Zombeavers é um daqueles terrores menores que merece mais atenção.
Eu falo/escrevo muito sobre filmes de terror B e por vezes até lhes chamo terrores C, D e o alfabeto inteiro X). Mas acho que não é muito polémico dizer que esses terrores menores são feitos anualmente às dezenas. Agora a parte polémica: eu acho que entre tanto terror menor que se faz, acaba por ser um pouco inevitável que haja também um número grande deles que são bem melhores que os terrores menores em geral. Quer dizer, isto não é difícil: se se produz muito de um produto que varia muito em qualidade de uma unidade para outra, então muitas das unidades vão acabar por ser bem boas, não? É a lei das probabilidades, acho...enfim. A meu ver, os terrores menores que têm mais qualidade aparecem um pouco por todo o lado, e independentemente de conseguirem superar os terrores A (às vezes acontece...), pelo menos merecem mais atenção. Nem que seja pelos seus últimos minutos.
Zombeavers (ou Zombeavers - Terror no Lago, se preferirem, porque parece que alguns sites dizem que é esse o nome deste filme) é, então, mais um nesse mar de terrores esquecidos mas bonzinhos. Mas para o distinguir de outros terrores-wannabe, tem de haver pelo menos um diferencial, certo? Bem, no caso deste filme, o primeiro diferencial que notei foi a qualidade melhor da imagem. Muitos terrores menores não têm uma imagem particularmente chamativa, sendo que alguns até a têm um pouco, metaforicamente falando, embaciada. Já este não só não faz isso como acaba por ter uma imagem que foi uma das mais alegres que vi em 2017! A luz do sol parece iluminar o assento onde vemos o filme, tal é a nitidez do amarelo/branco que vemos no ecrã! Não sei com que tipo de luz filmaram isto, mas o resultado foi bom e as imagens são animadoras, energéticas ou as duas coisas juntas. E sim, não vou mentir, a nitidez do reflexo dessa tal luz do sol na pele das moças em trajes de banho fá-las parecer ainda mais bonitas. Hehe...não me interpretem mal, não vi a cena das 3 moças em frente ao caçador como uma espécie de consumação de desejos reprimidos. Mas não é mentira dizer que gostei de olhar. Achei bonito, pronto.
Mesmo sabendo da alegria que as imagens passam, o espetador mais experiente sabe que, como está a ver um terrir, a certa altura o tom vai ter de ser mais negro. E aí, quando perceberão os jovens o perigo que correm? A resposta é: durante "aquele" banho no lago. Mas quando, exatamente? Pois, aí é mais complicado. A verdade é que, no filme, o perigo que os jovens correm é revelado de uma forma bem estranha. Numa altura em que o espetador mais experiente deve esperar um falso susto - um velha técnica, talvez cliché, do cinema de Terror - surge a revelação do perigo. Atenção, não é como a maioria dos terrores! A maioria dos terrores faz um truque que é, basicamente, um falso susto seguido de um verdadeiro susto. Por exemplo: há um bicho atrás da personagem...ah, mas é o gato! Que alívio, né? Aí a personagem vira as costas e...bum! O monstro! Isto já não é novidade, pois não? Pois. Mas desta vez não, o filme faz algo ligeiramente diferente. Finge que está a preparar um falso susto, mas o falso susto não chega a acontecer...e passa diretamente para o susto a sério! Um pouco inesperado, convenhamos! Não necessariamente bom, é certo, aliás quando eu vi essa revelação fiquei assim uns segundos dividido entre achar aquilo bom e achar risível. A verdade é que ainda não estou 100% seguro, mas...após revisão, acho que posso dizer que esse momento para mim...funcionou. É isso; nem bom nem mau, funcionou, simplesmente.
Com isto e mais algumas coisas, o filme vai avançando. Lá vai tendo os seus problemas, como não poderia deixar de ser, mas nenhum tão grave que estrague a impressão geral. Às vezes cheira um bocadinho a novela mexicana. Mas se há coisa que eleva esta obra ao possível estatuto de filme B memorável, é a sua reta final. Só para terem uma ideia, os últimos 20 minutos de Zombeavers foram dos 20 minutos cinéfilos mais gratificantes que eu tive em 2017!
