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Críticas

Cineplayers

Era só isso?

4,5

Talvez a característica mais fascinante do Cinema – e certamente uma das razões de seu eterno apelo – diz respeito às diferentes emoções que ele é capaz de despertar no público. Este verdadeiro espectro de sentimentos é infinitamente variado, indo da mais profunda indignação (afinal, quem não fica com raiva ao assistir a um filme ruim?) a uma enlevação quase divina, quando o espectador sabe que, de alguma forma, aquilo que acaba de assistir irá mudar a sua vida ou sua forma de encarar o mundo. Como sempre, são estas emoções extremas que nos fazem lembrar de uma obra cinematográfica, para um lado ou para o outro. O tipo de filme mais desprezível, porém, aquele realmente não precisava existir, é o que causa apenas indiferença – utilizando uma expressão mais popular, o que “não fede nem cheira”. Golpe Duplo (Focus, 2015) faz parte desta última categoria.

Tudo no trabalho de Glenn Ficarra e John Requa (ambos roteiristas e diretores) é genérico, a começar pelo título nacional. Se os cineastas mostraram certa inventividade no tom adotado em seu trabalho anterior, o curioso O Golpista do Ano (I Love You Phillip Morris, 2009), dessa vez nenhuma das escolhas é capaz de surpreender a plateia – e isso, em um filme cujas reviravoltas e surpresas deveriam desempenhar um papel fundamental, não deixa de ser sintomático. A verdade é que Golpe Duplo é apenas mais uma produção a fazer parte do subgênero que os americanos chamam de heist film, ou filme de assalto, no qual os mocinhos são sempre (anti)heróis ardilosos planejando um grande golpe. Aqui, porém, a falta de inspiração é tão escancarada que chega a ser uma afronta colocá-lo ao lado de nomes como o clássico Golpe de Mestre (The Sting, 1973) ou até mesmo o recente Onze Homens e um Segredo (Ocean’s Eleven, 2001).

Preferindo seguir por um caminho sempre seguro, Ficarra e Requa constroem um roteiro praticamente desprovido de conflitos, onde tudo parece sair exatamente de acordo com o que os protagonistas planejam. Não há um grande antagonista (Rodrigo Santoro surge apenas após a metade do filme e sua trama é tão tola que não diz a que veio) e o “grande golpe” do final surge de forma abrupta, sem qualquer construção de um clímax. Na verdade, o único conflito dramático que os roteiristas/cineastas inserem no filme é a relação romântica entre os personagens de Will Smith e Margot Robbie, mas ela também sofre de problemas: não apenas os dois atores não possuem qualquer química juntos, como os pontos de virada da história do casal jamais soam reais, surgindo apenas como conveniências de roteiro.

Como se não bastasse, Golpe Duplo ainda encontra dificuldades para se conectar com a plateia em função de equívocos em sua estrutura. Quando a história parece estar se encaixando, o roteiro dá um salto no tempo e praticamente inicia um novo filme, inserindo elementos com os quais o espectador leva algum tempo para se acostumar. Enquanto isso, as tentativas de comédia são pouco inspiradas, gerando apenas um esgar de constrangimento, algo muito longe de alguma risada. É o caso, por exemplo, deste diálogo: “Tenho um pelinho ruivo que coça sempre que algo está errado. E tenho me coçado muito”. Talvez tenha soado engraçado no papel (o que duvido), mas certamente soa apenas embaraçoso quando visto na tela.

Há, no entanto, duas coisas interessantes no filme. Na verdade, três. A primeira delas concerne à própria natureza da história. A plateia sabe que, por se tratar de uma trama passada no mundo dos golpes, nada é o que parece ser. Tudo não passa de um jogo de aparências, no qual o que se vê provavelmente não vai corresponder à realidade. Isso pesa tanto a favor quanto contra Golpe Duplo: se uma ou duas reviravoltas conseguem surpreender (mesmo que exijam muita boa vontade), outras três ou quatro podem ser adivinhadas com muita facilidade. O segundo item da lista é o único momento no qual Ficarra e Requa mostram criatividade na direção: a cena do acidente causado pelo capanga de Santoro, filmada toda a partir do ponto de vista dele. Trata-se de um instante que revela uma forma de pensar diferenciada, uma fagulha de criatividade perdida em um mar de mesmice, fazendo o espectador entender o que realmente está acontecendo apenas quando a sequência chega ao seu final.

Já o terceiro aspecto é, pura e simplesmente, Margot Robbie. Podem ter certeza: aí está uma estrela nata. Robbie, que já havia causado furor em O Lobo de Wall Street (The Wolf of Wall Street, 2013), talvez não seja uma grande atriz (difícil saber, já que ainda não pôde mostrar esse lado), mas é talentosa o suficiente para não precisar se sustentar unicamente pela sua estonteante beleza. O principal, porém, é que Robbie tem uma qualidade que apenas grandes estrelas têm: forte presença e uma relação de amor com a câmera, que parece torná-la algo quase divino. É uma pena, portanto, que sua química com Will Smith seja tão fraca, já que os dois jamais convencem como casal. Smith, aliás, embarca aqui em seu segundo desastre seguido, depois do abominável Depois da Terra (After Earth, 2013), mostrando que ou o público não o abraça tanto quanto antes ou simplesmente ligou o piloto automático.

Porque, sim, Golpe Duplo é um filme incrivelmente problemático, mas também é o tipo de filme que deveria se sustentar pelo charme e pelo carisma de seu elenco. Nem isso acontece, o que apenas ressalta as falhas da produção, como a falta de um encerramento digno. A impressão que fica é que Glenn Ficarra e John Requa viram o quão fraco era o roteiro que criaram e simplesmente desistiram de pensar em um final interessante – ou ao menos com um clímax. O espectador sai da sessão com uma pergunta em mente: “Era só isso?”.

Sim, era só isso mesmo.

Comentários (6)

Abdias Terceiro | quinta-feira, 02 de Abril de 2015 - 11:42

Piada infame hauahauaja. Vou dar um confere pra saber se é só isso mesmo.

Vinicius de Moraes | quinta-feira, 02 de Abril de 2015 - 22:12

Eu sabia que seria uma bosta! 😕 😁 [2]

Pedro Henrique | quinta-feira, 09 de Abril de 2015 - 19:00

Podia ter acabado na cena do jogo de futebol americano ... seria pelo menos um filme divertido . Mas a cena do capanga foi a melhor do filme.

Alexandre Marcello de Figueiredo | domingo, 17 de Maio de 2015 - 19:41

A melhor sequência é a da aposta com o chinês/japonês no estádio durante o jogo em que ao final fiquei surpreendido. A atriz Margot Robbie me fez lembrar a Paola Oliveira pela exuberante beleza.

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