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Críticas

Cineplayers

A ironia como uma faca de dois gumes: enquanto se contorce para fazer-se entendido, A Grande Aposta acaba com si mesmo.

5,0
Vez ou outra nos últmos anos, Hollywood lança um filme a respeito da avassaladora crise de 2008 – quase como se a agenda democrata de Los Angeles eximisse-a de qualquer relação com o capitalismo. O filme de mais valor desse nicho, embora isso não queira dizer muita coisa, certamente é Margin Call - O Dia Antes do Fim, de Josh Chandor: um filme de autor, escrito, desenvolvido e dirigido por duas mãos, cuja moral é niilista e aniquiladora.

A Grande Aposta não é metade do que Margin Call é, talvez por isso mesmo use quatro dos maiores atores americanos em atividade no momento para tentar carregar o filme nas costas (usando ainda coadjuvantes de peso parcamente aproveitadas, como Marisa Tomei e Melisa Leo).

Quando o consultor Mike Burry (Christian Bale) prevê a explosão da bolha imobiliária de 2008, ainda uns três anos antes dela acontecer, e começa a investir de forma a capitalizar em cima dessa crise, outros personagens vão em seu encalço: Jared Vennett (Ryan Gosling), Ben Rickert (Brad Pitt) e seus dois empreendedores, e Mark Baum (Steve Carrell).

Nas duas horas e dez minutos de projeção, esses seis personagens entram e saem de escritórios, bancos, empresas e cassinos, num filme de investigação prolixo à espera do inevitável. A crise realmente vai acontecer, e nós sabemos mais ou menos o que rolou. O filme faz um grande trabalho em mastigar as informações a respeito de como a crise começou e o que aconteceu a partir disso, mas isso não é suficiente para tornar o filme mais instigante dramaturgicamente.

Parte do porque a crise (ou pelo menos a crise do ponto de vista do filme) é tão fácil de entender, provém da abordagem de Adam McKay do tema: em diversas vezes o diretor quebra a quarta parede e coloca personalidades famosas para detalharem em linguagem chulas os termos técnicos apresentados na história; também há um narrador-personagem-omnisciente, Vennet, que entra em cena sempre que o filme julga necessárias explanações adicionais; além disso, os personagens explicam as coisas com um nível de simplificação e detalhe que seria verossimilhantemente inadequado, embora seja indispensável em termos de roteiro.

O dispositivo de personalidades famosas falando da crise econômica para a câmera é obviamente paupérrimo e vergonhoso. A profusão de simplificação no discurso dos personagens, por outro lado, não chega a me incomodar.

O grande incômodo de A Grande Aposta é que realmente o filme não te faz sentir coisa alguma. O grande clímax são dramatizações das imagens que já vimos na televisão. Não há narrativa e história suficientes para fazer a experiência fílmica minimamente interessante. Ao final, tudo é mais ou menos mesclado na tentativa vã de conferir alguma moral boboca à essa fábula duramente real – um erro que Margin Call não comete, por exemplo.

Quando o filme está próximo do fim, o discurso caminha em direção ao luto das milhares e milhares de pessoas que terão suas vidas fodidas pela crise. O peso humano de A Grande Aposta existe apenas na verborragia. Ele não é visto e não é sentido – mais ou menos como tudo no filme também não o é. Filmado de maneira desleixada e, francamente, um tanto feia, não permite que o espectador olhe as imagens. Ele, o espectador, é apenas repetidamente bombardeado na cabeça com termos técnicos e intromissões supostamente irônicas que explicam os termos técnicos. Enquanto isso, a história vai pro ralo.

A abordagem de McKay é propositalmente irônica, mas o efeito é totalmente diverso do pretendido: em vez de parecer um filme leve com humor espirituoso, o sarcasmo e as quebras de parede parecem apenas a escancaração dos erros de um roteiro que foi incapaz de costurar uma história interessante a partir de eventos reais. Enquanto o mundo moderno colapsa, Brad Pitt, Christian Bale e Steve Carrell fazem caretas para a câmera e tentam sofrer bastante, e o espectador morre de tédio. Seria melhor ter ido ver um documentário.

Comentários (13)

Cassio Luis Martins de Freitas | quinta-feira, 04 de Fevereiro de 2016 - 18:56

Apesar da evidente falta de ritmo e explicação para aluns fatos é um filme bom,pois consegue ser irônico e ao mesmo tempo conservador.Apesar disso não creio que ganhará como melhor filme no Oscar.

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