Valente é, tal como aparentava ser, mais um candidato ao título de mais fraca obra da Pixar.
Valente foi bastante comentado antes do seu lançamento. Falava-se do alcance de uma perfeição visual nunca antes vista, no toque Disney da história e de muito mais. Não nego nenhuma das duas coisas; apenas considero que a história é de uma pobreza rara de se ver na Pixar. Mesmo quando a execução de um projecto da empresa não fica nada de especial, costuma haver no mínimo alguma originalidade digna de nota – veja-se o caso de WALL.E. Mas este filme parece nunca sair do marasmo que o acompanha desde a sua cena inicial. De que adianta a tão falada excelência visual? Que me interessa a mim, e a muitos mais, que a floresta esteja incrível e que o cabelo de Merida esteja muito bem representado em toda a sua desorganização e secura? Se Merida nem sequer é uma boa personagem! No fundo, quem não preferia as boas e velhas princesas Disney, perfeitas desde o cabelo até à personalidade? Quem não preferia aquelas doces donzelas cujo maior problema no cabelo era um fiozinho que de vez em quando caía para a cara (sim, estou a falar da Bela)? Não que o penteado tenha grande influência na personalidades das personagens, mas a verdade é que parece que, com esta chegada do cabelo caótico, a mais recente princesa “Disney” (porque não é bem Disney, é mais Pixar) passa a ser uma garota sem carisma e de moral duvidosa.
Eu sei que este aspecto não costuma ser dos mais importantes para um filme, mas não posso esconder que me incomodou bastante a personalidade difícil de Merida. Pessoalmente, nunca a apoiei na sua pretensa rebeldia, que a certa altura mais parecia uma atitude do contra do que uma atitude pensada e com razão de ser. À pobre mãe de Merida calhou a uruca de ser a “vilã” ou anti-heroína da primeira parte do filme. Ninguém pensou que ela nunca deu a ideia de alguma vez tratar mal a filha? Que ela fazia tudo aquilo relacionado com o casamento para o bem de Merida? Que ela estava realmente preocupada com o futuro da filha, daí tentar assegurar-lhe um bom futuro? E que nem todas as tradições são tão más como as fazem parecer neste filme? Para aqueles que gostam da sua mãe, este filme é uma afronta. Merida porta-se muito mal com a mãe, confronta-a sem dó nem piedade e nunca parece lembrar-se que a mãe pode, eventualmente, estar a pensar no bem dela. Fica virada para o seu lado rebelde que por pouco não implica mandar a mãe dar uma volta! Está bem, a opinião dela também conta, mas nem lhe ocorre tirar uns 30 minutos para falar com a mãe com calma, sem agressividade e perguntar-lhe honestamente se ela não tolera outro tipo de futuro para Merida. Isto, pelo menos, até a mãe se transformar em urso...
Ah, a transformação em urso! Essa sim, uma das cenas mais surpreendentes e bem conseguidas do filme. Eu até podia censurá-lo por praticamente copiar o filme Irmão Urso (alguém falou em falta de originalidade?), mas não vou por aí, até porque filmes como Vida de Inseto, Avatar e Rango são idênticos na sua estrutura mas ainda assim são filmes completamente diferentes. O importante é que a partir dessa cena – que, infelizmente, só surge quando o filme já está praticamente na sua metade – o filme melhora bastante e torna-se mais cómico. E as cenas de perseguição passam a ser agoniantes! Imaginem, e Deus nos livre de isso acontecer, que a vossa mãe, urso ou não, passava a ser perseguida por uma multidão que a queria matar. Vejam bem, matar! A nossa querida progenitora que é única no mundo! Pior parece impossível! Mas não é; há também um lendário urso na floresta, facilmente confundível com a mãe-urso, que pode atacar a qualquer momento! Ah, aquele arrepiante urso do trailer! Aquele que merecia um emprego num filme de terror! Porém...é, há um porém. É que as cenas de ataque do tal urso são muito mais fracas do que o trailer dá a entender. Não criam muita tensão e a derrota do urso não é muito satisfatória.
Outro problema de Valente é que mal usa tudo o que mais tem de original. Já manifestei a minha crença em relação à falta de originalidade do filme. E se formos a ver...uma filha que tem um sonho que os pais não partilham? Já vi isso nalgum sítio. Uma personagem que quer “ser livre”? Também não me é estranho. A heroicização de uma personagem através de um concurso de tiro ao arco em que a personagem trespassa uma flecha já espetada no arco? Um velho cliché dos desenhos animados. Uma personagem transformada em urso que depois é atacada por uma ou mais personagens? Esse é o meu amigo Kenai. E por aí adiante. Voltando: os pormenores mais originais aqui mostrados são depois deixados de lado. Exemplo: os fogos-fátuos, que apesar de parecerem uma conveniência de roteiro, têm um visual e poder únicos! Se bem que, pensando melhor, podem não ser tão originais quanto isso. Podem chamar-me louco, mas arrisco dizer que eles parecem uma mistura de Lampent com Chandelure (para quem não entendeu: são pokémons)!!! Só que azuis! Ok, já me habilitei a uma boa gozação; vamos em frente. Depois, há a bruxa. Uma das poucas personagens que dá ares de ter carisma e/ou originalidade e só aparece uma vez. Ou melhor, só aparece uma vez em carne e osso. Perto do final do filme, sentia muito a falta de algo e não sabia do quê. Apercebi-me então que era da bruxa. Os roteiristas ficaram a dever pelo menos mais uma cena de diálogo entre Merida e a bruxa. Não sei o que elas fariam (talvez ajustassem contas, talvez se tornassem amigas, talvez falassem as duas com os pais de Merida), mas senti falta desse sopro de carisma mais para o final da história.
A Pixar já mostrou que é capaz do melhor e do pior (assim como quase tudo o que é produtora de filmes de animação). Do melhor, com roteiros com a inteligência tremenda de Toy Story 3 e com a interacção perfeita entre comédia e tragédia de Procurando Nemo. Do pior, com as desinspiradas e premiadas histórias de Ratatouille e Up – Altas Aventuras. E Valente, vencendo um Óscar ou não, é mais um que se junta à lista dos piores.
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