O que torna Preciosa (Precious: Based on the Novel Push by Sapphire, 2009) diferente de qualquer outro filme de superação que chegam aos montes no cinema todo ano é, ironicamente, este não contentar-se em sê-lo, não se assumir – como se fosse um demérito - como 'uma história de esperança’ típica, tal qual sugere o seu subtítulo nacional. Isso porque o esquema narrativo tradicional desse tipo de produção, geralmente muito clara quanto aos seus objetivos, é seguido aqui como um meio para um discurso, um suposto comentário social maior e pretensamente mais relevante que os personagens, seus dramas e, em última instância, o filme que os veicula.
Preciosa acaba sendo sempre óbvio não por seguir aquela cartilha tradicional dos contos de superação pessoal, mas por fazer com que cada etapa funcione como parte de uma mensagem pronta desde os primeiros segundos, de modo que nada que a própria protagonista, em sua desgraça social, pessoal e afetiva, viva no filme funcione com outro papel que não o de aparentemente ilustrar a falta de oportunidades para pessoas marginalizadas, como a personagem-título que é mulher – importante essa palavra porque se trata no fundo de um filme feminino, com mulheres tentando sobreviver às adversidades do convívio de uma sociedade machista, embora esse interessante aspecto não tenha sido bem explorado -, negra, obesa, analfabeta para tecer um comentário social que pretensamente serve para justificar (e perdoar) não só a mão pesada no melodrama, como os recursos de estilo questionáveis (a exemplo da fotografia que tenta de início transmitir a ‘sujeira’ em que Preciosa está inserida, ou as rimas visuais de um mau gosto total) por parte do diretor Lee Daniels.
Em função do carregado comentário social (que, diga-se, nunca deixa a narrativa respirar), o filme, cena após cena, incide no mesmo erro de simplificar e manipular a história de vida daquela garota, entregando tudo pronto, dito e repetido pela boca de cada personagem (quando não a protagonista, sua mãe, sua professora ou mesmo a assistente social), o que acaba trazendo a constatação de que não há crença na premissa em si – que tinha um potencial dramático acentuado –, por isso apela tanto para recursos visuais e narrativos que vêm com o propósito muito besta de causar a reflexão pelo choque imediato, tentando enfiar uma moral didaticamente entregue desde o começo goela abaixo do espectador. Não engoli.
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