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Críticas

Cineplayers

Uma crítica pesada e ácida ao estilo de vida superficial nos subúrbios norte-americanos. Filme americano fundamental para qualquer cinéfilo.

9,0

Felicidade é um retrato da vida nos subúrbios norte-americanos e apresenta o cotidiano de um grupo de pessoas interligadas por relações afetivas, familiares ou amigáveis. Todd Solondz apresenta através deste exemplar filme uma dura crítica ao convencionalismo americano, e seus personagens nada mais são do que amostras díspares da sociedade, não presentes apenas nos Estados Unidos, mas em qualquer outro lugar. 

A profundidade dos personagens em Felicidade é abissal, e a conectividade existente entre o expectador e alguma daquelas pessoas, talvez não por se comparar com elas (afinal, quem o faria?), mas por possuir certa familiaridade com os tipos apresentados, cria um impasse na mente de quem assiste esta grande obra: eles são realmente culpados pelo que fazem ou são pessoas que apenas seguem seus instintos? Um apontamento interessante na obra também é o sugerido pelo título. Quem é feliz em toda esta trama? Superficialmente, Trish Maplewood, a esposa otimista, é a que mais se mostra possuidora deste sentimento, mas é notável que também seja a que menos deixa a vista sua real personalidade, por conformar-se e até admirar toda a idiossincrasia presente em sua vida.

A análise de Solondz não é em nenhum momento superficial, e surpreende pela importância empregada até mesmo para com personagens de pouca participação ou relevância em sua história. Cada personagem se mostra omisso para o convívio em sociedade, exceto Joy, que desde o início da película é extremamente sincera com todos que a cercam, assim como Kristina e Timmy. Os temas abordados por Solondz não poderiam ser mais controversos, e o diretor e roteirista insere em seu roteiro vários páreas da sociedade, incluindo em sua história um estuprador, um assassino e um pedófilo. 

Como diretor, Todd Solondz se utiliza de poucos artifícios não convencionais, mas é notável que seja exatamente o que o diretor busca para a estética de seu filme. A trilha sonora de Felicidade evidencia a intenção de mostrar todas as situações presentes em seu roteiro como se o diretor estivesse vendendo o estilo de vida daquelas pessoas, como em uma propaganda da família norte-americana perfeita. E também fica evidente a repulsa com que se é encarada a face de cada um dos personagens quando estão sozinhos, fechados em seu íntimo. Solondz privilegia o talento dos atores com a riqueza de seu texto e personagens, utilizando seqüências com câmeras paradas e diversos cortes habituais para cenas de diálogo. Pode não ser muito inventivo, mas atinge seu objetivo de forma exemplar.

Tendo isso como um de seus maiores méritos, pode-se dizer que o elenco de Felicidade é singular. Exemplos de atores competentes podem ser citados aos montes quando se assiste o filme. Phillip Seymour Hoffman se mostra muito versátil mais uma vez, sendo atualmente o único ator do grande elenco que continua em atividade com notoriedade. Lara Flynn Boyle também constrói Helen com uma personalidade incrível, mesmo com sua pouca participação. Mas o duo que compõe a narrativa crucial da história, que ganha uma das seqüências finais em Felicidade, é composto por Dylan Baker e Justin Elvin. Os diálogos entre pai e filho sempre sinceros são comoventes e quase irreais, e a última seqüência em que os dois dividem a tela figura desde já como uma das melhores que o cinema, no extremo de sua simplicidade, já criou. 

Vencedor de vários prêmios, Felicidade certamente serviu como estro para dois outros filmes muito competentes, que abordam em seus roteiros a vida da família norte-americana de classe média em subúrbios: Beleza Americana, de Sam Mendes e Pecados Íntimos, de Todd Field. Ambos trabalhos extremamente competentes, até em muito mais exaltados, porém não tiram o mérito maior do trabalho de Solondz, simplesmente por ter sido feito por quem mais entende do assunto. Fato esse que se comprova através de filmes como Bem-Vindo à Casa de Bonecas ou Palíndromos.

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