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Críticas

Cineplayers

Apesar de pequenos problemas, Apocalypto é impecavelmente filmado e muito empolgante.

8,5

É possível encontrar uma espinha dorsal na filmografia de Mel Gibson como diretor: em todas as suas obras há uma atração indelével pela violência, como se retratar a crueldade do ser humano fosse uma missão sua. Foi assim em Coração Valente, A Paixão de Cristo e agora no recente Apocalypto.

Esta característica, porém, não impediu Gibson de realizar bons trabalhos. É verdade que, apesar de impactante, A Paixão de Cristo possui diversos problemas, mas o excelente e multipremiado filme sobre William Wallace e esta incursão no mundo dos maias no século XVI são obras de inegável qualidade narrativa.

O roteiro traz a história de Jaguar Paw, integrante de uma pequena aldeia maia em um período de decadência desta civilização. Com uma esposa grávida e um filho, Jaguar dedica seu tempo à caça e à convivência com a família, até que a comunidade é atacada por uma tribo vizinha. Após conseguir deixar sua esposa e filho em local seguro, Jaguar é levado para as instalações da outra tribo, muito mais avançada em estrutura. Agora, ele precisa escapar para se reencontrar com a família.

Apocalypto é mais um exemplo da qualidade de Gibson como diretor. Divido em três atos bastante específicos, a obra é uma monumental realização, impecável em termos visuais e eficiente em sua narrativa. Se fosse preciso classificá-lo em algum gênero, Apocalypto poderia ser definido como um filme de ação que oferece tudo aquilo que o público pede.

O primeiro ato da obra é o que constrói a base de todo o restante. Sem pressa nenhuma em apresentar os personagens e a relação entre os integrantes da aldeia, Gibson consegue fazer com que protagonista e coadjuvantes se tornem queridos ao público, aspecto fundamental para que a jornada a seguir se torne interessante. Há, inclusive, alguns momentos de humor bem colocados e nada destoantes com o tom do filme até então.

Logo em seguida, o cineasta começa a circular pelo terreno no qual parece mais à vontade: a capacidade de causar impacto na platéia. Após uma cruel e tensa seqüência envolvendo a invasão da aldeia, Gibson e os prisioneiros são carregados a uma civilização muito mais avançada que a apresentada até então, maravilhando o espectador com um visual estarrecedor e uma recriação de época estupenda.

E esta é uma das maiores qualidades de Apocalypto. Tudo no filme parece autêntico. Desde as roupas, maquiagem e cicatrizes dos personagens, passando pelos rostos desconhecidos dos atores e a brilhante direção de arte, Apocalypto realmente consegue levar o espectador a outra época. Claro que para isso também colabora a opção de fazer com que o filme fosse falado em sua língua original, trazendo impressionante veracidade à obra (caminho utilizado por Gibson também, com sucesso, em A Paixão de Cristo).

Já o terceiro e final ato de Apocalypto resume-se a uma longa e empolgante cena de perseguição na selva. Durante os aproximadamente 40 minutos de ação ininterrupta, Jaguar se transforma em uma espécie de John Rambo e vira o jogo contra seus perseguidores, usando a vantagem de conhecer a floresta. Graças à identificação entre platéia e personagem, a seqüência jamais se torna cansativa, uma vez que o espectador está sempre torcendo para o protagonista.

Claro que isso deve-se também à habilidade de Gibson como diretor. Com um enredo simples, mas bem contado, e o acompanhamento técnico de qualidade (figurino, maquiagem, trilha e direção de arte), o cineasta constrói cenas esteticamente belíssimas e emocionalmente impactantes. Sabendo como poucos criar um quadro de tirar o fôlego, Gibson entrega ao espectador tomadas como as de cima da pirâmide onde ocorrem os sacrifícios, a de Jaguar desafiando os inimigos na cachoeira e a surpreendente cena envolvendo um parto.

No entanto, é indiscutível que o aspecto de Apocalypto que mais salta aos olhos é violência. Gráfico e por vezes até exagerado, o excesso de sangue da obra vai incomodar aos espectadores mais fracos. É indiscutível, porém, que a violência presente acaba por trazer ainda mais tensão à jornada de Jaguar, uma vez que a platéia sabe que o personagem corre perigo real. Mesmo assim, Gibson poderia ter segurado a mão: diversos momentos são dispensáveis, como o sangue jorrando de uma cabeça aberta ou o ataque de uma pantera no rosto de um personagem.

Outro problema do filme é o fato Apocalypto esclarecer pouco sobre a cultura maia. Aqui, os fatos vão se sucedendo e coisas aparecendo sem que seja explicado o significado delas, como os prisioneiros serem pintados de azul. Claro que explicações a toda hora certamente tornariam o filme falso e expositivo demais, mas Gibson perdeu uma boa oportunidade de iluminar um pouco a mente do público sobre uma cultura tão pouco conhecida.

Mas estes são pecadilhos que pouco pesam contra Apocalypto. Quem pretende ver um filme impecavelmente filmado, com cenas empolgantes e uma história com conexão com a platéia certamente sairá satisfeito. Gibson construiu um filme selvagem, emocionante e grandioso, com diversas seqüências memoráveis. Exatamente o que se esperava dele.

Comentários (2)

Cristian Oliveira Bruno | sexta-feira, 22 de Novembro de 2013 - 16:49

Gibson prova seu talento como diretor, apesar do gravíssimo deslize em Paixão de Cristo. Belo filme.

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