No final da década de 1990 e início da década de 2000, com o advento da técnica do CGI, o cinema de animação foi dominado pela disputa da Disney/Pixar contra a Dreamworks. Não é à toa que, com exceção das edições de 2003, 2006 e 2007, o Oscar da categoria “Melhor Animação” ficou sempre na mão das duas rivais. Mas, nos últimos anos, outros estúdios estão ganhando mais espaço, como em “Rango”, o previsível ganhador da estatueta de ouro do em 2012.
O argumento inicial do filme não empolga, apesar de ter o Velho Oeste como cenário: um Zé Ninguém, que nunca cai na real, acidentalmente, acaba, acidentalmente, derrotando o brigão de uma cidade, sendo aclamado como herói e se vangloriando disso, ideia idêntica ao mediano “O Espanta Tubarões”. Mas, diferentemente deste, “Rango” consegue dar prosseguimento à história com excelência, adicionando elementos que não o tornou em momento algum cansativo, apesar de ser longo para uma animação. Um camaleão (dublado por Johnny Depp na versão original) é o tipo sonhador, que sempre cria as situações mais mirabolantes em seus filmes imaginários. Mas, após se perder de seus donos e, sem querer, derrubar uma águia que aterrorizava um vilarejo, é aclamado como herói pelos seus habitantes. Após adotar o nome de Rango, ele passa a criar um personagem no qual as pessoas pudessem admirar e esperar algo extraordinário (daí o propósito de o camaleão ser o animal escolhido, ele se adapta perfeitamente às suas necessidades).
A parte técnica do filme encanta logo de cara. Dá para ver a luz refletindo em cada escama de Rango, nem parece CGI. E a interação que o protagonista tem com os cenários é notável, reforçando ainda mais o realismo da animação. Mas aí se vê um defeito técnico do filme: os demais personagens não são tão bem feitos como Rango. Por isso, nas cenas em que o camaleão interage com outros, fica um pouco estranho o fato de ele ser bem realista e os outros serem mais, digamos, “irreais”. A trilha sonora, sempre acompanhada do indefectível quarteto mariachi, é bem apropriada para uma singular animação de faroeste.
O roteiro de “Rango” consegue, diferentemente de outras animações, inserir elementos que contribuam para a história. Cada personagem que aparece é interessantes. Nenhum se mostra um peso morto no filme, Até o interesse romântico de Rango, que a princípio parecia meio forçado e brega, rendeu uma boa cena. As piadas são ótimas, algumas podem até ser consideradas, para alguns, inapropriadas para crianças. E todo o argumento que o diretor e roteirista Gori Verbinski, que já havia dirigido bons filmes antes (“Um Ratinho Encrenqueiro”, divertidíssimo e os três primeiros da quadrilogia “Piratas do Caribe”) cria é sensacional, fazendo sua estreia no cinema de animação em grande estilo. A ideia de a água, produto inesgotável, conseguir se tornar propositalmente escasso por um grupo mal-intencionado é brilhante. Aliás, todo o contexto que circunda o prefeito, personagem mais profundo do filme, é excelente. Mas o melhor do filme são as referências. Não só às paisagens clássicas com pôr-do-sol, mas as referências diretas a filmes e ícones do cinema, em especial à hilária “aparição” de Clint Eastwood e à paródia de “Apocalypse Now”, com direito até à ópera de Wagner.
É bastante curioso o fato de os estúdios “menores” lançarem boas animações (além de “Rango”, temos também “O Fantástico Sr. Raposo” e “Coraline”), em um período em que a Dreamworks e a Disney/Pixar estão em uma época de vacas magras torna evidente que nem nessa nem em nenhuma categoria o cinema deve ser representado por uma ou duas companhias.
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