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Críticas

Cineplayers

"Great [f*cking] Scott!”

7,0

Se alguém voltasse no tempo e matasse Robert Zemeckis (que vem dando motivos...), A Ressaca (Hot Tub Time Machine, 2010)  não existiria e o continuum espaço-tempo seria rompido causando um imenso paradoxo!

Hot Tub Time Machine (A Ressaca no Brasil, em mais um indefensável atentado ao bom senso) não é apenas uma colagem de referências a De Volta Para o Futuro, é praticamente um remake não autorizado combinado a um tom mais estridente de Se Beber, Não Case e vestido de episódio de Family Guy. Está tudo ali, desde o relógio da torre ao momento Johnny B. Good, passando pelo problema de que se algo sair errado, um deles nunca vai nascer; além do empecilho de faltar o “combustível” à maldita banheira pra poder levá-los de volta para o futuro. Apesar de que tudo isso não consegue ser mais explícito que simplesmente juntar o próprio Crispin Glover ao elenco, a quem é dado o presente de viver o personagem mais genial do filme, sempre na absurda iminência de perder um braço.

Assim como no primeiro capítulo da trilogia de Zemeckis, o roteiro não explora a viagem no tempo em si ou suas consequências, apenas se furta do elemento como pretexto para levar os quatro amigos de volta aos anos 80. O quarteto é composto daquela velha dinâmica infalível: o maluco (Rob Corddry, dono do filme), o problemático que tem uma lição a aprender (sensacional Craig Robinson), o chato (Clark Duke, cujo personagem aborda as diferenças entre as duas gerações e que incita uma interessante perspectiva sobre o conceito de “diversão”, assunto que já me deu preguiça e que não será tratado neste texto) e o relacionável (John Cusack, sendo simplesmente John Cusack outra vez).

Não sou da turma que acha necessário se envolver com os personagens para que o filme funcione, mas seria estultice ignorar que é exatamente essa uma das qualidades mais admiráveis de A Ressaca. Mesmo que tudo seja pautado pelo excesso, que as situações sejam todas grotescas e que os quatro estejam exagerados até pelo que se espera do gênero (apesar de a fascinante atmosfera oitentista sugerir uma estranha compatibilidade com o ridículo), nada sobra. Um compensa o outro, um equilibra os vícios do outro, e todos se completam maravilhosamente.

Esse tom over é justamente o maior desafio de Steve Pink; ter de sustentar o nonsense divertidaço ao mesmo tempo em que tenta anular o flerte perigoso com o simples besteirol inútil frequente em uma comédia de Jack Black ou Rob Schneider. O primeiro sinal dessa tomada de consciência é o próprio título original, pronunciado dentro do filme por Craig Robinson, que solta “must be some kind of... hot tub time machine” e olha pra câmera com essa mesma cara que até Marlon Brando faria ao falar um disparate desses.

Mas Pink não tá nem aí. Ele passa batido e sem medo pelas ciladas sem nunca deixar que o filme pare de rir de si mesmo; abusa dos clichês sem nunca perder a chance de subvertê-los. A participação do sempre nostálgico Chevy Chase é nesse nível, cumprindo de forma hilária aquela função de Mestre dos Magos que normalmente é um pé no saco. O próprio Rob Corddry tem um desempenho ousadíssimo, como quem está prestes a ter uma overdose não sem antes surtar completamente. Tudo está em cima do limite, tudo está sempre mais perto de dar errado do que de funcionar, e por isso é previsível que A Ressaca venha a enfrentar problemas com o público.

O filme de Pink vai sofrer com as comparações, correndo o risco de ser visto apenas como uma versão mais pobre e descerebrada de Se Beber, Não Case. Pura bobagem. A pretensão é outra, a perspectiva é definitivamente outra, e o ar picareta e retardado lhe confere brilho próprio — de quem previu as comparações, soube se aproveitar delas, e saiu dando risada.

Não está no nível de um genial Trovão Tropical ou mesmo do ótimo já exaustivamente citado filme de Todd Phillips, mas merece um bom lugar entre as comédias dessa última safra. Deste ano, ao menos, talvez seja a mais divertida.

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