"Eu não sou um monstro."
O que leva o personagem Walter a soltar esta afirmação a certa altura de O lenhador? O que te tão horrível Walter pode ter feito para alguém tê-lo julgado desta forma?
O fato é que, Walter passou seus últimos 12 anos na prisão. Isto por si só, já despertaria um julgamento prévio e a atribuição da alcunha que ele nega na frase acima, mas, o que realmente faz com que ele seja julgado como tal, é o porquê de sua temporada na prisão: Walter é pedófilo.
Como não julgar como sendo um monstro alguém que não só sente desejo por crianças e/ou adolescentes, como também o manifesta? Como não chamar de monstro alguém que os próprios criminosos, em seu código de honra (ao lado dos estupradores) consideram a escoria da humanidade? Mesmo em meio à assassinos psicopatas, os pedófilos não são respeitados (nas prisões é comum que estes sejam submetidos à espancamentos coletivos,e estupros constantes para “aprenderem a lição” por parte dos colegas de grades).
Ora, se os próprios criminosos tem essa opinião sobre os pedófilos, por que nós, ditos pessoas normais da sociedade, deveríamos considerá-los humanos e não monstros?
O lenhador, dirigido pela estreante Nicole Kassell, busca a humanização da figura de um pedófilo.
Após 12 anos de prisão pelo referido crime, Walter está de volta à sua cidade natal. Buscando um recomeço, Walter arruma um emprego, uma namorada, e começa a freqüentar sessões de terapia. Mas, as coisas não são tão fáceis, afinal, ele é obrigado a conviver todos os dias com o seu objeto de desejo, já que reside em frente à uma escola primaria, isso sem mencionar os olhares de desconfiança dos colegas de serviço, além é claro, do oficial que supervisiona sua condicional, apenas esperando por um deslize de Walter para mandá-lo de volta para a prisão.
O grande mérito do roteiro de Steven Fechter (com contribuição de Kassell), baseado em uma peça teatral de sua autoria, é não explicitar o crime de Walter em sua totalidade, sabemos que o que ele fez, mas, não temos detalhes do seu ato, não sabemos de quantas garotas ele se aproveitou, nem de que forma se deu seu crime, e isso contribui para que mantenhamos uma proximidade necessária para a narrativa ter o efeito ideal: sabemos que o que o personagem fez é errado, mas, acabamos tendo uma certa compaixão por ele, exatamente por não sabermos a extensão de seu crime.
E muito dessa compaixão despertada em nós espectadores deve-se à Kevin Bacon, brilhante no papel principal. Bacon tem um desempenho minucioso, compondo Walter de maneira semelhante à um dependente químico. Bacon exibe nos olhos um misto de fascinação e desejo pelas crianças que vê ao seu redor, ainda que nitidamente despreze esse traço de sua natureza (e isso fica evidente quando no ultimo ato, Walter espanca um outro pedófilo que ronda sua vizinhança) e desejo parar com essa compulsão. E desde já, a cena em que Walter desabafa sobre sua infância em uma consulta na terapia, é uma das mais poderosas da carreira de Bacon.
A fotografia, sempre em tons monocromáticos e sombrios, se junta a ótima trilha instrumental para ajudar a moldar a obscura personalidade do protagonista. E estabelece um certo tom de opressão que rege a sua vida.
Claro que o longa também apresenta alguns pontos fracos, um exemplo é a maneira simplista como as imagens das lembranças de Walter e seus atos passados surgem na tela, sempre em um tom de pesadelo, sem nenhuma inovação. Bem como o desenvolvimento do relacionamento entre o personagem e Vicky (Kyra Sedgwick), que é feito de forma abrupta e apressada, para servir aos propósitos da narrativa.
Mas, isso acaba sendo pouco perante uma historia tão poderosa de um tema ainda muito polemico e difícil de ser tratado nas telas.
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