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Críticas

Cineplayers

Jordanas de Autotolerância.

7,0

Amorosa Soledad talvez pareça agora uma novidade ainda menor do que quando esteve no Festival do Rio, há mais de 6 anos atrás. O que mudou de lá pra cá? Missão Madrinha de Casamento foi um sucesso de bilheteria, o mumblecore, movimento do cinema independente americano, morreu e deixou Lola Versus, Frances Ha, Um Brinde à Amizade como alguns de seus herdeiros e Lena Dunham escreve, dirige e estrela Girls. Não vou tão longe quanto a sugerir que a comédia feminina de hoje, que em boa parte se sustenta numa ideologia de ode moral ao fracasso, deva qualquer coisa ao filme argentino, mas é interessante ter esse quadro fantástico de desenvolvimentos narrativos de uma geração e perceber que, talvez, Amorosa Soledad tenha antecipado todos eles.

No filme, Inés Efron interpreta Soledad, jovem que acaba de ficar solteira porque seu namorado decidiu que precisava de um tempo para ele mesmo. Sem saber lidar muito bem com a situação, Soledad passa por algumas situações constrangedoras com o ex-namorado, seus amigos e um homem que se interessa por ela. Enquanto isso, o filme a coloca no banco do réus pelo seu egoísmo e sua incapacidade de lidar com situações minimamente difíceis, mas sem nunca deixar de ser um tanto complacente com a personagem.

Como em Girls, o texto tem completa noção do ridículo que aquela personagem representa, mas não abre mão de defendê-la nem por um segundo. Na verdade, todos os filmes que mencionei antes lidam muito bem com o caráter tragicômico do patético, o que é muito corente com o momento que vivemos. O trajeto de aceitação social da selfie resulta numa trama bem parecida com a desses filmes. Uma maneira de expressão acusada de ser ridiculamente egocêntrica que, depois de ser massivamente rejeitada pelo “bom-senso”, começa a ser defendida numa leitura muito consciente do ridículo que representa. Há, em todos esses exemplos, uma defesa do ridículo, mesmo que muito consciente dele. Não sei se chega a ser exatamente irônica porque o que há de ridículo nunca é rejeitado. Ao contrário, ele é defendido quase que como uma ampliação da moralidade (isso na verdade é um conceito de mesa de bar genial criado por um amigo).

Mas Amorosa Soledad é realmente menos inteligente na sua representação do fundo do poço e no seu humor do que todos os que seguiram. Apesar da comédia ser claramente pretendida e até esforçada, eu, pelo menos, não achei nada engraçado. A irritação que a personagem me causava me distanciou dela por um bom tempo de filme, só fui ceder a ela quando ela começou a ceder contra a própria bobagem.

Essa observação pode parecer mesquinha e contraditória para alguém que é fã do mumblecore e gosta de acompanhar o que restou dele. Infelizmente, a Soledad de Efron está mais perto de permitir uma fábula moral que da liberdade e da individualidade singular que marca os personagens do movimento americano. E, lógico, Amorosa Soledad não tem qualquer coisa de ousadia estética, ao contrário de seus primos do norte.

Na verdade, o filme parece seguir uma construção estética já um tanto datada da atual comédia europeia, observando seus personagens com um olhar frio de falso naturalismo e com uma trilha sonora mínima que tem a função muito específica de acentuar o tom de humor (como quase toda comédia europeia dos últimos 15 anos). Mais uma vez, encontro-me no impasse desse filme não ser tão novo quanto parece. Acho que Amorosa Soledad teve o azar de envelhecer antes de entrar no circuito.

Mas ainda assim, o movimento do qual Amorosa Soledad faz parte talvez sem saber é louvável na busca por reverter um antigo problema de visibilidade e representação, não exatamente da mulher, mas de mulheres que por qualquer motivo não estão no seu melhor momento moral e mesmo assim querem ter sua individualidade e escolhas respeitadas. Esse teste de tolerância com o que parece ridículo pode até servir como uma prova de autotolerância, uma experiência que vale a pena tentar.

Comentários (1)

Abdias Terceiro | quinta-feira, 12 de Março de 2015 - 12:32

Castanha sempre coeso. Nao havia ouvido falar no filme.. Vou conferir.

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