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Críticas

Cineplayers

Lars Von Trier mistura sentimentos opostos para contar uma história da tragédia de ser humano.

7,5

Anticristo já começa como um filme atípico. A cena sem cor, com trilha sonora gregoriana, dá o tom de uma história pesada e de temática complexa. O estilo Lars Von Trier, de câmara trêmula, demora até o segundo ato para marcar presença, quando a trepidação representa o tumulto interior pelo qual os personagens passam, além de trazer Von Trier de volta a seu cinema realista. O começo é puro trabalho de estética, com o primeiro ato inteiro possuindo fotografia em preto e branco enquanto as cenas sofrem cortes consideravelmente ágeis e são enquadradas de modos distintos.

O primeiro contrassenso proposital logo aparece. Uma cena esteticamente impecável conta a história da tentação da carne – e uma maneira de prover a vida - como um pecado que leva a morte. Enquanto o casal sem nome transa no chuveiro, com direito a close na penetração vaginal, o filho deles deixa o berço em direção a janela, onde acaba caindo – sequência construída com toda calma e lentidão pelo cineasta – e falecendo. Conforme a vida dos personagens perde cor, o filme, por sua vez, ganha. E são essas contradições que permeiam o longa do diretor de obras-primas como Dogville e Dançando no Escuro.

O antagonismo condutor da trama é claro: o bem e o mal. Assim opõe-se o céu ao inferno, o claro do escuro, a mulher do homem, e a esquerda da direita. Este último revela-se como uma ferramenta importante para compreender os antagonismos da vida, e a duplicidade do caráter humano, inevitavelmente condenada por Von Trier como uma espécie maldosa, que faz do viver um inferno, uma grande depressão. O diretor, aliás, escreveu o roteiro de Anticristo quando estava mergulhado em uma depressão profunda e assim divide com o espectador um pouco de suas angústias e delírios, criando um filme para se sentir e que, consequentemente, faz quem o assiste sentir-se cada vez pior, atônito. 

E Von Trier não tem medo de fazer seu estudo sobre o ser humano e a relação deste com o próximo e com a natureza - personagem presente a todo instante no filme - tornar-se, por vezes, uma experiência grotesca, que experimenta o limite da sensação humana ao condenar o bicho homem, tão animal quanto os verdadeiros bichos apresentados no longa, a não poder mais se reproduzir, em cena na qual os órgãos genitais masculino e feminino são de alguma forma afetados. E é tão evidente que Lars Von Trier equipara o homem com o animal, que o personagem masculino é capaz de ouvir um bicho se comunicado com ele, em uma frase que resume e encerra o ato.

Enfim, o Éden é pintado como um lugar inexistente e a Terra como um inferno completo. E a cena final se torna significativa ao mostrar um personagem que pode ter encontrado a salvação para o inferno de sua vida, ou que pode estar descendo a montanha de encontro a ele (o inferno), enquanto, na contramão, milhares de pessoas ascendem a uma vida de paz (ou ao inferno da vida). Assim como a duplicidade presente na história de Von Trier, fica impossível distinguir o lado trágico do da salvação e o caminho para qual pendeu a trama anti-ser humano de Lars Von Trier.

Comentários (1)

Cristian Oliveira Bruno | sexta-feira, 22 de Novembro de 2013 - 16:45

Não é fácil digerir o cinema do diretor, tem que se estar diposto. A cena inicial é linda. A primeira seqüencia na floresta também.

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