Saltar para o conteúdo

Críticas

Cineplayers

Filme presta homenagem ao jeito francês de fazer cinema com humor e ironia.

7,0

Christophe Honoré foi o queridinho da crítica francesa em 2007. O seu “Canções de Amor” (2007), ainda inédito por aqui, foi apresentado no último festival de Cannes e empolgou a platéia local. Motivo: a homenagem explícita à tradição do cinema francês moderno, desde a nouvelle vague aos filmes populares (no caso, a referência explícita é o longa “Os Guarda-Chuvas do Amor”, de 1964, de Jacques Demy, musical de grande sucesso na época, ganhador da Palma de Ouro e de várias indicações ao Oscar).

Todavia, antes mesmo de “Canções de Amor”, Honoré já havia mostrado a sua predileção pelo diálogo com a cinematografia de seu país. “Em Paris” (2006), seu filme anterior, aterrissou em telas brasileiras na virada do ano, e talvez tenha passado despercebido pelo público em geral. Trata-se de uma divertida e despretensiosa amostra do estilo Honoré de filmar, um estilo irônico e amoral, tipicamente francês, mas renovado pela leveza e humor transmitidos pelo modo prazeroso com que ocorre a interação entre atores e câmera.

Devaneios Parisienses

Filmes franceses possuem o estigma de tediosos, parados. Às vezes essa impressão pode ir mais longe ainda, eles parecem ser os mesmos, abordam assuntos muito semelhantes, por vias bastante iguais, tipo diálogos intermináveis, narrativa fragmentada, contemplações em planos longuíssimos, metalinguagem. Ao final, o espectador costuma se perguntar: mas havia uma história a ser contada? E deixa a sala de cinema achando-se um idiota, seja por não ter entendido nada, ou pela raiva de ter perdido tempo.

“Em Paris” responde a essas insatisfações do espectador, mais ou menos da seguinte forma: não nos leve muito a sério, por favor, os diálogos de nossos filmes, a encenação, a forma de filmar; são devaneios, elucubrações sobre a vida, o mundo, as relações; somos irônicos sim, e não estamos aqui para julgar ninguém, nenhuma atitude. Confessar isso não significa cinismo. O longa é rigoroso em sua colagem de referências a mestres como Rohmer, Truffaut, Godard e Remy, mas, ao mesmo tempo, mantém um frescor e uma leveza que podem ser apreciados por qualquer um que não conheça previamente tais citações. Há uma história e, sobretudo, uma forma de contá-la. E isso é frisado o tempo todo ao longo da narrativa.

Atores e Personagens Indiferentes

Com o fim do casamento, Paul (Romain Duris) retorna à casa do pai, onde também vive seu irmão caçula, o inconseqüente Jonathan (Louis Garrel). Não sabemos exatamente por que, mas Paul está em depressão: se é a separação, a falta da irmã que morreu, ou simplesmente uma tristeza inerente. Também não identificamos o que move Jonathan a se envolver com várias mulheres ao mesmo tempo.

Tudo isso não é um problema, na verdade. Não há moralismos ou julgamentos. Paul e Jonathan não se sentem mal por serem ou estarem como são ou estão. Apenas o pai, Mirko (Guy Marchand), parece incomodar-se com o estado de coisas. Porém, tudo não passa de um grande jogo – ou da soma de vários jogos –, por intermédio dos quais os personagens levantam suposições sobre seus sentimentos e ações. Eles brincam de marido e mulher, de pai e filho, de irmãos, de amantes, assim como os atores brincam de interpretar.

A auto-ironia é onipresente. Esta na seqüência em que Jonathan apresenta-se ao espectador, diretamente, como narrador e personagem, simultaneamente, feito um Brás Cubas. Mais à frente, quando começam a pipocar as referências a obras e estilos de diretores franceses pós-nouvelle vague, o tom irônico não é abandonado, tanto nos longos embates discursivos entre os casais, como nos diálogos entre os irmãos. É um humor amoral, somado a uma boa dose de falta de pudor nas interpretações. Como se houvesse uma indiferença entre atores e personagens, um certo pouco caso nessa indistinção. Justamente o que confere força e seriedade à brincadeira.

Comentários (0)

Faça login para comentar.