Dono de um dos roteiros mais instigantes dos anos 90, O Show de Truman conta a história de Truman Burbank, um homem comum, com uma vida comum, vivendo com sua esposa, seu emprego e seu ciclo de pessoas numa cidadezinha pacata. Acontece que Truman na verdade é o protagonista de um programa televisivo, sem saber. Desde seu nascimento, todos os seus movimentos são filmados e exibidos ao vivo por todo o mundo. Todas as pessoas a seu redor são atores e todas as vossas ações são planejadas.
A mente por trás de todas as ideias é um empresário megalomaníaco que adotou Truman e decidiu criar um mundo somente para ele. A cidade fictícia nada mais é que um gigante cenário. Os atores sempre foram orientados a inventar histórias e sempre buscou-se satisfazer todas as necessidades de Truman, para que este nunca desenvolvesse vontade de viajar e conhecer outros locais. Quando Truman começa a ter curiosidade sobre além de seu habitat e questionar alguns eventos, tudo fora do script, a trama do filme começa a mudar seu rumo.
Paralelamente ao show de Truman, vemos os espectadores do mundo real acompanhando, torcendo, vibrando, sorrindo e se comovendo com o maior espetáculo de show business do mundo. Não vemos as pessoas fazer algo que não seja assistir ao evento sem desgrudar os olhos da TV, mesmo quando estão num bar ou tomando um banho de banheira. É possível ter várias interpretações sobre este filme, mas sempre elas estarão relacionadas ao poder e influência da mídia sobre as pessoas.
Como toda crítica social, O Show de Truman mantém-se atual, mesmo tendo sido lançado em 1998. Um dos grandes triunfos de filmes atemporais é a capacidade de adequá-los à época em que nos encontramos e ao cotidiano em que vivemos. E uma vez que a tecnologia vem em constante progresso, o poder midiático tende a crescer a cada ano.
Atualmente, sobretudo na internet, a maneira de se conseguir status é através da propagação de conteúdo, seja este cultural, como a divulgação de um site ou de um vídeo seu tocando algum instrumento, ou fútil, como fotos, memes, vídeo-cacetadas, etc.
Só que, assim como os que dão audiência a Truman Burbank, há aqueles que acabam dando uma importância maior do que o devido ao que se vê na internet ou na televisão. Como exemplo mais recente temos este cantor sertanejo que veio a falecer num acidente com sua namorada. Houve tanto os que comentaram a respeito de maneira um pouco depreciativa, questionando a qualidade de suas músicas, quanto os que teceram linhas e linhas de indignação, seja para esses primeiros ou pela simples morte em si. E o que se viu por aí foram diversas discussões virtuais entre esses dois tipos. Acabaram dando uma repercussão, beirando o desagradável, maior para algo tão natural como a morte de uma pessoa. Claro, mesmo sendo famoso ele merece ser velado com toda decência e seus conhecidos merecem todas as condolências. Mas fosse alguém qualquer, como milhares de pessoas que falecem todos os dias, muitas vezes por terem vivido em condições subumanas, não haveria tanto rebuliço. E a dor da perda é igual.
Ainda no caso do cantor, ouvi e li por aí, sem a menor vontade de aprofundamento, que vazaram fotos e vídeos que mostram as condições pós-acidente, o que é mais uma prova do quanto o bom senso e a privacidade vêm sendo perdidos. Hoje é possível filmar e registrar tudo, por mais adversa que seja a situação de quem está sendo filmado. As pessoas sentem nervosismo ao prestar socorro a vítimas de acidentes ou simplesmente pelo fato de observarem. Mas dificilmente você verá uma gravação saindo tremida: o propagador aparenta não estar nem um pouco abalado com sua câmera ou celular em mão.
As tecnologias estão aí para nos ajudar. Os veículos de comunicação nos fornecem informações que solicitamos numa velocidade que até um tempo atrás ninguém imaginava. Mas é necessária uma dosagem adequada de utilização de tais modernidades. Se não em quantidade, ao menos no cuidado com o que estamos escrevendo, compartilhando, divulgando, alimentando, propagando, consumindo.
Que texto bonito, Ítalo. Não faz muito que escrevi sobre esse também, pois é um dos filmes mais bonitos de sempre.
Obrigado, Cristian.
Sim, pode ver que nem falei muito sobre o filme em si. Primeiro porque tudo que tinham para dizer já foi dito, e segundo porque me faltam palavras por ser lindo demais.
Essa lindeza nunca vai envelhecer.