Na maioria das vezes, quando um filme se destaca por sua parte técnica, quer dizer que, da obra em si, não se deve aproveitar muita coisa. Como a maioria desses novos filmes de super-heróis. Isso se deve até por causa do público-alvo, menos exigente com requisitos como roteiro e mais por explosões e coisas do tipo. Mas “O Grande Hotel Budapeste” foge dessa regra. Logo de cara o espectador já se encanta com a sua parte visual. Mas isso não quer dizer que seja só ela que se destaque.
O filme possui como ponto de partida para a trama a conversa entre o gerente de um hotel e um jovem escritor durante um jantar no Grande Hotel Budapeste. Durante essa conversa, ele conta como foi a sua trajetória no hotel, como ele ascendeu de mensageiro para gerente. O tal hotel que dá nome ao filme é uma instituição já ultrapassada, ficando vazia a maior parte do ano. Mesmo assim, o jovem escritor (ele não tem nome no filme mesmo) nota que há uma estranha ligação entre ele e o hotel, ao ponto de fazê-lo dormir no mesmo quarto em que dormia na época de mensageiro.
Quando o jovem futuro gerente do hotel aparece, ele se apresenta com um nome bem sugestivo: Zero. Pois isso é o que ele é dentro daquele sistema: o último da hierarquia hoteleira, um legítimo zero à esquerda. Essa sina e tão grande que, por onde quer que ele vá, ele sempre está com um boné com o nome de sua insignificante função: “lobby boy”. E para ratificar mais ainda essa nulidade dos mensageiros, quando questionado sobre se começou por essa função no hotel, o então gerente (Ralph Fiennes) reluta grandemente em responder, parecendo estar incomodado com a pergunta. Aliás, esse é um personagem extremamente cativante. O ponto forte do roteiro do filme é a amizade entre esses dois. No início, como já foi dito, ele era um zero à esquerda, que não deveria ficar sempre à sombra do seu gerente. Porém, com o decorrer do filme, eles passam a se tornar cada vez mais amigos e até cúmplices (no sentido figurado e literal do termo, uma vez que eles cometem um crime durante a trama). Na medida em que o filme avança, eles vão se tornando cada vez mais parecidos. Aqui vale ressaltar uma cena interessante. Depois de uma briga, os dois acabam machucando gravemente o nariz. Um está vestido com um terno da melhor qualidade, o outro com o seu boné “lobby boy”. Mas o nariz de ambos sangra da mesma forma, mostrando como eles são iguais por dentro (essa foi brega, admito...).
Personagens interessantes não faltam nesse filme. Um que vale destacar é Agatha, uma menina com uma mancha de nascença do formato do mapa do México no rosto. Fala sério! O que tem de mais “kitsch” do que uma moça com o México na cara?! Muito legal! O filme possui vários outros personagens legais, interpretados por atores de altíssimo nível: o sombrio filho psicopata interpretado por Adrien Brody, o assassino de aluguel no maior estilo Anton Chigurh vivido por Willem Dafoe, um policial caxias (Edward Norton) e um advogado excêntrico (Jeff Goldblum), além dos sempre marcantes Bill Murray e Owen Wilson, com aparições mais discretas.
A trilha sonora desse filme é bonita, possuindo uma boa sintonia com o que passa na tela. Mas o que chama atenção pra valer nesse filme são mesmo a direção de arte e o figurino. No momento em que o Zero crescido se encontra com o jovem escritor, o espectador contempla um belíssimo hotel, cujo enorme saguão de entrada é quase laranja por completo. O espectador, apesar de nesse momento se deliciar com esse espetáculo visual, fica com receio de ver um filme todo em que tudo e todos são laranja. Mas os cenários do filme mudam sempre, em cada lugar possui um estilo diferente, dando um ótimo contraste às sequências, possuindo como ponto em comum mesmo uma maravilhosa extravagância. Além do hotel, também vale a pena citar a mansão Vitz. Na cena em que a sua falecida dona está sendo velada, a sala do testamento (diferentemente da do velório, abarrotada de gente)possui vários animais mortos empalhados na parede e, sentados na frente, os filhos do defunta vestidos de preto, como urubus. Vários outros cenários aparecem de maneira brilhante, como um trem, uma prisão e até uma abadia, tudo exagerado ao quadrado. O velho Wes Anderson é a prova de que dá para fazer um cinema sofisticado sendo brega.
Comentários (0)
Faça login para comentar.
Responder Comentário