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Críticas

Cineplayers

Amostra irrefutável do conservadorismo da academia: este drama - ótimo, é verdade - prevaleceu no Oscar sobre o revolucionário Kane.

8,5

“Eu sou John Ford, faço westerns”. Esta antológica frase conhecida por todos os fãs do diretor é uma auto-assertiva do domínio estético-social e folclórico do gênero por este mestre inquestionável. Laureado por evoluir o gênero americano por excelência, Ford nunca fora reconhecido pela academia – embora tenha ganhado alguns Oscar – por seus westerns. Sendo lembrado por ela apenas em seus filmes dramáticos.

Como Era Verde o Meu Vale é um dos mais ternos e indeléveis filmes do cineasta, e que lhe garantiu mais um Oscar de melhor diretor. Este filme narra a história de Huw Morgan e sua família em uma época de tradições, sonhos e lutas num sofrido e provinciano País de Gales. A fábula conta de modo clássico todas as desventuras e memórias de uma família protestante, cuja renda provém do trabalho árduo em uma mina de carvão. Perpassando um olhar sociológico àquela comunidade de mentalidade puritana e mesquinha que ora acalenta, ora repudiam seus iguais por manutenção da boa conduta moralizante e humanismo aparente.

Não é esquecido também o enfoque político dado ao enredo, contextualizando-o em um momento de crise na economia mundial, subentendida, ao tratar de questões grevistas e rejeição ao pensamento comunista. Retrata ainda a esperança de uma família que acredita no potencial de seu filho caçula (Huw Morgan) em se tornar um futuro doutor, e o intento dos demais na emigração à América em busca de novas oportunidades.

Válido é ressaltar que John Ford, batizado de Sean Aloysius O’ Fearna, emigrara da saudada Irlanda em meados da primeira década do século passado, abandonando a escola de medicina, para rumar à América e seguir os passos de seu irmão mais velho. Apesar deste ser roteirista e diretor da emergente Hollywood – geração que eclodiu importantes nomes do cinema como: Griffith e Chaplin – sua atenção se voltaria mais tarde a seu irmão. Sem mais detalhes, portanto, fica clara a investida autobiográfica nesta obra em análise.

Ford trabalha de modo magistral a estrutura desta fita. A narração em off (prólogo) do protagonista constrói as imagens remanescentes de sua infância. Costurando elipses mensuráveis conforme o andamento de suas lembranças em um sentido aristotélico (linear). O trabalho estético neste filme é reticente e “invisível” – estilo peculiar ao diretor – com um esmero em sua narrativa puramente visual e uma sábia economia de diálogos que faz da obra um primor representativo do ideal cinemático. Aspecto que contrasta ligeiramente com os filmes “falados” que ainda se faziam em Hollywood na década de 40 – Ver crítica de A Luz é para Todos.

Como não poderia deixar de esquecer, o presente filme concorreu também ao Oscar de melhor filme em 1941, tirando a estatueta de Cidadão Kane – considerado mundialmente como o melhor filme da história do cinema – que inovou a sétima arte em todos as dimensões do filme narrativo, consumando e “profetizando” todos os elementos constitutivos do cinema clássico. Confirmando assim o conservadorismo irredutível da academia. 

Em suma, Como Era Verde Meu Vale leva e traz toda uma memória de saudades dos tempos áureos de Hollywood que destilava poeticamente os valores que cicatrizaram uma geração de sonhos e esperanças, que são manifestos nas imagens finais (o epílogo) das lembranças mais líricas e cristalizantes de Huw Morgan e, porque não, de John Ford.

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