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Críticas

Cineplayers

O outro determinante.

8,0

Um planeta com as mesmas condições ambientais da terra estava escondido. Anos de pesquisa e a constatação é de que se trata de uma cópia do nosso, contando, inclusive, com vidas. É a segunda terra como os personagens chamam. Mas, se lá também existem vidas e estas, talvez, estejam igualmente concentradas em nosso planeta, nos chamariam de que, senão uma segunda terra? O que determina o secundarismo? E se nesse planeta habitassem as mesmas vidas, cópias perfeitas dos humanos vivenciando diariamente as mesmas histórias? E se houvesse uma oportunidade de se encontrar, conversar com si mesmo? O que seria dito? Esse é o argumento que tange a narrativa que unirá vidas, anos e lamentos.

O filme inicia exibindo a terra dois ainda distante, sendo admirada por muitos que a enxergam como uma estrela se aproximando gradativamente. A jovem estudante de astrofísica Rhoda Williams (Brit Marling) é uma das que está sob controle do que aquela descoberta pode oferecer à ciência e ao homem, e em vários momentos observa vislumbrada a beleza magnífica do astro. Numa noite, enquanto dirigia, distraiu-se e se chocou contra outro carro, devastando uma família. 4 anos se passam. Os planetas estão próximos numa ótica relativamente semelhante a de Melancolia (Melancholia, 2011) do Lars von Trier. Rhoda sai do presídio e se vê sozinha, sem laços e tampouco perspectivas. Brit Marling demonstra bem um estranhamento emocional diante sua liberdade. Ciente da tragédia que fora responsabilizada, descobre um sobrevivente, o músico John Burroughs (William Mapother) que ficou em coma por um longo tempo.

A Outra Terra (Another Earth, 2011) aparenta em determinados atos tratar-se de um filme sobre redenção. Não deixa de ser. Um dos grandes atributos do longa é justamente delinear a relação entre Rhoda e Burroughs, efetivando as investidas da garota procurando esclarecer o infortúnio, sem sucesso. O homem não sabe que ela fora a responsável pelo acidente; ela, desconsolada, custa a se revelar. A aproximação é tão paulatina quanto a do planeta, dois mundos colidindo-se. Em determinado instante a personagem olha por uma porta de vidro e percebemos seu reflexo, tal como o astro espelhado no céu. São representações de imensidões que o diretor e roteirista Mike Cahill expressa com competência, deixando em suspensão possibilidades, pequenas margens para um enfrentamento por parte da mulher que busca resgatar a vida de um pai desolado.

As defesas expostas pelo casal são salientadas pela boa interpretação da dupla Marling e Mapother, ambos assumindo em expressões o distanciamento social isolado pelas ocorrências. Ele guarda lembranças físicas de tempos em que ainda se dedicava a arte; ela resiste à culpa, relembrando um passado destruído por negligência. São humanos passíveis de sofrimento explorados com dolência. É interessante notar a falta de coragem de Rhoda, crente quanto à atitude arredia do músico caso este saiba da verdade. Como tentativa de reaver seu erro, ela organiza a casa imunda do homem, como se dispusesse oferecer ordem ao caos que causou. Isso naturalmente custa à personagem e expande horizontes do longa cujos relacionamentos dispostos pelo afago visam por fim a solidão.

Após desenvolver o vínculo sustentado pelas ações meticulosas de seus personagens, Cahill, que, com câmera em punho, entrega ao público sua alegoria, com constantes aproximações nos rostos de seus atores demonstrando seus sofrimentos e também inserindo o mito da caverna de Platão em diálogos, instituindo com ele questões sobre o conhecimento, até onde o homem pode ir e até o que é possível saber. Dilemas existenciais costumeiros em rodas de conversa.  É um indie reflexivo com um planeta distante representando nossa vivência ao lado, paralelamente, metáfora evocativa da esperança que permeia o longa e seus personagens fascinados e inspirados pelo desconhecido.

Comentários (8)

Paco Picopiedra | sexta-feira, 14 de Setembro de 2012 - 10:34

Há tempos quero ver esse, mas compararam tanto a Melancholia que fiquei com receio. Verei agora :)

Rodrigo Jambeiro Pinto | sexta-feira, 14 de Setembro de 2012 - 11:40

Filmaço mesmo! Pena que até hoje foi pouco visto... Uma pérola dessa merecia ter tido um público bem maior.

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