(«Aah!» geral. Plateia sussurra. Reações de espanto generalizadas.)
Palavra de honra, não estou a exagerar. E olha quem em 2017 eu vi muito filme bom. Mas também não é mentira que, se dividirmos os períodos de 20 minutos a ver um filme em 2017, os últimos 20 minutos de Zombeavers fazem certamente parte daqueles que me deixaram mais satisfeito por não só não deixarem o filme esmorecer, mas também o engrandecerem! E foi isso que eles fizeram. Posso dizer que na minha opinião o filme não teria sido tão memorável se não fosse a loucura que são os seus últimos 20 minutos. Ainda hoje, ao revê-los, tenho a sensação de que os roteiristas chegaram à reta final do filme e entraram num modo de "Que se lixe, este filme nem é sério, mesmo; vamos zoar o barraco que ninguém se vai importar!". Pode parecer esquisito, mas francamente acho que há a possibilidade, por pequena que seja, de Al Kaplan e Jon Kaplan terem, com efeito, falado um com o outro e dito uma coisa assim: "Olha, eu sei que até agora tentámos fazer deste Zombcoisos um filme que até se leva mais ou menos a sério. E até que conseguimos. Mas sabes que mais? O produtor não leva a mal e a vida é curta; vamos mas é divertir-nos, que um terrir destes é mesmo para fazer bagunça! A partir de agora, para nós roteiristas, vale tudo para fazer rir! Bola para o mato, que o jogo é do campeonato!" XD
Pois. E é neste contexto que começa o liberou-geral que foi a última parte do filme. Tudo acontece nessa parte, do bom e do cómico. Se bem me lembro, tudo começa com uma porta a abrir. É Jenn que entra, para desempenhar uma das cenas que mais deve ter apelado aos homens que gostam de ver mulheres a fazê-lo (se é que me entendem). Mas as duas nem chegam muito longe, porque aí entra o inesperado, a loucura que vai dominar até ao final do longa. E aí o espetador já começa a ter uma ideia de como o filme abandonou o tom sério e agora vale tudo. Os minutos seguintes são animados, divertidões, têm imagens bonitas (Rachel Melvin é uma mulher com uma genética generosa) e o ritmo aguenta-se bem até às cenas finais. A cena em que a personagem que é mais improvável que vire zombie é afetada pelo vírus dos castores - não vou dizer o nome dela para fazer um comentário sem spoilers maiores...para variar! - é no fundo um epítome de como os roteiristas tiveram nem aí para as regras e preferiram surpreender e fazer rir. Adorei essa revelação, mesmo! E depois de tanta diversão junta, só faltava um final bom para terminar em beleza. E digo-vos uma coisa, o final praticamente merece uma gargalhada da plateia, daquelas em que ela ri tanto que depois até aplaude. Hilariante, irónico, metalinguístico, o final é isso tudo junto! Foi um toque brilhante de comédia por parte dos Kaplan. Gostei de ver!
E justamente quando eu achava que o final estava perfeito para o filme e que tinha de acabar ali para não estragar, não é que o filme tem ainda mais para oferecer?! Não parece possível, mas começa logo bem: logo depois de mostrarem o título do filme para o terminar, surgem logo a seguir os benditos erros das filmagens! Ou bloopers, como quiserem chamar...o que interessa é que não só são engraçados como encaixam perfeitamente nos últimos 20 minutos do filme. Se pensarmos nisso, já que os roteiristas se lixaram para a coisa e valeu tudo para divertir, então porque não carregar na metalinguagem e mostrar os bloopers, tipo, 2 segundos depois de o filme acabar? Faz todo o sentido! E que bloopers, estes; ver Rachel Melvin a perguntar ao diretor qual é o tipo de gemido que deve fazer durante a cena de sexo é uma experiência cómica que só vista se entende o quão divertida é!
