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Críticas

Cineplayers

Embalagem demais para produto de menos

3,0
Devem haver qualidades básicas em não ser um nerd amante de games e HQs, e uma delas é poder analisar com distanciamento necessário um produto como o filme novo do diretor Justin Kurzel, a muito aguardada e pouco bem sucedida adaptação live action do sucesso dos consoles Assassin's Creed. Quando começo o texto afirmando que o filme não deu certo, por enquanto é apenas uma observação do ponto de vista factual: com uma arrecadação que alcançou 50 milhões em 20 dias nos EUA e mal falado a ponto de aparecer na pré-lista do Framboesa de Ouro, o fracasso é uma realidade por essas bandas. Ainda que realmente não seja um produto de acertos, não ter ligação afetiva ao material deve ser positivo nesse momento. 

O filme trata de unir em sua narrativa a trama que envolve o bandido Callum Lynch ao seu ancestral Aguilar, que viveu no século XV. Ao terem seus DNAs cruzados por uma empresa misteriosa com sede na Espanha e suas árvores genealógicas apontarem a ligação entre eles, Lynch toma conhecimento que esse ancestral lutava contra a dominação da época exercida pelos Templários fazendo parte de um grupo conhecido como Assassinos. Apresentado a esse passado ancestral pela Dra. Sophia Rikkin, Lynch precisa descobrir onde seu antepassado escondeu um artefato conhecido como a Maçã do Eden, onde estaria escondido o gen original da violência e da desobediência. Isso tudo graças a uma máquina criada pela Dra. Rikkin que permite uma viagem de conexão celular que conecta Lynch a Aguilar, numa série de suspensões da descrença até simpáticas no todo.

Protagonizado por Michael Fassbender e com um elenco que une Marion Cotillard, Jeremy Irons, Charlotte Rampling e Denis Menochet, sobra talento aos envolvidos na área dramática do filme, ainda que praticamente nunca sejam exigidos grandes revoluções interpretativas da parte do elenco. Mas a credibilidade conferida ao projeto por esse elenco é algo impagável mesmo; de qualquer forma, Fassbender tem uma postura compenetrada e bastante respeitadora ao material, e isso vaza da tela. Excepcional ator que impregna qualquer produção com seu talento, ele é o grande pilar da produção.

Ainda que não devesse ser fácil para um diretor indie australiano comandar uma produção tão repleta de expectativas e provavelmente ingerência, Kurzel poderia ter impresso suas características visuais e febris ao projeto, mas o que vemos no pacote é um exemplar sem gás e completamente genérico, que deverá causar revolta em muitos. Se o nervosismo de 'Snowtown' e 'Macbeth' não conseguiu dar as caras ao fim e ao cabo, se o filme não difere em praticamente nada do que qualquer um pau mandado lançaria, porque então procurar um cineasta mais afeito a um olhar aguçado sobre o material filmado?

Kurzel trouxe a mesma equipe que colaborou com ele na adaptação 'shakesperiana', além dos dois protagonistas também. Como já citei acima, Fassbender funciona; Cotillard menos, bem menos. Ela parece deslocada e incomodada, enquanto o resto do elenco funciona em suas cenas, sejam elas boas ou não. A fotografia e o desenho das cenas também parecem beber além da conta da experiência da equipe em 'Macbeth' e fica tudo num clima de repetição que nem sempre é positivo. As texturas, a palheta de cores, a direção de arte da Espanha medieval; é um caminho parecido e confortável. Mas, no geral, é um filme pouco confuso (ao contrário de Warcraft) e, por mais que nada de muito original esteja sendo dito, ao menos é dito com certa propriedade vez por outra.

Em linhas gerais, 'Assassin's Creed' não consegue levar as adaptações de games para o patamar que Hollywood tenta há tantos anos. Ainda que particularmente eu veja na franquia 'Resident Evil' a saída e o rumo possível para o futuro desse tipo de cinema, e Paul WS Anderson consegue incorporar sua linguagem, sua visão autoral, mesmo num produto bancado por um grande estúdio. Kurzel é um talento promissor, parece ter muito a lapidar em matéria de talento, mas aqui não consegue ir muito além do burocrático binômio 'fotografia pastel + fog + ação coreografada', meio que desprovido do que não pode faltar a esse tipo de projeto: tesão. Mas é bonito de ver e não mata, só a quem sair de casa esperando grande cinema de um blockbuster de fim de semana. 

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