Dentre os musicais clássicos de Hollywood, talvez “Os Homens Preferem as Loiras” seja o mais superficial de todos, mas, quem diria, tal detalhe não é um defeito. Tomando a seu favor a ótica do externo e a falta de profundidade, Howard Hawks acabou por tornar seu filme um maravilhoso musical cheio de inegável energia e personalidade, nem sempre politicamente correta. Contando com a produção feita pelo estúdio Twentieth Century Fox e com um elenco brilhante, o filme se estabeleceu como uma das grandes obras de 1953 e um orgulho na carreira de muitos dos envolvidos, por ser essa mistura de músicas inesquecíveis, boas atuações e uma direção eficiente para um roteiro genialmente satírico.
Adaptando uma das famosas peças da Broadway, a obra narra a história de duas belas dançarinas, Lorelei (Marilyn Monroe) e Dorothy (Jane Russell), que vão viajar num cruzeiro rumo a Paris para estrelarem sua mais nova peça. O sogro de Lorelei contrata um detetive particular (Elliot Reid) para vigiá-la e conferir se ela não comete alguma infidelidade contra seu filho, um homem bem-sucedido e bastante ciumento. É claro que esta trama simples servirá para muita comédia, confusões e cenas musicais de cair o queixo, sendo a base para essa imperdível comédia musical com pitadas de romance.
Como dito anteriormente, é difícil encontrar um filme como esse que é capaz de transformar o materialismo e superficialidade em grandes benefícios para si. O espetáculo cor-de-rosa estrelando Marilyn Monroe é a principal das lembranças daqueles que já se aventuraram no musical, não só por ser uma das cenas de máximo glamour visual e vocal na carreira da diva, mas por traduzir a linguagem divertida da obra, a de confessar que toda mulher adora dinheiro e todo homem ama dar esse conforto às suas damas, isso, no plural mesmo. A alegria material é o grande ponto de referência aqui, dando destaque às preciosidades e golpes em detrimento do coração... Mas, quem liga?
Afinal, há arte mais cômica e acessível do que estereotipar tudo e todos? As figuras clássicas dão cara á tapa nas telas e não estão nem aí. O velho adúltero, a loira interesseira, os jovens sarados loucos por uma noite de amor, o que importa é a aparência e o discurso politicamente incorreto declarado durante a projeção, quase um protesto contra todo aquele sentimentalismo barato de vários dos musicais anteriores e seus estilos uniformes e comportadinhos, como se o gênero só fosse composto de obras doces e cheias de bondade alheia. Todos sabiam no que estavam se metendo, e fizeram com classe.
Será que todo filme precisa de grandes filosofias, girar ao redor de grandes questões intelectuais? Não. Será que todo filme precisa de inteligência? Sim! E “Os homens preferem as loiras” possui tal. A rapidez das piadas, fundamental para o timing perfeito de qualquer comédia que se preze, é construído por Hawks e enunciado pelo elenco, cada sacada já é logo substituída por outra. É aquele humor classudo, que não se vende pra tiradas idiotas ou cenas que nada tem a contribuir para o andamento de tudo. Talvez o grande truque da comicidade está nas várias frases de duplo sentido, prontas para divertir qualquer um com mente poluída ou rapidez na captação dessas possibilidades deixadas pelo roteiro insinuante, adicionando diálogos ingênuos e ao mesmo tempo libidinosos, coisa de mestre mesmo.
É um filme cuja essência continua tão viva como o dinheiro segue fundamental. Os pecados capitais se convertem em prazeres efêmeros e vida vira um luxo banhado a músculos e diamantes, principalmente para os sorrisos ambiciosos de Monroe. Esse materialismo guloso é representado nos maiores sonhos burgueses, filmados com brilho, nos melhores e mais clássicos filmes hollywoodianos com humor, ironia e ideais nem sempre considerados corretos. Como se não bastasse a imortalidade de “Diamonds are a girls best friend” e uma dupla feminina em perfeita forma, todo o espetáculo é comandado por aquele que se tornou uma lenda em Hollywood, transformando os diversos batons vermelhos, tiaras valiosas e flertes gratuitos numa pequena obra-prima musical dos anos cinqüenta, década de inúmeros clássicos do gênero, como “Cantando na chuva” e “A roda da fortuna”. Se a obra tivesse que ser resumida em uma frase, seria simplesmente: Um delírio hawkiano.
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