Tio Boonmee, que Pode Recordar Suas Vidas Passadas
A sensação de assistir esse Tio Boonmee, que Pode Recordar Suas Vidas Passadas é a mesma de estar sentado numa calçada vendo dezenas de carros passarem sem darmos conta de que estamos sentados numa calçada vendo dezenas de carros passarem. Repleto de imagens e cenas bonitas, mas de um vazio incompreensível, o vencedor do Festival de Cannes de 2010 parece mais um filme feito para experimentar um novo cinema realizado em um desses países desconhecidos, no qual os críticos, que querem se responsabilizar em promover e elogiar esses filmes independentes e super particulares escolhem para ser o melhor filme do ano. Não pretendo entrar em uma análise mais profunda, sobre as metáforas ou simbolismos do filme, então serei mais direto no meu ponto de vista.
Tio Boonmee é um forte candidato ao título de maior “ame ou “odeie” do ano. Não espere assistir a um filme bom ou um filme ruim. As expectativas de gostar ou não permanece imprevisível para quem ainda não viu o filme e esperam assistir a um filmaço, como foi vendido no Festival de Cannes, a não ser que ela já tenha contato com as obras do diretor, que diz-se serem parecidas.
Woody Allen já fez personagens saírem da tela, Tim Burton já criou um homem que tem tesouras no lugar das mãos, Shyamallan já usou o vento como vilão e fez seus personagens fugirem dele e recentemente Christopher Nolan criou um grupo de espionagem que invade sonhos alheios. Isso é só um dos exemplos da corrida dos cineastas em fazer um filme original. Filmes odiados, apedrejados, amados, idolatrados e outros para serem lembrados durantes gerações. Bizarrices que se tornaram obras-primas e filmes cult. Eu pensava que a escolha do Melhor Filme em Veneza de 2010 fosse duvidosa, mas nada comparada a Cannes que inicia a década premiando uma aberração que não diz nada.
Como eu havia dito, o filme parece um experimento, baseado na religião budista, sobre lendas e costumes do lugar. Nota-se que o diretor não se importa em explorar o assunto, ou em contar sua história de maneira mais universal. Ele usa todos os simbolismos precisos para encenar sua história como se estivesse mostrando o filme para um público mais particular, como se estivesse dando-o de presente para o povo ou região que conhece as lendas e as culturas abordadas no filme. Por isso Tio Boonmee é um filme extremamente particular, e incapaz de despertar o interesse de quem não entende ou não curte o assunto. O diretor, também prestigiado com seus filmes anteriores, usa e abusa de imagens como quem está em completo desespero para transformar sua obra em arte. Infelizmente, o que torna o filme um dificílimo teste de paciência.
Tenho a impressão de que o filme é quase uma dessas obras religiosas produzidas aqui no Brasil, a fim de mostrar ao mundo sua cultura e religiosidade, só que Tio Boonmee tem uma roupagem mais artística e com um embelezamento mais notório. A Fotografia é linda, mas infelizmente cansa logo nos momentos iniciais. Simplesmente vemos um boi pastando durante longos minutos e em seguida somos ”forçados” a conhecer toda a floresta das redondezas do sítio do personagem que dá o nome ao título. Cenas demasiadamente longas em lugares já explorados e outros bastantes desnecessários, como a mulher matando mosquito, onde não entendemos porque uma cena tão desnecessária como esta poderia ser tão longa ou até mesmo existir. Chego a ter a impressão de que essas longas tomadas em cachoeiras e em florestas ou em qualquer um deles lugares incansavelmente filmadas pelo diretor parecem que foi um apelo suplicando por um Prêmio de Melhor Fotografia. Mas já vi matos melhores que os daqui.
Com esse excesso de cenas a montagem sai ineficiente, deixando a sensação de tédio no ar. Mas deixo claro que não achei o filme chato, e meu otimismo e vontade de assistir algo que correspondesse os elogios me motivaram.
A cena do Jantar em que Tio Boonmee recebe a visita dos familiares é um dos pontos-chaves do filme. É ali que tudo começa. E é aonde começamos então a entrar no mundo dos personagens. Essa cena é talvez a que mais traduz a força particular com que o diretor trabalhou o tema. Os vivos que estão ali na mesa agem da forma mais normal do mundo como se esse tipo de coisa fizesse parte do cotidiano deles. No mais, um jovem que fica um pouco assustado, mas logo se acostuma com o fantasma da esposa e o filho do Tio Boonmee. Eu até entenderia seu medo. Afinal, o filho aparece como um homem-macaco (!?). O diretor não liga nenhum vínculo ou explicação à materialização dos espíritos (Óbvio, a intenção do filme não era essa), eles simplesmente estão lá. Não sabemos de onde vêm ou vão, o porquê disso ou aquilo, com homens-macacos surgindo aparentemente sem nenhuma ligação com a trama, entre outras tomadas.
Uma exposição de culturas, que usa de belas imagens e uma doença renal inútil para falar de lendas e costumes, por isso tantas cenas sem importância alguma para a trama, mas sim para a cultura que o filme explora. A cena do peixe e a mulher na cachoeira eu prefiro nem entrar em detalhes e não estou questionando o tema religioso, mas o filme como filme. Se ao menos tivesse uma história decente, uma narrativa eficiente, uma direção que se importasse em fazer com que o espectador entre no universo do filme para conhecermos a cultura, ao invés de encher linguiça com cenas desnecessárias, com uma narrativa pseudo-documental, eu até chamaria de arte, e poderia poupar-me frustrações. Pergunto-me se era realmente necessário filmar cada canto da ”igreja”, cada estátua, ouvir a oração inteira e ver um homem tomando banho durante longos minutos. Filmar um documentário pareceria melhor.
A frase “Os fantasmas não ficam presos à lugares, mas aos vivos” fez o filme chegar ao ápice, finalmente mostrando as caras e para o que realmente veio. Tio Boonmee é uma experiência totalmente vazia, que não emociona, que não possui história e sim uma cultura massante que não desperta interesse em momento algum, que não marca (a não ser pela frustração), e que trata as emoções dos personagens apoiadas em culturas e simbolismo tornando-os superficiais. O filme tem dividido opiniões, até mesmo entre os críticos que o apedrejaram e outros o embalaram e o venderam como Arte. Assim sendo, há quem gostará.
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