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Críticas

Cineplayers

Um filme completamente vazio sobre sexo.

5,0

Um rapaz inglês, sobrevoando a Antártida, começa a se lembrar de seu namoro, há um ano, com uma estudante americana em Londres, só que ele tem apenas duas lembranças com a moça: o tempo que passaram juntos em concertos de música e na cama. Não tarde na duração do filme, a estrutura deste se torna clara ao público: tórridas cenas de sexo, entrelaçadas por shows ao vivo de bandas de rock (nove, para ser exato), e com esporádicas – e curtas – cenas na Antártida, dadas no presente. Um estilo de metragem rítmica previsível e cansativo, que faz o espectador instantaneamente se perguntar: “Há algum filme aqui?”.

Não tiremos conclusões precipitadas; Michael Winterbottom tem crédito no currículo, merece uma análise mais profunda. Este é, até o momento, o filme mais audaz e experimental da carreira deste eclético diretor, aqui completando 10 anos de carreira, e conseguiu uma inédita aprovação sem cortes do órgão regulador da Inglaterra, com uma censura de 18 anos. As numerosas cenas de sexo têm a explicidade de uma produção pornográfica, com bem detalhados momentos de sexo oral (tanto por parte da garota quando do rapaz), masturbação, penetração e mesmo uma inédita cena de ejaculação. Não que isto seja novo, pelo contrário; já em 1933, Ecstasy chocara o público com um eroticismo aberto e impensável na época; as revoluções culturais da década de 60 e 70 nos brindaram com diversos filmes cuja ousada temática sexual impressionam até hoje, sendo mais famosos Último Tango em Paris do Bertolucci, Diabo no Corpo de Marco Bellocchio e Império dos Sentidos, do Nagisa Oshima. Mas todos estes filmes fizeram uma abordagem de acordo com o clima de liberdade sexual, acompanhando mudança dos paradigmas da sociedade e fazendo reflexões importantes acerca do relacionamento e solidão. Mas 9 Canções não tem nada disso, apenas mostra um casal vivendo uma relação estritamente sexual. Sequer consegue nos chocar, ainda mais numa época em que os filmes da Catherine Breillat fazem isto muito bem sem precisarem ser explícitos. A princípio, este novo projeto do Winterbottom soa como um ode vazio à ideologia de sex, drugs and rock (sim, eles também se drogam, ainda que moderadamente) e parece ter parado no tempo.

À exceção de uma cena onde Matt prende Lisa na cama com um cinto e venda seus olhos, simulando uma fantasia imaginária (feita toda sobre planos alternados), os atos sexuais do filme não são nem interessantes nem inspirados; não se trata de uma paixão avassaladora, nem de explorar os limites físicos e morais do ato. A proposta do filme é a de uma relação estritamente sexual e casual entre dois jovens, talvez o tipo de relacionamento mais comum hoje em dia. Não há brigas nem reflexões, e qualquer tentativa de uma aproximação mais séria é falha, como no fim de semana que os dois vão passar numa cabana na praia; os longos passeios pela vastidão deserta se provam pouco eficientes e cansativos, e tudo logo se resume à cama. Em uma outra cena, Matt senta pensativo na quina da cama, logo após transar, enquanto ouve Lisa se deliciar com um vibrador; ele, visivelmente aborrecido. Talvez por ser mais velho, tenha uma concepção mais fechada e romantizada de relacionamento, mesmo sendo apenas carnal, e por várias vezes dá para perceber seu contraste com a jovem e despreocupada Lisa, que se gaba de já ter namorado pessoas das mais diferentes nacionalidades. Também é ela que resolve voltar aos Estados Unidos sem maiores complicações, deixando Matt a solilóquios na Antártida, sobre a posição dos relacionamentos amorosos. O próprio ato sexual é visto no filme sem maior glamour ou intensidade, numa visão naturalista, tendo a bela fotografia do filme (todo filmado em digital, e destacando a luz natural) reforçando este aspecto. Com um tema interessante e passível de várias reflexões, o que poderia ter dado errado?

Simplificando, o casal. Ao longo dos 69 minutos de filme (sim, foi intencional), os atores Kieran O'Brien e Margo Stilley provam ser bastante profissionais, porém nem um pouco talentosos. Não há química alguma entre os dois, em momento algum a relação parece convincente, e um parece desejar o outro. Também os diálogos, todos improvisados pelos mesmos (um erro do diretor em não delimitar as falas), soam idiotas e falsos, além de completamente inúteis. Teria sido uma abordagem interessante, caso ele tivesse trabalhado com um casal de verdade, mas este não foi o caso. O próprio diretor tem suas falhas graves, ao se concentrar demais na relação e não nos possíveis conflitos que poderiam surgir, deixando o longa com cara de uma das recentes produções de crise de meia idade do Antonioni; além disso, as nove canções do título, filmadas como um videoclipe, não adicionam nada ao filme, sequer falam sobre qualquer tema abordado e parecem completamente aleatórias. E é este exato fato de termos de procurar chifre em cabeça de cavalo para acharmos algo de mais rico e trabalhado que faz deste filme uma tentativa válida, porém fracassada.

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