O Mágico de Oz é realmente um filme especial. Especial por nos lembrar o poder do faz de conta. A fantasia não morreu no cinema hollywoodiano contemporâneo. Pelo contrário, nunca houve tanto saudosismo em relação aos contos de fada ou às demais narrativas fantásticas, clássicas ou modernas. Entretanto, impera hoje uma exigência pela verossimilhança. Tudo tem que fazer sentido: a concepção visual, os efeitos pirotécnicos, o desenvolvimento das personagens, os acontecimentos do enredo. E nesse desejo pela lógica se esquece que um objeto banal como uma vassoura pode evocar todas as fantasias possíveis, bastando apenas um pouco de imaginação. É isso que O Mágico de Oz, em seus quase oitenta anos, nos lembra. Os cenários hiper-coloridos feitos de plástico e tecido, os efeitos visuais toscos ou explicitamente artificiais, a afetação das atuações e caracterizações, a montagem quase teatral das cenografias, as rimas e coreografias do musical: todos já suficientes para a construção de um mundo extremamente lúdico e encantador.
É sintomático que o mágico do título seja um charlatão: a sua magia surge de puro truque e encenação, o que não diminui a a retórica e mesmo a beleza de suas lorotas. Ele, inclusive, representa um vínculo com toda uma tradição de teatro ambulante, as atrações populares que iam de cidade em cidade encantando a tantos com tão pouco (ao menos comparado com hoje). O cinema não surgiu das narrativas de Griffith, mas dessa tradição popular, dos eventos de feiras e circos que celebravam “a grande novidade”, majoritariamente com filmes de truques de mágica ou comédias anárquicas. O Mágico de Oz não deixa de referenciar esse primeiro cinema, sobretudo na primeira parte em Kansas com os belíssimos quadros em tom sépia. Embora a terra da fantasia seja demarcada com a explosão estratégica das cores no segundo ato, desde o começo temos uma história de faz de conta, vide os contrastes cromáticos, cenografias com um quê de teatralidade e os números musicais - e no momento em que Dorothy senta no corpo de uma carroça enquanto termina Over the Rainbow já conseguimos imaginá-la partindo para a terra de seus sonhos na carruagem dos munchkins.
Em última instância, o cinema fantástico parece sempre retomar aqueles primeiros filmes, as pirotecnias inventadas em cada época apenas enriquecendo o seu repertório de truques para o grande público. Mas o que o Mágico de Oz nos mostra é que para tanto não precisamos abrir mão da imaginação. Um diploma já é suficiente para se ter um cérebro. Um tapete florido o suficiente para cobrir uma majestade. Uma canção o suficiente para conceber um mundo de cores e sonhos além do arco-íris.
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