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Críticas

Cineplayers

Representação contemporânea e suas possibilidades.

8,5
O cinema é o palco para Sang-soo desenhar e redesenhar ao seu bel prazer. É o caso explícito de Lugar Certo, História Errada onde organiza um díptico onde a mesma história é repetida com pequenas alterações que cedo ou tarde acabam alterando todo o panorama.

O ponto de partida inicial - um diretor de cinema chega a uma cidade para dar uma palestra, conhece uma artista em um santuário e passa o resto do dia tomando café, bebendo e indo em eventos sociais com ela - é a cama para o diretor testar duas possibilidades diferentes de dramaturgia, sendo direto com o espectador que esse é um filme que assume sua condição de obra cinematográfica, que exibe de forma transparente suas estruturas ao espectador, assim como a própria misé-en-scene típica de Sang-soo, repleta dos tradicionais planos estatísticos rompidos pelo zoom.

Na tentativa de “forçar” o distanciamento do espectador para fora da obra e assim criar um clima anti-natural que caminha junto com as narrativas criadas, o diretor faz estruturalmente e tematicamente uma filmografia povoada de personagens com as mesmas profissões, com condições, conflitos e situações que estão sempre se repetindo. Mas que estão sempre divergindo em suas releituras de conflitos parecidos, perdidos no universo “quebrado” contemporâneo.

O radicalismo em tornar seu filme em uma obra contemporânea é praticado de forma discreta, com apostas estilísticas como inserir o título na metade da obra, para criar a conexão entre os dois temas repetidos; enquadramentos que se repetem para depois divergir.

A construção do humor também é construída de forma diferente, com ele sendo compreendido pela consciência da narrativa e estética também estarem sendo utilizados como elemento de encenação, com o jogo de expectativas ganhando aos poucos uma importância central, já que ele inevitavelmente será quebrado dentro dos blocos que se repetem. Ainda temos os mesmos blocos, mas temos diferentes diálogos, diferentes ações, diferentes quadros.

A vida emocional do indivíduo deslocado e os pequenos absurdos da rotina são objetos de estudo centrais na filmografia do cineasta, que transformou suas pequenas revoluções em um trabalho regular, onde suas variações sobre o mesmo tema, onde a filmagem de uma história em díptico é quase uma síntese do seu cinema que se renova constantemente através da repetição estilística.

Sang-soo caminha sempre filmando sua particular Coréia do Sul, com todos os seus protagonistas diretores, roteiristas e escritores; com suas muitas cenas de bebedeira; com as extensas conversas e encontros e o frequente humor advindo do deslocamento físico de seus personagens, dos mal entendidos e decisões que seus personagens tomam.

Mas estão lá a crise na misé-en-scene, em sua confusão de contemplação e movimento; a narrativa desmontada em sua cronologia e nexo causal e observada pelos próprios personagens; o total desprendimento de didatismos estéticos e dramatúrgicos em sua construção. Esteta de um cinema particular, o cineasta trilha um caminho assim como seus filmes: contemplativos, misteriosos, acidentados e cheios de infinitas possibilidades a se explorar.

Comentários (3)

Declieux Crispim | quinta-feira, 15 de Outubro de 2015 - 11:09

Bela crítica como sempre, Bernardo. Não vejo a hora de poder ver os dois últimos do mestre Sang-soo Hong, pois são os únicos que ainda não vi e ele é um dos principais diretores do cinema recente.

Lucas Nunes | quinta-feira, 15 de Outubro de 2015 - 16:53

O cinema sul-coreano é fantástico!

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