Ah, mas quando acabam os bloopers o filme já não tem nada bom para dar, certo? ERRADO! Então não é que assim que os créditos começam a rolar, surge um imitador de Frank Sinatra a cantar uma canção intitulada Zombeavers com toda a seriedade e dignidade que o próprio Sinatra colocaria numa canção séria?! Vocês estão a ver o que se está aqui a passar? A produção do filme contratou o homem com a voz mais parecida com Frank Sinatra para cantar a letra de um filme de terror B que nem se leva a sério? Com direito a instrumentos do tempo de Sinatra e tudo?! É a loucura, pessoal! O filme não tá nem aí para quem acha ridículo, ele faz o que quer e quem não gostar que desligue o aparelho! E posto isto, resta-nos apreciar a delícia que é ouvir um candidato a Sinatra a cantar afinadamente uma letra que é o cúmulo e com algumas rimas bem apanhadas.
E, pronto, é esta a minha impressão sobre este terror menor que, repito, merece mais atenção. Por muito que a maioria do filme nem seja assim tão boa, vale MUITO a pena ver tudo para ter o melhor contexto para os últimos 20 minutos, que são um pagode. É muito por causa de filmes como este que eu vejo dezenas de terrores B em vez de dar prioridade aos clássicos: por causa destas pérolas que encontro com alguma frequência (em meio a dezenas de lixos atómicos, admito...). Quando encontro um terror menor de que nunca ninguém me falou e quiçá ninguém conhece aqui no CP, sinto-me um pouco como se tivesse encontrado um tesouro perdido. Seja ele Férias Selvagens (2003), Paixão Mortal (2014) ou o próprio Zombeavers (um filme que nunca esquecerei enquanto controlar a minha memória).
Apêndice - uma razão extra e mais convincente para o cinéfilo comum dar uma chance a Zombeavers
Mas tudo o que eu escrevi pode não convencer ninguém a ver este filme, não é? "Véio, esse aí tá de gozação, tá esperando que eu veja um trash com castores zombies! E ainda diz que é divertido, vê se pode! Tá louco se acha que eu vou gastar sequer 1 minuto a ver uma coisa tão ridícula!". Pois bem, cinéfilo hipotético, ficas a saber que consigo dar mais uma razão - e uma bem aceitável, note-se - para tu dares uma chance ao filme que comentei aqui. Porque repara: durante o excerto do filme que é justamente os últimos 20 minutos...
(Suspiro geral. Plateia sussurra. Ouvem-se frases dispersas como "Outra vez isso?", "Esse homem não pára de falar em 20 minutos, parece que não sabe dizer mais nada!", "Parece um papagaio a repetir a mesma coisa!")
Caham! Posso terminar, por favor?
(Plateia faz silêncio)
Obrigado. Pois fiquem a saber, seus incrédulos, que o filme Zombeavers tem um susto à lá John Carpenter!
(«Aah!» geral. Plateia sussurra. Reações de espanto generalizadas.)
Oh, sim! E não estou a exagerar nem um pouco, esse susto tem todos os ingredientes de um susto à Carpenter. Para quem não sabe o que isso é, eu digo: é um susto que faz um efeito tipo "Boo!" mas sem recorrer a efeitos sonoros baratos com os quais é muito fácil assustar. Um susto feito no silêncio. Lembram-se do susto que o Dr. Sam apanha quando o xerife lhe toca no ombro por trás em Halloween - A Noite do Terror? Um susto como esse. Aliás, esqueçam, há um exemplo 1000 vezes melhor! Não; lembram-se do susto que a personagem e o espetador apanham por causa do pirata no telhado em A Bruma Assassina? Esse susto? Pois bem, Zombeavers tem um susto que tem exatamente as mesmas características! Vejam lá vocês como um filme B por quem ninguém daria um tostão tem um susto melhor que os jump scares baratos de muitos terrores famosos!
Como se diz em inglês: check and mate!
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