O fato de os dois homens de O Segredo de Brokeback Mountain (Brokeback Mountain, 2005) estabelecerem, antes de um caso de amor, uma relação de intimidade com a natureza da montanha do título, para a qual eles são designados a trabalho, criando contato com a vegetação, o clima, os animais presentes, etc., algo que corresponde a uma boa parte inicial do filme, marcada por pouco barulho a não ser os sons ambientes, diz muito sobre o que Ang Lee quer propor com essa história de amor proibido, narrada com muita sensibilidade e contemplação.
No tumultuado romance entre Ennis Del Mar (Heath Ledger, na melhor atuação de sua infelizmente abreviada carreira) e Jack Twist (Jake Gylenhall, também excelente), a montanha na qual descobrem o desejo um pelo outro assume uma posição de entidade, símbolo que está em cena mesmo quando a ação abandona o verde relevo e parte para o cinzento da cidade, porque representa o amor dos dois, enquanto uma força natural e imutável. Para Ang Lee, então, a relação entre e o homem e a natureza é indissociável, de forma que os dois vaqueiros vão gradualmente tornando-se parte do cenário, que, inicialmente, vão descobrindo, desvendando e desmistificando até tornar aquela natureza, aparentemente hostil de início, em sua própria.
É a velha história do amor proibido, como conhecemos desde os amantes trágicos de Shakespeare, contada com uma sobriedade desconcertante, que dá um peso absurdamente humano à paixão impossível, muito mais sentida que falada, nunca catártica. O Segredo de Brokeback Mountain, aliás, pensando ainda na alquimia entre o homem e a natureza, é um filme de silêncios, de homens tentando antes de tudo de conhecerem e darem voz ao que sentem, nem sempre de forma bem sucedida, e aí que reside o peso da tragédia que envolve a saga dos dois vaqueiros, que por anos, décadas, não conseguem viver inteiramente o sentimento, só possível sobre o relevo da montanha – não à toa, mesmo em seus momentos finais, nunca se permite ser direto.
O discurso demagógico sobre aceitação, então, não tem vez aqui em diálogos panfletários, porque Ang Lee já arremata essa questão ao contrastar a cidade – e a realidade cotidiana – incolor, com mulheres frustradas, empregos desagradáveis, filhos, onde são obrigados a viver com o ambiente pulsante do lugar onde se conheceram (não só um ao outro, mas a si próprios) e na qual só existe espaço, realmente, para os dois. Apenas lá na bucólica Brokeback Moutain, que com o passar dos anos, vai tornando-se para os dois uma lembrança cada vez mais distante, resgata-se a naturalidade, na fotografia e na trilha sonora, perdida na vida social cada vez mais desgraçada, então recobramos o porquê de a relação entre os dois, a despeito das circunstâncias do dia a dia, ser tão especial; não por ser única, mas por ser verdadeira, intensa e, acima de tudo, natural. Como a montanha.
Comentários (0)
Faça login para comentar.
Responder Comentário