Ir contra a corrente não é a definição mais coerente para o estado de James Gray no cinema americano atual, na verdade é bastante imprecisa, mas talvez sirva para ilustra o que o cineasta vem realizando e a maneira como o faz. Na verdade, pode-se dizer que ele simplesmente não se permitiu ser levado pela corrente. Seus contemporâneos que encabeçam a geração são donos de estilos inovadores ou desapegados de tradições (apesar das influencias obvias que qualquer um carrega), realizam um cinema que atrai a nova geração cinéfila ou não, o que lhes dá maior destaque. Já Gray parece ter passado muitos anos na penumbra em conseqüência do seu traço conservador, exaltando o classicismo e com decisões estéticas econômicas, porém em sintonia com sua proposta. Mas passados quase quinze anos, desde seu primeiro filme, de dúvidas sobre o que realmente seria e que rumo tomaria seu trabalho, Gray lança em seqüência duas obras que selaram um estilo e uma reputação no cenário mundial, hoje o diretor revive, com identidade própria, o cinema ‘’classudo’’ como ninguém, lhe dando novos ares, inclusive. Narrativa paciente, cores suaves, roteiro SM grandes complexidade, mas direção tão intensa que as resoluções fáceis da historia sucumbem sozinhas, James Gray transcende a tela.
Os Donos Da Noite (We Own The Night, 2007) é o primeiro dos dois filmes que o firmaram, vem sete anos após Caminho sem Volta (The Yards, 2000) e um ano antes de Amantes (Two Lovers, 2008), para mostrar que cinema de excessos é apenas uma opção. Filme policial sobre relações intensas, lembra Coppola no auge, mas melhor não dimensioná-lo à O Poderoso Chefão (The Godfather, 1972), também lembra Eastwood, igualmente econômico e intenso. A historia se concentra em uma família onde um dos filhos segue os passos do pai, o orgulho e o outro se desvia desta diretriz patriarcal, um desgosto, Mark Walhberg e Joaquin Phoenix, respectivamente. E a própria sociedade americana é exposta com seu conservadorismo exagerado, onde Walhberg, filho casado com filhos, segue os passos de seus antecedentes – como um modelo – e Phoenix aquele com relacionamento, a primeira vista incerto, com uma latina, Eva Mendez, catalisadora de emoções e reações tanto do personagem de Phoenix quanto de sua família. Mas Gray prefere se desviar deste contexto social e buscar maiores possibilidades.
Não sabemos o que levou os personagens até ali, por que o pai ou como o outro se tornou homem de confiança do dono russo de uma casa noturna badalada da cidade, mas o que é a situação, é situação que Gray propõe à narrativa. O próprio caos interno se instala quando a vida profissional de todos se cruzam, administrador de boate, Phoenix (que vive Bob Green) convive com todo tipo de pessoa, incluindo traficantes perseguidos por seus familiares da polícia, mas ele não quer se meter, mantém distancia, não quer comprometer o que já conquistou – suas primeiras cenas mostram a ganância na qual se afundava -, sua consciência é complexa, para ele ser omisso não significa colaborar com o crime, o que obviamente transtorna seu pai e irmão.
A transformação de personagem é poderosa em termos de sensções emitidas. Após chocar-se à realidade violenta, onde é impossível ser omisso na guerra entre lei e crime - ‘’mais cedo ou mais tarde você terá que escolher entre nós ou eles!’’ – Phoenix está em um bar/restaurante onde tem uma breve conversa com o traficante perseguido por seu irmão, a câmera de Gray se aproxima dele enquanto o outro fala, toda sua fúria contida jorra da tela monstruosamente, está ali o ator, Joaquin Phoenix genialmente parado, dominado, contido e retraído, mas o que está na tela não é o que está sendo passado, poucas vezes se viu o ódio ser passado de forma tão eficiente e incomodamente passivo quanto ali. Aquele momento é gigante. E assim a vida de Bob Green vai sendo moldada e transformada, apesar de suas tentativas frustradas de resolver as coisas sigilosamente. Acaba sendo obrigada a retorna ao núcleo de sua família e agir em nome deles, por mais que isso lhe renda uma vida na sombra, que tenha sua liberdade retida e gere inconsistência no seu relacionamento.
O roteiro de Gray não chega nem perto de ser engenhoso, pelo contrario, em mãos alheias dariam em algo superficial demais. Mas o roteirista/diretor trás consigo uma carga dramática que parece ter nascido pronta, medida e testada com ele, sua facilidade em extrair emoções reais das situações é algo fora do comum, transparece intensidade de modo assustador, facilmente uma de suas principais características e necessárias do seu cinema. E faz de uma historia limitada, um filme preciso e essencial de seu tempo. O circulo familiar abordado por ele é de fato, um circulo, o núcleo da obra gira literalmente, um personagem levando a outro, propositalmente casando com seu modo de contar historia. Phoenix tem pai e irmão policiais que caçam um traficante sobrinho do dono da boate administrada por Phoenix. Seu enredo começa e acaba no mesmo ponto, o que no filme do filme se mostra necessário visto que a discussão tem por base os relacionamentos acerca de uma família, centralizando um único personagem, e a idéia de um circulo contribui na essência e na mística da obra.
James Gray mostrou que tem o que oferecer ao cinema, no fim das contas é algo até original já que é quase único no que faz hoje, preservando moldes clássicos e com qualidade, mas sempre com traços particulares, mas é preciso mais algumas obras para comprovar que possui consistência, mas é difícil acreditar que não venha a se superar cada vez mais. Pelo que fez até agora, com o auge em Os Donos da Noite, onde todos os seus traços são levado ao extremo, não se renderá a outro estilo. Trabalhar com Joaquin Phoenix também não fará mal algum, cada vez que assisto a um filme seu, menos dúvida tenho de que é o melhor de sua geração. We Own The Night é isso, James Gray em essência, força e intensidade.
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