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Críticas

Cineplayers

Crepúsculo da deusa.

7,0

Gata Velha Ainda Mia (idem, 2013) é um filme que merece uma chance do público por apresentar algumas vantagens e surpresas raras de se ver no cinema brasileiro, embora não seja de fato um grande filme. É o primeiro longa de Rafael Primot, que já tem experiência no cinema, teatro e televisão, e a primeira oportunidade de ver Regina Duarte nas telonas em um papel relevante desde Além da Paixão (idem, 1986), de Bruno Barreto. Acima de tudo isso, serve de prova de que é possível trabalhar no cinema com rostinhos “globais” conhecidos, sem precisar apelar para caricaturas grosseiras, ou fora do nicho das comedinhas infames de formato televisivo que hoje dominam.

Primot consegue driblar várias das limitações com o orçamento e aproveitar ao máximo a oportunidade de trabalhar com Regina Duarte, nem que para isso ele coloque Bárbara Paz como degrau. Na trama, Paz interpreta Carol, uma jornalista que consegue finalmente agendar uma entrevista com a escritora decadente Gloria Polk, reclusa em seu apartamento, onde amarga as saudades dos anos de sucesso. Aos poucos a entrevista se torna um embate, e logo temos um conflito de gerações e formações que promete sustentar a trama até o final.

O interessante nisso tudo é a forma como Primot procura conduzir seu filme. Em boa fotografia, o diretor consegue criar logo de cara um inesperado clima de suspense (com a ajuda dos sufocantes ambientes fechados), que o tempo todo promete algo que está além do nosso alcance. No fim, embora se trate de um drama intimista antes de mais nada, Gata Velha Ainda Mia acaba se solidificando como um eficiente terror psicológico. Para isso, ele abusa de sua experiência com texto e elenco.

A escalação de Regina Duarte é certeira, por se tratar de um papel atípico para a Namoradinha do Brasil. Se poucas vezes durante sua trajetória como atriz ela conseguiu se livrar do papel de boazinha, agora aproveitou a chance para encarar sua própria Norma Desmond/Blanche DuBois e atribuir uma força gigantesca ao papel. De cara limpa, sem maquiagem e sem nenhuma vaidade, a atriz assume Gloria Polk com uma destreza e coragem notáveis, e acaba por compor sua personagem mais forte no cinema (antes tarde do que nunca). Claro que não há uma relação metalingüística dela com a personagem, visto que Duarte não está decadente, apenas afastada da televisão (e quem a pode culpar pela raridade de bons papéis para atrizes dessa faixa etária?). Para isso, claro, é necessário um texto à altura. Se por vezes soam pretensiosos ou excessivamente expositivos, os diálogos no geral são afiados e o clima claustrofóbico fecha o pacote para um trabalho de saldo positivo.

Por outro lado, Primot parece temer que tudo pareça um “teatro filmado” e acaba abusando dos close-ups e de outros recursos puramente cinematográficos, a ponto de chegar uma hora em que eles começam a irritar mesmo o espectador mais desacostumado a reparar nesses recursos. As resoluções finais espertinhas também deixam a desejar. Fora isso, vemos um diretor de potencial trabalhando um lado pouquíssimo explorado de uma das maiores e mais queridas atrizes do Brasil. Mas se ultimamente Regina Duarte anda sumida das telinhas e dos holofotes, neste filme ela se mostra mais do que nunca pronta para o seu close-up.

Comentários (4)

Patrick Corrêa | terça-feira, 20 de Maio de 2014 - 12:34

Curioso pra ver esse.
Passo aqui de novo pra ler a crítica depois que tiver visto. 😁

Eduardo Pepe | quarta-feira, 21 de Maio de 2014 - 19:51

Esse parece dos mais interessante e uma ótima iniciativa para o cinema nacional.

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