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Críticas

Cineplayers

Por entre ruas, entre carros e placas...

6,5

O que prevalece durante quase toda a duração de À Beira do Caminho (idem, 2012) é uma inexplicavelmente deliciosa sensação de déjà vu. Por se tratar de um tradicional filme de estrada e fazer questão de carregar consigo todas as constantes desse tipo de filme, em um primeiro momento pode parecer que o diretor Breno Silveira se aproveitou preguiçosamente de cartilhas para compor apenas uma colcha de retalhos com claras referências à Central do Brasil (idem, 1998), mas seu verdadeiro valor está justamente nessa consciência de que não veio para trazer nada de novo, apenas contar uma bela história sobre a solidão e o valor de uma família.

Quando se trata de um filme de estrada brasileiro os cenários não costumam variar muito, e o que temos em À Beira do Caminho é asfalto queimando em um sol de quarenta graus, estradas cortando o nada e aparentemente rumando a lugar nenhum, caminhoneiros, rádio do carro tocando alguma música nostálgica, um protagonista sofrido e uma enorme e incômoda sensação de vazio. Trata-se da composição de um universo já conhecido, mas não por isso menos realista – e realismo é algo que se pode exigir em um road movie sem problema algum. Depois que trabalhos como Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo (idem, 2009) provaram que se pode extrair muita coisa boa desse conjunto de características bem particulares, o que nos resta é ver como Breno Silveira procurou aproveitar desse material. E o resultado não decepciona.

João Miguel, o ótimo Cláudio Villas-Bôas de Xingu (idem, 2012), desta vez arrebenta em outro papel interessante, na pele do caminhoneiro sisudo João, que tem seu caminho cruzado pelo garoto de onze anos Duda (Vinícius Nascimento, um achado). Depois de perder a mãe, e decidido a procurar por seu pai nunca conhecido em São Paulo, o garoto invade o caminhão de João para poder chegar ao seu destino. De início a relação dos dois é complicada e cheia de atritos, mas não é preciso muito tempo para que um enxergue no outro a família que lhe falta.

Breno Silveira não se preocupa em dissecar a alma de seus dois personagens centrais. Quando se trata de um filme de estrada, parece que quanto menos se sabe sobre os personagens, mais intensos e complexos eles se mostram. Por isso só nos é mostrado o necessário para que fique evidente a extrema solidão que acomete os dois, e a partir dessa constatação já temos conhecimento o suficiente para embarcarmos nos momentos em que a carga dramática em volta da história vai se intensificando.

A fotografia, a sutileza das passagens do roteiro e especialmente a trilha sonora terminam por colaborar de vez para um resultado final positivo. As músicas de Roberto Carlos, sempre repassadas no radio do caminhão de João, servem de base para de certa forma narrar a história, em especial aquelas mais antigas como O Portão e, óbvio, Sentado à Beira do Caminho, de onde toda a carga sentimental da trama procura se inspirar.

A estrada que parece nunca terminar, e a ânsia de querer pertencer a alguém ou a algum lugar cada vez mais a cada novo quilômetro rodado, e a solidão que vai corroendo a alma de seus personagens centrais – tudo em À Beira do Caminho é familiar, mas nem por isso menos relevante. Se Breno Silveira, um diretor que já havia mostrado não ser exatamente do tipo inovador em seu maior sucesso 2 Filhos de Francisco – A História de Zezé di Camargo & Luciano (idem, 2005), optou pelos caminhos mais fáceis para transmitir suas mensagens de apelo sentimental, não cabe a nós exigir algo muito além disso. Basta acompanhar João e Duda percorrendo aquelas estradas para decidir se o vazio que domina esse cenário se dá pela falta de conteúdo do filme, ou se é pelo êxito que este trabalho alcançou ao transmitir o que queria.

Comentários (6)

Paco Picopiedra | terça-feira, 14 de Agosto de 2012 - 14:29

João Miguel é um dos atores que tenho medo que sejam sugados pelas novelas globais. O cara é bom demais pra ser desperdiçado nelas; que permaneça nas telonas.

Vinícius Aranha | terça-feira, 14 de Agosto de 2012 - 20:19

João Miguel é foda mesmo. E pra mim À Beira do Caminho é bem síntese de como está o cinema comercial brasileiro ultimamente: Coração tem, o que falta é renovar.

Maximiliano Roger Alves Oliveira Junior | quarta-feira, 15 de Agosto de 2012 - 19:36

Não entendi sua nota ! O Fazer algo diferente não é fazer algo bom. Em nem um momento senti a necessidade de saber mais sobre o caminhoneiro João que deixou bem claro que não tinha intenção alguma de mostrar seu assombrado mundo para ninguém. apenas Duda, repleto de uma encantadora nobreza infantil, foi capaz de estar ao lado(Não apenas sentado no banco do passageiro) de João aceitando estar simplesmente com homem que transborda de maneira subversiva independente de apresentações. O que faltou de João para Duda foi, mais uma vez de maneira Nobre, preenchido com o encanto de criança que em certo momento o tomou como sem nem ao menos pedir permissão.E que notável interpretação de Vinícius Nascimento, que evoluiu bastante desde Ó pai ó.Se essa película é o desenho o de um antigo esboço já usado eu não sei. Sei que não ha nada embaixo do sol que não tenha acontecido, mas se ainda nos emocionarem... que continuem acontecendo.

Jonas | terça-feira, 21 de Agosto de 2012 - 14:00

Concordo com o Vinícius Aranha. Mas mesmo assim é um filme muito superior a muitos que surgem nos cinemas, até alguns americanos. Gostei muito!

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