo depois de anos. E, verdade seja dita, é bom ver Xavier passar mais tempo com ela. Pena não ser Wendy...
Posto isto, o filme avança ao seu ritmo, mostrando novas situações. O problema é que é quase tudo sem sal, pois as novas situações não têm a força das anteriores. E, para piorar, a ligação aos filmes anteriores não vai mais longe: não mostram mais ninguém do grupo de Barcelona! Nem sequer William, que poderia bem aparecer por ser primo de Wendy. Nem sequer a bendita Soledad, que os 2 anteriores quase ignoraram. Era uma boa chance para a trazer de volta...mas não. O grupo de Barcelona "sumiu" da vida desta gente. Realista? Pode ser, não digo que não. Mas não deixa de ser uma pena. No meio de tantas cenas abaixo das expetativas, acaba por haver uma que está num nível acima: a corrida de Xavier para avisar as duas Isabelles. Além de ter um desfecho hilariante, também se sente como uma homenagem saudosa à deliciosa cena em que o grupo de Barcelona corre para avisar Wendy. Muito boa, a cena conta com o engraçado pormenor de mostrar as Isabelles numa boa enquanto Xavier está atrapalhado à janela. E a parte em que fazem Martine passar por babá também tem graça.
Não há muito mais a dizer; o capítulo final de trilogia é bonzinho, mas não vai muito além disto. Gostaria de dizer que foi melhor, mas...se for honesto, para mim, o filme resume-se a isto: vai-começar-Xavier-e-Wendy-acabaram-blábláblá-que-coisa-triste-blábláblá-Isabelle-bláblá-não-há-grupo-de-Barcelona-bláblá-a-cena-das-Isabelles-tem-graça-bláblá-fim.
Sim. E por muito carinho que eu tenha à trilogia e a este O Enigma Chinês, não deixo de opinar que este encerramento da trilogia é praticamente anticlimático e sabe a pouco (mesmo com a refrescante frase sobre o bordado). Depois do excelente trabalho que foi desenvolvido nos dois primeiros filmes, ao fazer-nos afeiçoar ao grupo de Barcelona e ao casal Xavier e Wendy (este último numa cena arrebatadoramente linda), seria mais fácil fechar a franquia com um final tocante e capaz de fazer chorar as pedras da calçada. Mas não foi isso que foi feito. Uma pena. Continua a ser um filme mais agradável e decente do que muitos que se observam por aí, mas falta...falta...
E é por isso que acho que Richard Linklater terminou melhor a sua trilogia (insisto, as duas trilogias são muito parecidas!) do que Klapisch terminou a sua. Se o primeiro de Linklater não é tão bom como o primeiro de Klapisch, pelo menos a qualidade da trilogia de Jesse e Celine é bem mais constante que a de Xavier e...Wendy, hehe. O que não quer dizer que a de Klapisch não seja muito boa. Aliás, qualquer pessoa que seja apaixonada por Antes do Amanhecer e pelas suas sequências, que não passe um dia sem pensar em Jesse e Celine e que queira gritar ao mundo que esse é o melhor filme de sempre pode e deve fazer duas coisas. Primeira: ir ao médico, que essa obsessão não deve ser saudável, hehe.... Segunda: reviver muitas emoções ao ver esta outra grande trilogia que é a melhor resposta que o cinema podia dar à trilogia de Linklater. E que, por sinal, terminou mais cedo que a trilogia do Antes.
De nada!
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