O Homem da Máfia (2012) - Review
Em 2008 teve início uma grave crise financeira de escala mundial que abalou profundamente as estruturas da sociedade e acentuou ainda mais as diferenças econômicas de suas classes. Em um cenário de falta de oportunidades, o crime sempre se apresenta como uma alternativa fácil e rápida para ganhar dinheiro, ou até mesmo muito dinheiro, dependendo da coragem do indivíduo. Mas o que seria da coragem sem uma boa dose de estupidez? Caras ficam gananciosos com o mero cheiro da grana, e fazem coisas idiotas.
Um pequeno empresário do ramo ilegal contrata 2 incompetentes para fazer um "trabalho". Coisa rápida, diz ele. Sem riscos, ele diz. O tal trabalho consiste em roubar uma casa de jogos clandestina pertencente à máfia. O plano brilhante é deixar a culpa pelo serviço recair sobre o gerente (Ray Liotta), um cara com imagem já queimada no passado perante seus pares e sem qualquer margem de tolerância para errar novamente. Muito fácil, certo? Errado, muito errado.
Como consequência, as pessoas ficam com medo de jogar e o mercado underground de jogos sofre um forte abalo, as fontes de dinheiro começam a secar. Sendo o bolso o órgão do corpo que mais dói, a situação precisa ser resolvida urgentemente. A solução se materializa na figura do assassino interpretado por Brad Pitt, um homem contratado pela máfia para resolver os problemas frutos do risco do negócio.
Numa concepção maquiavélica, é evidente que a vingança deve atingir alguém de forma rápida, exemplar e de uma só vez. Porém, para a mensagem ser enviada não devem morrer apenas aqueles que de fato cometeram tal estupidez, mas também aquele que as pessoas nas ruas pensam ser o culpado. Nesse ponto temos parte do argumento que confere um certo brilhantismo ao filme. De forma sutil sugere que, quando há uma crise financeira, a confiança dos investidores deve ser reestabelecida a qualquer custo. Num cenário de profunda decadência moral, o dinheiro é o valor que realmente faz a diferença, ante o descaso com a afinidade e lealdade entre as pessoas.
Confortável no papel de um gângster cool, Pitt entrega uma interpretação sólida. Um ator não chega à toa ao conceito que ele possui perante crítica e público, e aqui, no domínio de suas habilidades, mais uma vez confirma seu status. O personagem é o porta voz das principais críticas sociais feitas pelo filme, numa performance que ecoa distantemente seu papel em Clube da Luta (1999). Em certa hora diz "este país está perdido" em referência à mentalidade corporativa que corrói qualquer sistema, até mesmo um corrompido por natureza como o crime organizado.
No entanto, a força motriz por trás do filme é mesmo o diretor Andrew Dominik. O australiano possui uma técnica que salta aos olhos, com as cenas claramente construídas de forma elaborada. Seu estilo estético aliado à temática do filme conferem à produção um ar neo-noir que lembra o excelente filme Drive (2011), só que menos carregado nas tintas. A opção por integrar à trilha sonora discursos patrióticos de Bush e Obama sobre a economia dos EUA à beira de uma recessão dá um tom irônico adequado ao filme e às vezes até involuntariamente engraçado. No entanto, houve um certo exagero no uso de tal recurso, por vezes tornando-o invasivo ao invés de informativo.
"O Homem da Máfia" é um filme autoral, no qual o diretor é a principal força criativa e seu estilo dita o ritmo. Certamente é um filme muito bom, mas não é fácil de ser digerido. É um suspense apoiado nos diálogos tensos e atuações em cena, com longas tomadas recheadas de muita conversa e pouca ação. A violência é apenas pontual porém intensa, utilizada como um recurso para sublinhar que o submundo do crime é na verdade desprovido de qualquer beleza e glamour. Talvez por essa idéia falte ao filme uma certa elegância que impede que seja um clássico do nível do Poderoso Chefão, a bíblia do gênero. Entretanto, suas críticas sociais o conferem algo que o torna bem mais do que um simples filme de gângsters. Recomendado.
Comentários (0)
Faça login para comentar.
Responder Comentário