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Críticas

Cineplayers

Sem a Física, com o casal.

6,5

A award season é uma época engraçada. Durante pouco mais de 2 meses começam a aparecer filmes muito parecidos entre si e com outros de anos anteriores, do mesmo período. A Teoria de Tudo é a expressão da cinebiografia britânica contemporânea. O tom do filme, o que envolve trilha sonora, fotografia, direção e montagem, principalmente, não é muito diferente daquele de O Discurso do Rei, que também é parecido com O Jogo da Imitação, Sete Dias com Marilyn e por aí vamos.

A diferença de A Teoria de Tudo para os outros mencionados é que este não faz um recorte muito específico de tempo para a narrativa. Ou seja, ele observa todo o desenvolvimento da doença do físico-celebridade Stephen Hawking (Eddie Redmayne), focando também no seu casamento com Jane Wilde (Felicity Jones). A extensão da história expõe ainda mais os problemas de direção, montagem e roteiro do filme.

Primeiro acho importante considerar que não vejo A Teoria de Tudo como um filme ruim, longe disso. É apenas terrivelmente limitado e distante do seu objeto: o trabalho de Hawking. As teorias dele colocaram à Fisica questões existenciais muito particulares, seria maravilhoso termos um filme sobre esse personagem que reflita a sua contribuição para a ciência, que tenha real interesse pelo que ele tenha feito. A Teoria de Tudo, desde o nome até a maneira como representa o Hawking cientista, reduz a sua ciência a um conjunto de frases de efeito de um livro de auto-ajuda.

Esse descaso com o interesse do personagem é apenas uma evidência de um roteiro tenebroso, cheio de saídas fáceis e elos risíveis. Para construir o desenvolvimento das teorias de Hawking, o diálogo científico é dividido em partes pelas cenas, começando em uma e sendo retomado na seguinte das maneiras mais esdrúxulas que se possa imaginar. Além disso, a maior parte das falas, de qualquer personagem, parece uma tirada espertinha que levou meses de ensaio, isso quando não se limita às exclamações de “Brilhante!”, “Que porcaria!”, “Genial!” e “Besteira”, que é o mais longe que o roteiro do filme consegue refletir sobre ciência.

Descartando-se que o Hawking da Física está inalcançável para o filme, aquele que se casou enquanto uma doença que arriscava impedir completamente sua capacidade de comunicação progredia brilha na tela. Se Eddie Redmayne não conseguiu fazer muita coisa com um personagem saudável, ele fica melhor quanto menos recursos têm para sua atuação. Em determinado momento, quando tudo o que é possível a ele é a expressão do olhar, ele é simplesmente maravilhoso.

Mas é a Jane Wilde de Jones que mantém-se o que o filme tem de mais interessante do início ao fim. Diferente de Redmayne, ela parece saber exatamente em que momento da personagem está. Assim como Stephen, Jane passa também por uma degradação física no decorrer do filme. Mas enquanto a dele minimiza sua possibilidade de expressão, a dela aumenta. Da princesa do baile, a personagem vai cada vez mais saindo dos limites da pose, primeiro apenas quando deve dar assistência ao marido, mas logo os cabelos despenteados, os vestidos rotos e a expressão cansada farão parte da personagem.

Enfim, A Teoria de Tudo é um melhor filme sobre casamento, e suas particulares dificuldades em circunstâncias difíceis, que sobre um físico famoso. Não sei o quanto desse rumo é iluminado pela presença cativante de Jones, que conseguia sempre trazer brilho para a cena, contornando uma direção exibida e uma montagem apressada. Entro em méritos que já não são do filme, mas gosto muito do desfecho que tem o casal. Algumas coisas são dolorosas demais para se continuar mesmo com amor, família ou Deus. Não me surpreende que James Marsh seja tão incisivo na inevitabilidade desse final, o belíssimo O Equilibrista foi fundo no mesmo ponto: afetos mudam. A Teoria de Tudo pode tropeçar muito e nunca se destacar o bastante para merecer qualquer coisa, mas encontra sua força na leitura dos atores de seus personagens.

Comentários (10)

Ricardo Amaral Guedes | terça-feira, 27 de Janeiro de 2015 - 21:42

Filhote de Discursos do Rei e Mentes Brilhantes.
Fraco (e medroso) como previsto.

Os poucos lampejos de sinceridade acabam sufocados pela conveniência de sua estrutura. Se esforça tanto pra ser doce que o amargo perde o gosto, e a realidade vira fantasia. Não que a entrega de Redmayne não seja notável (e louvável). É, mas o cenário que a circunda não permite que a atuação vá além da temporada de premiações.

Márcia Winchester | quarta-feira, 28 de Janeiro de 2015 - 21:55

"Primeiro acho importante considerar que não vejo A Teoria de Tudo como um filme ruim, longe disso. É apenas terrivelmente limitado e distante do seu objeto: o trabalho de Hawking. "
um pouco equivocado esse argumento, já que o roteiro é baseado no livro: Travelling to Infinity- My Life with Stephen, Jane Hawking, que conta como o próprio titulo sugere a vida do casal, e nesse ponto o filme cumpre o esperado.

Alan Principe | terça-feira, 24 de Fevereiro de 2015 - 22:36

Eddie "pussymouth 😁" Redmayne levou.

Alan Principe | quarta-feira, 25 de Fevereiro de 2015 - 21:45

Assisti. Gostei do trabalho do rapaz e simpatizei com o filme no seu estilo novelesco, como disseram. Hawking é uma figura pop e quem quer saber mais sobre a parte cientifica da coisa que pesquise. Como já conheço bem o trabalho dele há anos, não senti que ficou faltando nada. Pelo contrário, mostrou um pouco do lado pessoal, um tanto real, deste exemplo de ser humano.

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