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Críticas

Cineplayers

Escorpiões num pote.

7,0
Ambientado durante a década de 70, em Boston, Free Fire nos leva até dois grupos e seus mediadores negociando armas dentro de um armazém. De um lado, membros do IRA; de outro, fornecedores. No meio, os mediadores. O clima de desconfiança prevalece o tempo inteiro reunindo tensão e sarcasmo, e não demora para que intrigas desencadeiem ofensas e as ofensas motivem todos a levarem as mãos às armas. Quando o primeiro saca, resta apenas o tempo de se esconder entre caixas, carros, sacos e corpos. É aí que o filme se inclina numa ação impactante e assustadoramente racional, ainda durante a primeira meia-hora, para não mais parar. Ao menos não enquanto existirem balas e pulsação.  

Free Fire é um filme de ação convicto do que deseja ser. Legitima seu título, e entrega virtuosas sequências de ação com tiros por todos os lados, que ricocheteiam entre piadas e personagens que esquecem de qual lado estão. Sem adornos vaidosos ou frases filosóficas copiadas de um compilado aleatório encontrado no google, o filme preocupa-se em proporcionar uma experiência diferente, rompendo com linguagens padrões e dinamizando o ritmo de modo quase experimental. Um mínimo de história e muito a mostrar.

Assim, disparatado e alucinado, não trata-se de um refresco ao gênero e tampouco foge às fórmulas que se arrastam desde os anos 60. Assume-se enquanto um exercício de confronto e estilo, num enérgico bang bang cool abarrotado de diálogos claros, compostos para somar ao ritmo versátil da trama simples. 

Quando se pensa em uma história, pensa-se nos personagens, em como estes reagirão aos contextos e às circunstâncias do roteiro. Uma lógica básica de construção num cenário opressor onde todos estarão distribuídos lutando por uma mesma coisa. Colocar um grupo num pequeno espaço e faze-los se desafiarem armados é uma proposta bastante incomum. Mas conceber 60 minutos de tiroteio é algum tipo de suicídio narrativo, algo que Ben Wheatley, o diretor, inventivo num gênero diferente dentro de sua filmografia, faz com zelo e sem preguiça, investindo em diálogos que são um verdadeiro fuzilamento. Vamos de Tarantino a Guy Ritchie em instantes, entre balas rasantes, situações mirabolantes e um humor desatinado.    

Comparações a outros filmes de pegada similar são instantâneas. Este tem aptidão ao indie, apesar do renomado elenco. Armie Hammer, Cillian Murphy, Brie Larson, Sam Riley e Sharlto Copley encaixam-se em papeis canastrões, que pouco lhes exigem com texto ou interpretação. Divertem e se divertem, competentes ao segurarem o filme inteiro, ainda mais com o ritmo variável. Copley vem se tornando uma caricatura, relacionado a papéis específicos que lhe garante iconicidade. Aqui esbanja humor, tal como os outros personagens, todos em sintonia, enquadrados por uma câmera articulada ao compasso das ações coléricas.  

Há distrações para o público e ausência de construção contextual. A distração é o entendimento inteligível de que algo não deverá dar certo e, não dando certo, haverá custos. A agilidade imposta não permite divagações para explorar contexto ou personagem. É quase como um game, um cenário e disputas nervosas sem fugir ao timbre da recreação. O tempo é corrente e tudo se passa durante uma furiosa noite. Free Fire é uma alegoria irônica as armas e parece deixar isso bastante claro quando permite que o espectador mergulhe em seu tour de force, contemplando seu absurdo. Diverte muito, mas na mesma proporção que corre o risco de entediar. 

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